SER UM JOVEM COMUNISTA

SER UM JOVEM COMUNISTA

Ser um jovem comunista

Leia aqui a Conferência pronunciada na Unión de Jóvenes Comunistas em 20 de Outubro de 1962. Publicado pela primeira vez em: Verde Olivo, ano 3, nº 43, 28 de Outubro de 1962, Havana, Cuba.

Por Ernesto Che Guevara

Queridos companheiros:

Uma das tarefas mais gratificantes de um revolucionário é a de ir observando, no transcurso dos anos da Revolução, como se vão formando, decantando e fortalecendo as instituições que nasceram no início da Revolução; como se convertem em verdadeiras instituições com força, vigor e autoridade entre as massas, aquelas organizações que começaram em pequena escala com muitas dificuldades, com muitas indecisões e foram se transformando, mediante o trabalho diário e o contato com as massas, em pujantes representações do movimento revolucionário de hoje.

A União de Jovens Comunistas tem quase os mesmos anos da nossa Revolução, através dos distintos nomes que já teve, através das distintas formas de organização. No princípio foi uma emanação do Exército Rebelde. Daí, talvez, tenha surgido também seu nome. Era uma organização ligada ao exército para iniciar a juventude cubana nas tarefas de massas da defesa nacional, que era o problema mais urgente e o que precisava de uma solução mais rápida.

No antigo Departamento de Instrução do Exército Rebelde nasceram a Associação de Jovens Rebeldes (AJR) e as Milícias Nacionais Revolucionárias (MNR). Depois adquiriram vida própria: esta última, a de uma pujante formação do povo armado, representante do povo armado e com categoria própria, fundida com nosso exército nas tarefas de defesa. A outra, como uma organização destinada à superação política da juventude cubana.

Depois, quando a Revolução foi se consolidando e pudemos nos colocar as tarefas novas que se veem no horizonte, o companheiro Fidel sugeriu a mudança do nome desta organização. Uma mudança de nome que é toda uma expressão de princípios. A União de Jovens Comunistas está diretamente orientada para o futuro. Está vertebrada com vistas ao futuro luminoso da sociedade socialista, depois de atravessar o difícil caminho em que estamos agora da construção de uma nova sociedade, no caminho da consolidação total da ditadura de classe, expressa através da sociedade socialista, para chegar finalmente à sociedade sem classes, à sociedade perfeita, à sociedade que vocês serão encarregados de construir, de orientar e de dirigir no futuro.

Para isso, a União de Jovens Comunistas levanta seus símbolos, que são os símbolos de todo o povo de Cuba: o estudo, o trabalho e o fuzil.

E suas medalhas mostram dois dos mais altos expoentes da juventude cubana, ambos mortos tragicamente, sem poderem chegar a ver o resultado final desta luta em que todos estamos empenhados: Julio Antonio Mella e Camilo Cienfuegos.

Neste segundo aniversário, nesta hora de construção febril, de preparativos constantes para a defesa do país, de preparação técnica e tecnológica acelerada ao máximo, deve-se colocar sempre, e antes de tudo, o problema do que é e do que deve ser a União de Jovens Comunistas.

A União de Jovens Comunistas tem que se definir com uma só palavra: vanguarda. Vocês, companheiros, devem ser a vanguarda de todos os movimentos. Os primeiros a estarem dispostos para os sacrifícios que a Revolução demande, qualquer que seja a natureza desses sacrifícios. Os primeiros no trabalho. Os primeiros no estudo. Os primeiros na defesa do país.

E colocar-se esta tarefa não apenas como a expressão total da juventude de Cuba, não apenas como uma tarefa de grandes massas vertebradas em uma instituição, mas como as tarefas diárias de cada um dos integrantes da União de Jovens Comunistas. Para isso, é necessário colocar-se tarefas reais e concretas, tarefas de trabalho cotidiano que não podem admitir o menor desânimo.

A tarefa da organização deve estar constantemente unida a todo o trabalho que se desenvolva na União de Jovens Comunistas. A organização é a chave que permite fortalecer as iniciativas que surgem dos líderes da Revolução, as iniciativas colocadas em reiteradas oportunidades por nosso Primeiro-Ministro [Fidel Castro], e as iniciativas que surgem no seio da classe operária, que também devem se transformar em diretrizes precisas, em ideias precisas para ação subsequente.

Se não existe a organização, as ideias, depois do primeiro momento de impulso, vão perdendo eficácia, vão caindo na rotina, vão caindo no conformismo e acabam por ser simplesmente uma lembrança.

Faço esta advertência porque muitas vezes neste curto e, não obstante, tão rico período de nossa Revolução, muitas grandes iniciativas fracassaram, caíram no esquecimento pela falta do aparato organizativo necessário para poder sustentá-las e levá-las a bom termo.

Ao mesmo tempo, todos e cada um de vocês devem ter presente que ser jovem comunista, pertencer à União de Jovens Comunistas, não é uma graça que alguém lhes concede, nem é uma graça que vocês concedem ao Estado ou à Revolução. Pertencer à União de Jovens Comunistas deve ser a mais alta honra de um jovem da sociedade nova. Deve ser uma honra pela qual lutem a cada momento de sua existência. E, além disso, a honra de manter-se e manter no alto o nome individual dentro do grande nome da União de Jovens Comunistas. Deve ser um empenho constante também.

Desta forma avançaremos ainda mais rapidamente. Acostumando-nos a pensar como massa, a atuar com as iniciativas que nos oferece a grande iniciativa da massa operária e as iniciativas dos nossos dirigentes máximos; e, ao mesmo tempo, atuar sempre como indivíduos, permanentemente preocupados com nossos próprios atos, permanentemente preocupados que nossos atos não manchem nosso nome nem o nome da associação a que pertencemos.

Depois de dois anos podemos recapitular e observar quais foram os resultados desta tarefa. E há enormes conquistas na vida da União de Jovens Comunistas. Uma das mais importantes, das mais espetaculares, foi a da defesa.

Os jovens que primeiro – alguns deles – subiram os cinco picos do Turquino [montanha mais alta de Cuba, localizada na Sierra Maestra], os que se alistaram em uma série de organizações militares, todos os que empunharam o fuzil nos momentos de perigo estiveram prontos a defender a Revolução em cada um dos lugares onde se esperava a invasão ou a ação inimiga.

Aos jovens da Praia Girón lhes coube a altíssima honra de ali poder defender nossa Revolução, ali defender as instituições que criamos com sacrifício, as conquistas que todo o povo conseguiu em anos de luta; toda nossa Revolução foi defendida ali em 72 horas de luta.

A intenção do inimigo era criar uma cabeça de praia suficientemente forte, com um aeroporto dentro, que permitisse hostilizar todo nosso território, bombardeá-lo sem misericórdia, converter nossas fábricas em cinzas, reduzir a pó nossos meios de comunicação, arruinar nossa agricultura. Em uma palavra: semear o caos em nosso país. A ação decidida de nosso povo liquidou a intentona imperialista em apenas 72 horas.

Jovens que ainda eram crianças se cobriram de glória. Alguns estão aqui hoje como expoentes dessa juventude heroica, e de outros nos resta pelo menos seus nomes como recordação, como incentivo para novas batalhas, que terão que ser travadas, para novas atitudes heroicas frente ao ataque imperialista.

No momento em que a defesa do país era a tarefa mais importante, a juventude esteve presente. Hoje a defesa do país segue ocupando o primeiro lugar em nossos deveres. Mas não devemos esquecer que a palavra de ordem que guia os jovens comunistas está intimamente ligada entre si: não pode haver defesa do país somente no exercício das armas, prontas para a defesa, mas, além disso, devemos defender o país construindo-o com o nosso trabalho e preparando os novos quadros técnicos para acelerar seu desenvolvimento nos anos vindouros. Agora esta tarefa adquire uma enorme importância e está na mesma altura que a do exercício direto das armas.

Quando se colocaram problemas como estes a juventude disse presente mais uma vez. Os jovens brigadistas responderam ao chamado da Revolução, invadiram todos os cantos do país. E assim, em poucos meses e em uma batalha muito dura – na qual houve inclusive mártires da Revolução, mártires da educação – pudemos anunciar uma situação nova na América Latina: a de que Cuba era um território livre do analfabetismo na América.

O estudo, em todos os níveis, é também hoje uma tarefa da juventude. O estudo misturado com trabalho, como no caso dos jovens estudantes que estão colhendo café no [na província] Oriente, que utilizam suas férias para colher um grão tão importante em nosso país, para nosso comércio exterior, para nós, que consumimos uma grande quantidade de café todos os dias. Esta tarefa é similar à da alfabetização. É uma tarefa de sacrifício que se faz alegremente, reunindo-se os companheiros estudantes – mais uma vez – nas montanhas de nosso país para levar ali sua mensagem revolucionária.

São muito importantes essas tarefas porque nelas a União de Jovens Comunistas, os jovens comunistas não apenas dão. Recebem, e em alguns casos mais do que dão: adquirem experiências novas, uma nova experiência do contato humano, novas experiências de como vivem nossos camponeses, de como é o trabalho e a vida nos lugares mais distantes, de tudo o que é preciso fazer para elevar aquelas regiões ao mesmo nível dos lugares mais habitáveis do campo e das cidades. Adquirem experiência e maturidade revolucionárias.

Os companheiros que passam por aquelas tarefas de alfabetizar ou colher café, em contato direto com nosso povo, ajudando-o longe de seus lares, recebem – posso afirmá-lo – mais ainda do que dão, e o que dão é muito!

Esta é a forma de educação que melhor se ajusta a uma juventude que se prepara para o comunismo: a forma de educação na qual o trabalho perde a categoria de obsessão que tem no mundo capitalista e passa a ser um gratificante dever social, que se realiza com alegria, que se realiza ao som de cantos revolucionários, em meio à camaradagem mais fraternal, em meio a contatos humanos que dão vigor a uns e outros, e a todos elevam.

Além disso, a União de Jovens Comunistas avançou muito em sua organização. Daquele débil embrião que se formou como apêndice do Exército Rebelde, até esta organização de hoje, há uma grande diferença. Por todas as partes, em todos os centros de trabalho, em todos os organismos administrativos, em todos os lugares onde possam exercer sua ação, ali há jovens comunistas e ali estão trabalhando para a Revolução.

O avanço organizativo deve também ser considerado também como uma conquista importante da União de Jovens Comunistas.

Contudo, companheiros, neste difícil caminho houve muitos problemas, têm havido grandes dificuldades, têm havido erros grosseiros, e nem sempre temos podido superá-los. É evidente que a União de Jovens Comunistas, como organismo inferior, como irmão menor das Organizações Revolucionárias Integradas, tem que beber aí das experiências dos companheiros que mais têm trabalhado em todas as tarefas revolucionárias, e deve escutar sempre – com respeito – a voz dessa experiência.

Mas a juventude tem que criar. Uma juventude que não cria é uma anomalia, realmente. E à União de Jovens Comunistas tem faltado um pouco de espírito criador. Tem sido, através de sua direção, demasiado dócil, demasiado respeitosa e pouco decidida a colocar-se problemas próprios.

Hoje está se rompendo com isso. O companheiro Joel [Iglesias] nos falava das iniciativas dos trabalhos nas fazendas. São exemplos de como se começa a romper a dependência total – que se torna absurda – de um organismo superior, como se começa a pensar com a própria cabeça.

Mas é que nós, e nossa juventude como todos nós, estamos convalescentes de uma doença que, felizmente, não foi muito longa, mas que influiu muito no atraso do desenvolvimento do aprofundamento ideológico de nossa Revolução. Estamos todos convalescentes deste mal, chamado sectarismo.

A que conduziu o sectarismo? Conduziu à cópia mecânica, às análises formais, à separação entre a direção e as massas. Inclusive na nossa Direção Nacional, e o reflexo direto se produziu aqui, na União de Jovens Comunistas.

Se nós – também desorientados pelo fenômeno do sectarismo – não conseguíamos ouvir a voz do povo, que é voz mais sábia e mais orientadora, se não conseguíamos perceber as aspirações do povo para poder transformá-las em ideias concretas, em diretrizes precisas, mal poderíamos dar essas diretrizes à União de Jovens Comunistas. E como a dependência era absoluta, como a docilidade era muito grande, a União de Jovens Comunista navegava como pequeno barco sem rumo, dependendo do grande barco: nossas Organizações Revolucionárias, que estas também, navegavam sem rumo.

Aqui se realizavam pequenas iniciativas, que era a única coisa que a União de Jovens Comunistas era capaz de produzir, as quais, às vezes, se transformavam em slogans grosseiros, em evidentes manifestações sem profundidade ideológica.

O companheiro Fidel fez sérias críticas de extremismos e de expressões, algumas tão conhecidas por todos vocês, como: “a ORI é a luz…”, “somos socialistas, em frente, em frente…”. Todas aquelas coisas que Fidel criticava, e que vocês conhecem bem, eram o reflexo do mal que atacava nossa Revolução.

Nós saímos dessa época. Nós liquidamos totalmente essa época. Contudo, sempre os organismos vão um pouco mais atrasados. É como um mal que houvesse deixado uma pessoa inconsciente. Quando o mal cede, o cérebro se recupera, recupera a clareza mental, mas, no entanto, os membros não coordenam bem seus movimentos, os primeiros dias depois de levantar-se do leito o andar é inseguro e pouco a pouco vai-se adquirindo a nova segurança. Nós estamos nesse caminho.

Assim devemos definir e analisar objetivamente todos nossos organismos para continuarmos melhorando. Saber, para não cairmos, para não tropeçarmos e ir ao chão; conhecer nossas debilidades para aprender a resolvê-las, conhecer nossas fraquezas para liquidá-las e adquirir mais força.

Essa falta de iniciativa própria se deve ao desconhecimento, durante um bom tempo, da dialética que move os organismos de massa e ao esquecimento de que os organismos como a União de Jovens Comunistas não podem ser simplesmente de direção, não podem ser algo que constantemente mande diretrizes às bases e que não receba nada delas.

Pensava-se que a União de Jovens Comunistas e todas as organizações de Cuba eram organizações de uma só linha. Uma só linha que ia desde a cabeça até as bases, mas que não tinha um cabo de retorno que trouxesse a comunicação das bases. Um duplo e constante intercâmbio de experiências, de ideias, de diretrizes, que vêm a ser as mais importantes, as que fizeram centrar o trabalho de nossa juventude.

Ao mesmo tempo, podiam ser observados os pontos onde o trabalho esteve mais frouxo, os pontos em que fraquejara mais.

Nós vemos como os jovens, quase heróis de novela, que podem entregar sua vida cem vezes pela Revolução, se os chamamos para qualquer tarefa concreta e esporádica marcham em massa até elas. Porém às vezes faltam ao seu trabalho porque tinham uma reunião da União de Jovens Comunistas, ou porque se deitaram tarde na noite anterior, discutindo alguma iniciativa dos Jovens Comunistas, ou simplesmente não vão ao trabalho porque não, sem causa justificada.

Quando se observa uma brigada de trabalho voluntário, onde se supõe que estejam os jovens comunistas, em muitos casos eles não estão. Não há nenhum. O dirigente tinha que ir a uma reunião, o outro estava doente, um terceiro não havia sido bem informado. E o resultado é que a atitude fundamental, a atitude de vanguarda do povo, a atitude de exemplo vivo que comove e empurra todo mundo para frente – como fizeram os jovens da Praia de Girón –, essa atitude não se repete no trabalho. A seriedade que deve ter a juventude de hoje para enfrentar os grandes compromissos – e o compromisso maior é a construção da sociedade socialista – não se reflete no trabalho concreto.

Há grandes debilidades e é preciso trabalhar nelas. Trabalhar organizando, trabalhar marcando o lugar onde dói, o lugar onde há debilidades a corrigir, e trabalhar sobre cada um de vocês para deixar bem claro em suas consciências que não pode ser bom comunista aquele que somente pensa na Revolução quando chega o momento do sacrifício, do combate, da aventura heroica, do que sai do vulgar e do cotidiano e, no entanto, no trabalho é medíocre ou menos que medíocre.

Como pode ser isso, se vocês já recebem o nome de jovens comunistas, o nome que nós, como organização dirigente, partido dirigente, ainda não temos? Vocês que têm que construir um futuro no qual o trabalho será a dignidade máxima do homem, o trabalho será um dever social, um prazer que o homem se dá, onde o trabalho será criativo ao máximo e todo o mundo deverá estar interessado no seu trabalho e no dos demais, no avanço da sociedade, dia a dia.

Como pode ser que vocês que hoje já têm esse nome, desdenham do trabalho? Aí há uma falha. Uma falha de organização, de esclarecimento, de trabalho. Uma falha, além disso, humana. A todos nós – a todos, acredito – nos agrada muito mais aquilo que quebra a monotonia da vida, aquilo que de imediato, de vez em quando, faz alguém pensar no seu próprio valor, no valor que tem dentro da sociedade.

E imagino o orgulho daqueles companheiros que estavam em uma das “quatro bocas”, por exemplo, defendendo sua pátria dos aviões ianques, e de repente alguém tinha a sorte de ver que suas balas alcançavam um avião inimigo. Evidentemente é o momento mais feliz na vida de um homem. Isso nunca se esquece. Nunca o esquecerão os companheiros que viveram esta experiência.

Mas nós temos que defender nossa Revolução, a que estamos fazendo todos os dias. E para poder defendê-la, é necessário ir construindo-a, fortalecendo-a com esse trabalho que hoje não agrada à juventude, ou que, ao menos, considera como o último de seus deveres, porque ainda conserva a mentalidade antiga, a mentalidade proveniente do mundo capitalista, ou seja, que o trabalho é, sim, um dever, é uma necessidade, mas um dever e uma necessidade tristes.

Por que isso ocorre? Porque ainda não temos dado ao trabalho seu verdadeiro sentido. Não temos sido capazes de unir o trabalhador com o objeto de seu trabalho. E, ao mesmo tempo, de transmitir ao trabalhador a consciência da importância que tem o ato criador que realiza dia a dia.

O trabalhador e a máquina, o trabalhador e o objeto sobre o qual se exerce o trabalho são duas coisas diferentes e antagônicas. E aí é necessário trabalhar, para ir formando novas gerações que tenham o máximo interesse em trabalhar e saibam encontrar no trabalho uma fonte permanente e em constante mudança de novas emoções. Fazer do trabalho algo criador, alvo novo.

Este é talvez o ponto mais fraco da nossa União de Jovens Comunistas. Por isso hoje enfatizo este ponto, e em meio à alegria de festejar esta data de aniversário, volto a pôr a pequena gota de amargura para tocar o ponto sensível, para chamar a juventude a reagir.

Hoje estivemos em uma assembleia em que se discutia algo no Ministério. Muitos de vocês provavelmente já tenham discutido a emulação nos seus centros de trabalho e tenham lido um tremendo papel que está circulando. Mas qual é o problema da emulação, companheiros? O problema é que a emulação não pode ser regida por papéis que a regulamentem, a ordenem e lhe deem um molde. O regulamento e o molde são necessários para poder comparar, depois, o trabalho da gente entusiasmada que está emulando.

Quando dois companheiros começam a emular, cada um em uma máquina para construir mais, depois de um tempo começam a sentir a necessidade de algum regulamento para determinar qual dos dois produz mais em sua máquina: a qualidade do produto, a quantidade, as horas de trabalho, a forma em que fica a máquina depois, como a atenderam… Muitas coisas. Mas se em vez de se tratar de dois companheiros que efetivamente emulam e aos quais nós vamos dar um regulamento, aparece um regulamento para outros dois que estão pensando em que chegue a hora de ir para casa, para que serve o regulamento, que função cumpre?

Em muitas coisas estamos trabalhando com regulamento e fazendo o molde para algo que não existe. O molde tem que ter um conteúdo, o regulamento tem que ser, nestes casos, o que defina e limite uma situação já criada. O regulamento deveria ser o resultado da emulação levada a cabo anarquicamente, se quiserem, sim, mas entusiasmada, transbordante para todos os centros de trabalho de Cuba. Automaticamente surgiria a necessidade de regulamentar, de fazer uma emulação com regulamentos.

Assim temos tratado muitos problemas, assim temos sido formais no tratamento de muitas coisas. E quando nesta assembleia perguntei por que não havia estado, ou quantas vezes havia estado o secretário dos Jovens Comunistas, soube que havia estado algumas vezes, poucas, e que os Jovens Comunistas não haviam estado.

Mas no curso da assembleia, discutindo estes problemas e outros, os Jovens Comunistas, o núcleo, a Federação de Mulheres e os Comitês de Defesa e o Sindicato, naturalmente, se encheram de entusiasmo. Pelo menos se encheram de um remorso interno, de amargura, de um desejo de melhorar, um desejo de demonstrar que eram capazes de fazer aquilo que não se havia feito: movimentar as pessoas. Então, imediatamente, todos se comprometeram a fazer com que o Ministério completo emulasse em todos os níveis, a discutir o regulamento, depois de estabelecer as emulações, e voltar dentro de quinze dias para apresentar já todo um fato concreto, com todo o Ministério emulando entre si.

Ali já há mobilização. As pessoas já compreenderam e sentiram intimamente – porque cada companheiro desses é um grande companheiro – que havia algo frouxo em seu trabalho. Se encheram de dignidade ferida e foram resolver. Isso é o tem que ser feito. Perdoem-me se insisto mais uma vez, mas é que sem trabalho não há nada. Toda a riqueza do mundo, todos os valores que tem a humanidade, não são nada mais que trabalho acumulado. Sem isso não pode existir nada. Sem o trabalho extra que se dá para criar mais excedentes para novas fábricas, para novas instalações sociais o país não avança. E por mais fortes que sejam nossos exércitos estaremos sempre com um ritmo lento de conhecimento, e é preciso romper com isso, romper com todos os velhos erros, manifestá-los publicamente, analisá-los em cada lugar e, então, corrigi-los.

Quero colocar agora, companheiros, qual é a minha opinião, a visão de um dirigente nacional das ORI, sobre o que deve ser um jovem comunista, para ver se estamos todos de acordo.

Eu creio que a primeira coisa que deve caracterizar um jovem comunista é a honra que sente por ser jovem comunista. Esta honra que o leva a mostrar para todo o mundo sua condição de jovem comunista, que não o vira na clandestinidade, que não o reduz a fórmulas, mas que o expressa em cada momento, que lhe sai do espírito, que tem interesse em demonstrá-lo porque é seu símbolo de orgulho.

Junto com isso, um grande sentido de dever para com a sociedade que estamos construindo, com nossos semelhantes como seres humanos e com todos os homens do mundo.

Isso é algo que deve caracterizar o jovem comunista. Ao lado disso, uma grande sensibilidade frente a todos os problemas, grande sensibilidade frente à injustiça; espírito inconformado cada vez que surja algo que está mal, tenha sido dito por quem quer que seja. Questionar tudo o que não se entenda; discutir e pedir esclarecimentos do que não estiver claro; declarar guerra ao formalismo, a todos os tipos de formalismo. Estar sempre aberto para receber as novas experiências, para conformar a grande experiência da humanidade, que já leva muitos anos avançando pelo caminho do socialismo, nas condições concretas de nosso país, nas realidades que existem em Cuba: e pensar – todos e cada um – como ir mudando a realidade, como ir melhorando-a.

O jovem comunista deve propor-se a ser sempre o primeiro em tudo, lutar para ser o primeiro, e sentir-se incomodado quando em alguma coisa ocupa outro lugar. Lutar para melhorar, para ser o primeiro. Claro que nem todos podem ser o primeiro, mas sim estar entre os primeiros, no grupo de vanguarda. Ser um exemplo vivo, ser o espelho onde olhem os companheiros que não pertençam às juventudes comunistas, ser o exemplo onde possam se olhar os homens e as mulheres de idade mais avançada que tenham perdido certo entusiasmo juvenil, que tenham perdido a fé na vida e que diante do estímulo do exemplo sempre reagem bem. Essa é outra tarefa dos jovens comunistas.

Junto com isso, um grande espírito de sacrifício, um espírito de sacrifício não somente para as jornadas heroicas, mas para todo momento. Sacrificar-se para ajudar o companheiro nas pequenas tarefas, para que possa assim cumprir seu trabalho, para que possa cumprir com seu dever no colégio, no estudo, para que possa melhorar de qualquer forma. Estar sempre atento a toda a massa humana que o rodeia.

Quer dizer: se propõe a todo jovem comunista ser essencialmente humano, ser tão humano que se aproxime do melhor do humano, purificar o melhor do homem por meio do trabalho, do estudo, do exercício da solidariedade continuada com o povo e com todos os povos do mundo, desenvolver ao máximo a sensibilidade até se sentir angustiado quando se assassina um homem em qualquer canto do mundo e para sentir-se entusiasmado quando em algum canto do mundo se levanta uma nova bandeira de liberdade.

O jovem comunista não pode estar limitado pelas fronteiras de um território: o jovem comunista deve praticar o internacionalismo proletário e senti-lo como coisa própria. Lembrar-se, como devemos nos lembrar, aspirantes a comunistas aqui em Cuba, que somos um exemplo real e palpável para toda a nossa América Latina, e mais ainda que para nossa América, para outros países do mundo que lutam também em outros continentes por sua liberdade, contra o colonialismo, contra o neocolonialismo, contra o imperialismo, contra todas as formas de opressão dos sistemas injustos; lembrar-se sempre que somos uma tocha acesa, de que nós todos somos o mesmo espelho que cada um de nós é individualmente para o povo de Cuba, e somos esse espelho para que se olhem nele os povos da América Latina, os povos do mundo oprimido que lutam por sua liberdade. E devemos ser dignos desse exemplo. A todo momento e a toda hora devemos ser dignos desse exemplo.

Isso é o que nós pensamos que deve ser um jovem comunista. E se nos disserem que somos quase uns românticos, que somos uns idealistas inveterados, que estamos pensando em coisas impossíveis, e que não se pode conseguir que a massa de um povo seja quase um arquétipo humano, nós temos que responder, mil vezes que sim, que sim se pode, que estamos no certo, que todo o povo pode ir avançando, ir liquidando a mesquinhez humana, como fomos liquidando em Cuba nestes quatro anos de Revolução; ir se aperfeiçoando como nos aperfeiçoamos todos dia a dia, liquidando intransigentemente todos aqueles que ficaram para trás, que não são capazes de marchar no ritmo que marcha a Revolução cubana. Tem de ser assim, deve ser assim, e assim será, companheiros. Será assim porque vocês que são jovens comunistas, criadores da sociedade perfeita, seres humanos destinados a viver em um mundo novo do qual haverá desaparecido definitivamente tudo o que é caduco, todo o velho, tudo o que represente a sociedade cujas bases acabam de ser destruídas.

Para alcançar isso é necessário trabalhar todos os dias. Trabalhar no sentido interno de aperfeiçoamento, de aumento dos conhecimentos, de aumento da compreensão do mundo que nos rodeia. Inquirir e averiguar e conhecer bem o porquê das coisas e colocar-se sempre os grandes problemas da humanidade como problemas próprios.

Assim, em um dado momento, em um dia qualquer dos próximos anos – depois de passar muitos sacrifícios, sim, depois de havermos visto, talvez muitas vezes, à beira da destruição –, depois de havermos visto talvez como nossas fábricas são destruídas e de tê-las reconstruído novamente, depois de assistir ao assassinato, à matança de muitos dos nossos e de reconstruir o que tiver sido destruído, ao fim de tudo isso, num dia qualquer, quase sem nos darmos conta, teremos criado, junto como os outros povos do mundo, a sociedade comunista, nosso ideal.

Companheiros, falar para a juventude é uma enorme tarefa. A gente se sente nesse momento capaz de transmitir algumas coisas e sente a compreensão da juventude. Há muita coisa que queria dizer sobre todos os nossos esforços, nossos anseios; de como, porém, muitos deles se rompem diante da realidade diária e como é necessário voltar ao início. Dos momentos de fraqueza e de como o contato com o povo – com os ideais e a pureza do povo – nos infunde novo fervor revolucionário.

Haveria muitas coisas das quais falar. Mas também temos que cumprir com nossos devedores. E aproveito para explicar-lhes porque me despeço de vocês, com toda má intenção se vocês quiserem. Me despeço de vocês porque vou cumprir com meu dever de trabalhador voluntário numa fábrica têxtil; lá estamos trabalhando já há algum tempo. Estamos emulando com a Empresa Consolidada de Fios e Tecidos Planos, que trabalha em outra fábrica têxtil e estamos emulando com a Junta Central de Planificação, que trabalha em outra fábrica têxtil.

Quero dizer-lhes, honestamente, que o Ministério da Indústria está em último na emulação, que temos que fazer um grande esforço, maior, repetir constantemente, para avançar, para poder cumprir aquilo que nós mesmos dissemos de ser os melhores, de aspirar a ser os melhores, porque nos dói ser os últimos na emulação socialista.

Acontece, simplesmente, que aqui ocorreu o mesmo que ocorreu a muitos de vocês: a emulação é fria, um pouco inventada, e não temos sabido entrar em contato direto com a massa de trabalhadores da indústria. Amanhã teremos uma assembleia para discutir esses problemas e para tratar de resolvê-los todos, buscar os pontos de união, de estabelecer uma linguagem comum de uma identidade absoluta entre os trabalhadores dessa indústria e nós trabalhadores do Ministério. E depois de conseguir isso, estou seguro de que aumentaremos muito os rendimentos ali e que poderemos, pelo menos, lutar honradamente pelos primeiros lugares.

Em todo caso, na próxima assembleia, no ano que vem, lhes contaremos e resultado. Até lá.

Fonte: Marxists

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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