Salve o que está em cima, salve o que está embaixo, salve o que está de um e d’outro lado.

Salve o que está em cima, salve o que está embaixo, salve o que está de um e d’outro lado.

 
Odu aqui Oba.
À Ajé, sem-lei, só digo o bastado.
Sou bastardo, nada mais.
Colofé!
Salve o que está em cima, salve o que está embaixo, salve o que está de um e d’outro lado.
Vê-me ao meio; o equilíbrio, o vácuo, amado, armado, amando: o nada.
Akepalô de Akessan se dá arê,
mas dado é sorteado por entre os que não se doam.
Sobra tanto, em meio, ao meio, miado.
Salve de mim mesmo a eterna vontade crua de sofrer demais,
é o que chora.
Salve-me da Estrada que o nada, do nada, para o nada, sempre corta.
Mata fechada, cerrada, , campo aberto, aos cansados,
vê de baixo, como penado, um punhado de céu e sente a tocar a cubata.
Salve o toque de macumba, macumbar, do yorubá, asè, meu velho.
O abadá turva sujo ao chão com o no vão, vê-me como adiê,
sou preto – dignidade vista de fora é pouca por conta da cor, ou do também pouco amor.
Meu corpo poreja de aguerê, oyá óia pra este aqui que sou,
cansado, morto, alvejado, maltratado, maltrapilho e desumanamente desamado.
Olha? O sangue . A dor poreja em cada um dos sulcos cansados de viver do meu rosto de filho não-quisto.
O primogênito seria melhor, maior, mais grato.
Talvez… Airá tem minha espalda e minha esposa, e aponta em décimo terceiro coro para uma só viva alma.
Baru, Bará, cadê Bará? Etutu, etu, etabá: tudo pronto pra festa de pisotear começar.
Ajé, Iá, seu pé me tem à garganta.
Sua reza não me balança, mas me mata.
Mata minha fala;
impossível ver a aos olhos,
quando se pode acusar e dar de adorar quem me expulsa de tudo e todos que um dia foram meus.
Idará ! Nunca roubei nada, pois roubado fui, até a .
Por sua cobiça, seu egoísmo, narcisismo sombrio que cega a sua e a minha calma.
Lavo minha alma. Lavro-a assim também.
Ilu soa como longe, fim. Longe fim.
Cinza à maza; e talvez a clareza atinga seu ori como raio de quem matou um dia.
Não como covarde, com arma e ímpeto, mas com vilania. Majestosa vilania.
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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