SEGURIDADE SOCIAL: DIREITO À CIDADANIA

Seguridade Social: Políticas Públicas de Direito à Cidadania

Desenhamos, no Brasil, um modelo de proteção social baseado no Estado de Bem-Estar Social implantado na Europa no pós-guerra.

Por Jacy Afonso de Melo 

A Constituição de 1988 representou etapa fundamental da viabilização do projeto das reformas socialmente progressistas que residem nos princípios da universalidade, da seguridade social e da compreensão de direitos sociais como componentes para a construção da cidadania.

Uma das inovações constitucionais mais expressivas foi a instituição da Seguridade Social (previdência urbana e rural, saúde, assistência social e seguro-desemprego), cujo financiamento está baseado na contribuição tripartite de empregados, empregadores e governo.

O Orçamento da Seguridade Social vinculou um conjunto de fontes baseadas em contribuições (folha de salários e Pis-Pasep) e impostos criados para esse fim: a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS.

A seguridade social é definida na Constituição Federal como um “conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.

SAÚDE: DIREITO DE TODOS E DEVER DO ESTADO

A saúde, segmento autônomo da Seguridade Social, tem a finalidade mais ampla de todos os ramos protetivos porque não possui restrição de beneficiários e de acesso.

As ações na saúde são instrumentalizadas pelo Sistema Único de Saúde – SUS, constituído por órgãos federais, estaduais e municipais, para executar ações de vigilância sanitária e epidemiológica, de saúde do trabalhador, participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico, colaborar na proteção do meio ambiente (nele incluído o do trabalho), fiscalizar e inspecionar alimentos, bebidas e águas, supervisionar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde.

ASSISTÊNCIA SOCIAL: GARANTIA DE ATENÇÃO ÀS NECESSIDADES BÁSICAS

Como diretrizes de organização da assistência social, a Constituição Federal estabeleceu a descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal. Esta organização foi disposta na Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, sob a forma de sistema descentralizado e participativo: o Sistema Único de Assistência Social – SUAS.

Ao atingir o status de política pública, a assistência social perde seu caráter assistencialista e passa a garantir/promover direitos sociais, com os objetivos de proteger a família, maternidade, infância, adolescência e velhice; amparar crianças e adolescentes carentes; promover a integração ao mercado de trabalho; reabilitar pessoas portadoras de deficiência com reinserção na vida comunitária; garantir salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e à pessoa idosa que não possuem meios de prover sua subsistência.

PREVIDÊNCIA SOCIAL: DIREITO DOS TRABALHADORES

Segmento autônomo da seguridade social, a previdência se preocupa com os trabalhadores e seus dependentes econômicos, enquanto técnica de proteção destinada a afastar necessidades decorrentes de contingências sociais que reduzem ou eliminam a capacidade de auto-sustento dos trabalhadores e/ou de seus dependentes.

Com natureza de seguro social, exige contribuição dos seus segurados. Não obstante a previdência social ser restrita aos que contribuem para seu financiamento, encontra na inclusão social os mesmos fins delineados para a saúde e a assistência social.

SEGURIDADE SOCIAL: GARANTIR E AVANÇAR

O atual momento exige vigilância e atuação efetiva. Direitos estão ameaçados. A resistência se organiza a partir do município, com a população pressionando o poder público para manter políticas públicas importantes para os munícipes.

A inclusão social traz igualdade de oportunidades por meio de programas como Bolsa Família, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, Saúde da Família, Territórios da Cidadania, Luz para Todos, valorização do salário mínimo. A construção de creches, casas abrigo para idosos e crianças em situação de rua são aspectos fundamentais de respeito aos direitos e de desenvolvimento sustentável e inclusivo.

Os programas de saúde a assistência otimizam recursos financeiros e humanos. Programas de saúde incluindo os relacionados à saúde do trabalhador são fundamentais. Organizar no município equipes de agentes comunitários de saúde e de combate às endemias, além de conectar a comunidade ao poder público, os profissionais das áreas efetivam ações essenciais à população.

Os primeiros acompanham as famílias, cadastrando suas necessidades de assistência e saúde, desenvolvem ações de educação e vigilância com ênfase na prevenção de doenças, identificam indivíduos e famílias em situações de risco, orientando-as no acesso aos serviços de que necessitam.

O grupo de combate às endemias realiza vistoria em residências, depósitos, terrenos baldios e estabelecimentos comerciais para buscar focos de doenças, orientando quanto à prevenção e ao tratamento de doenças infecciosas, atividade fundamental para prevenir e controlar doenças como dengue, Chikungunya,  zika, leishmaniose, malária.

Os programas de saúde do trabalhador devem adotar práticas sistemáticas para a promoção da saúde e do bem-estar no local de trabalho e da melhoria da qualidade de vida. Os órgãos municipais devem acompanhar empresas urbanas e rurais, avaliando ambientes de trabalho e promovendo a superação de descumprimento de normas. Os custos emocional, social e econômico dos acidentes de trabalho à sociedade em termos de saúde e previdência são altos, sendo muito mais eficiente a prevenção.

A Seguridade Social como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinado a assegurar os direitos relativos à saúde, previdência e assistência social, exige a criação de espaços de debate, sugestões e encaminhamentos de ações que envolvam as diferentes secretarias municipais envolvidas no tema e representantes da comunidade.  Novamente os Conselhos se apresentam como organismos eficazes de valorização de saberes e coparticipação na vida comunitária.

A Seguridade Social efetivamente se configura em inclusão social, uma vez que oportuniza a inserção e reinserção no mundo do trabalho, possibilita a interação social, promove a cidadania consciente. Configura-se em instrumento de efetivação dos direitos fundamentais, constituindo-se em paradigma para o desenvolvimento à medida que garante aos cidadãos um mínimo existencial que se situe dentro dos parâmetros da dignidade humana. Preservá-la, portanto, é imprescindível.

Mudar o mundo a partir da aldeia. A cidade é da cidadania!

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Foto: BBC

O DESMONTE DA SEGURIDADE SOCIAL 

Bolsonaro entregou pessoalmente ao Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, na tarde desta quarta-feira, a proposta de reforma da Previdência, em meio a uma forte crise no governo envolvendo crimes eleitorais, com candidaturas laranja do PSL nas eleições de 2018, que resultou na demissão do Ministro-Chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gustavo Bebiano.

Por Carlos Eduardo Gabas

O conjunto de medidas, chamado pelo Ministro Paulo Guedes de “Nova Previdência”, nada mais é do que um verdadeiro desmonte do nosso Sistema de Proteção Social com o objetivo de entregar a Previdência pública brasileira aos banqueiros, aumentando a remuneração do capital especulativo e concentrando riqueza nas mãos de quem já tem muito.

As mudanças propostas são um enorme retrocesso na garantia das condições mínimas de sobrevivência e na proteção dos trabalhadores e suas famílias, mas a sua face mais perigosa e cruel é a mudança do regime de repartição, baseado na solidariedade e no pacto entre gerações, para o regime de capitalização, que é individual, baseado no “esforço de cada um” para garantir sua aposentadoria.

O modelo de capitalização foi implantado no Chile em 1980, sob a Ditadura Militar do General Augusto Pinochet, e o resultado é trágico: aumento da informalidade, restrição do acesso à aposentadoria, empobrecimento da população e aumento das desigualdades sociais, e por outro lado, aumento da concentração da renda, da riqueza e dos lucros dos banqueiros.

A proposta apresentada acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição, exige idade mínima para todos os segurados, independente das atividades que exercem, e ainda aumenta o tempo mínimo de contribuição de 15 para 20 anos. Essas exigências impõem uma verdadeira barreira para o acesso à aposentadoria.

Como se isso não bastasse, muda também a regra de cálculo dos benefícios e reduz o valor a 60% da média das contribuições. Quem quiser se aposentar com 100% do valor dessa média, terá que trabalhar e contribuir por, pelo menos, 40 anos. Após a reforma trabalhista do Governo Temer, a rotatividade e a informalidade aumentaram ainda mais, e por isso será quase impossível que os trabalhadores consigam se aposentar com o valor total do seu salário de benefício.

Os trabalhadores rurais, especialmente da agricultura familiar, responsáveis pela produção de mais de 70% do nosso alimento, não conseguirão mais se aposentar, pois o aumento do tempo mínimo de contribuição e da idade, além da exigência de contribuição para a Previdência independentemente de comercialização da produção, certamente impedirão o acesso ao seu direito garantido na Constituição de 1988, sendo obrigados a trabalhar até a morte.

Professores só poderão se aposentar a partir dos 60 anos, com tempo mínimo de contribuição de 30 anos e professores nos Regimes Próprios (servidores públicos), precisarão ainda de 10 anos no serviço público, e 5 no cargo.

A previsão de um sistema de capitalização, que será criado por lei complementar, associado à chamada “Carteira de Trabalho Verde e Amarela”, que não prevê direitos trabalhistas ou proteção previdenciária, e que será “opcional”, ameaça os trabalhadores que poderão ser obrigados a realizar a tal “opção”, pois não haverá vagas de emprego no modelo convencional.

De forma semelhante, esse tipo de “opção” ocorreu durante a ditadura militar com a criação do FGTS, na qual o direito de optar ficou nas mãos dos empregadores, que só admitiam quem “optasse” pelo FGTS, e em contrapartida, o trabalhador abria mão da estabilidade no emprego.

A pensão por morte, que hoje é de 100% do valor do salário ou da aposentadoria do segurado falecido, será de 60% do valor mais 10% por dependente adicional, o que representa fragilizar as pessoas que perdem os entes familiares segurados. As aposentadorias especiais de categorias expostas a risco ou agente nocivo serão submetidas a diferentes idades mínimas, o que na prática, extingue esse direito.

O grau de crueldade ultrapassa todos os limites ao propor a redução do BPC-Benefício de Prestação Continuada, destinado a idosos e deficientes pobres, que atualmente é de 1 salário mínimo, para 400 Reais. Essa crueldade também afeta as mulheres, que serão gravemente prejudicadas pelas altas idades mínimas, sejam as seguradas do INSS, urbanas ou rurais, as professoras do setor público ou privado e as profissionais da segurança pública.

O argumento de que a reforma é necessária para o Brasil voltar a crescer e a gerar empregos é uma verdadeira enganação. Já foi provado, especialmente nos governos do Presidente Lula, que é possível combinar crescimento econômico com formalização e criação de novos empregos, aumento de salários, distribuição de renda, inclusão social, redução da pobreza e superávit nas contas do Governo e da Previdência Social.

Sabemos que o nosso modelo de proteção social carece de atualizações de tempos em tempos, justamente para adequar as regras à evolução natural da sociedade e do mercado de trabalho, porém, essa atualização de regras só pode ser realizada através de um amplo debate na sociedade.

Esse sistema de proteção social é tão importante para o nosso país, que ninguém deve propor mudanças sem ouvir todos os atores envolvidos: os empregadores, os aposentados e pensionistas e os trabalhadores em atividade.

Reconhecemos os desafios demográficos do país e das transformações do mercado de trabalho, que cada vez mais substitui postos de trabalho por tecnologia, mas acreditamos que o maior desafio para que a Seguridade Social continue protegendo a sociedade, está na reorganização da sua base de financiamento, e para enfrentá-lo, propomos o fim das renúncias fiscais, a cobrança dos sonegadores, a revogação do perdão de dívidas realizadas no Governo Temer, …

a revogação da lei 13.586 (mais conhecida por MP do trilhão) proposta e aprovada em 2017 como um verdadeiro presente às empresas petrolíferas estrangeiras, que deixarão de pagar mais de 1 trilhão de reais aos cofres públicos, valor equivalente a toda a economia alcançada com a reforma proposta por Jair Bolsonaro.

Além disso, é urgente uma reforma tributária que seja justa com os mais pobres, que pagam muito mais impostos do que as classes mais favorecidas. Em nenhum momento a proposta trata de reestruturar a estratégia de financiamento do sistema.

Não prevê cobrar imposto ou contribuição social sobre dividendos, nem a extinção do absurdo privilégio das grandes empresas, que podem distribuir lucro disfarçado de juros sobre o capital próprio, nem a cobrança de imposto ou contribuição sobre as grandes heranças dos bilionários.

Por tudo isso é que devemos esclarecer a sociedade sobre as graves consequências que sofreremos, caso a proposta do governo Bolsonaro seja aprovada no Congresso Nacional. Só resta aos trabalhadores organizar a luta e a resistência para que os parlamentares não cometam esse crime contra a sociedade brasileira. Queremos reforma tributária já!

O que o Brasil precisa é voltar a crescer, gerar emprego e distribuir renda e riqueza, diminuindo a enorme desigualdade social que assola nosso país.

Carlos Eduardo Gabas foi ministro da Previdência Social entre março de 2010 e janeiro de 2011 e entre janeiro e outubro de 2015.

Fonte: https://lula.com.br/carlos-gabas-o-desmonte-da-seguridade-social/

 

 

 

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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