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Sinfonia da Alvorada

Sinfonia da Alvorada

O – particularmente Brasília – tem uma dívida de 55 anos com Antônio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes: a execução da “Sinfonia da Alvorada” tal como concebida por seus autores, a céu aberto, na Praça dos Três Poderes. E com o “espetáculo de luzes” a acompanhar a e a que descreve a saga da ocupação do Planalto Central…

Por Alceu Simões Nader

Rodava o ano de 1960 quando ambos comeram o pó da estrada para presenciar a frenética construção da cidade, com gente de todas as partes do país participando de um sonho que o então presidente Juscelino Kubistchek resolveu tornar realidade.

O “Maestro Soberano” e o “Poetinha” idealizaram a sinfonia à cidade que espelhava o futuro, tingiram de a música e os versos que registraram seu surgimento no , mas o espetáculo nunca aconteceu. Nem mesmo na única vez em que foi apresentado a céu aberto, como o plano original, em 1984, durante o governo Itamar Franco. As luzes e cores estão na melodia e na “poesia-documento”, como o próprio Vinicius de Moraes classificou, mas jamais foram exibidas ao público na cidade branca projetada por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa.

A ideia da união entre música, poesia e cores iluminando os principais edifícios da cidade acompanhou o desde o início, em 1958, dois anos antes da inauguração oficial da nova Capital Federal. Vinicius estava em Petrópolis, recuperando-se de um acidente automobilístico. Niemeyer o provocou: escrever com Jobim uma obra para a futura Capital, em parceria com técnicos franceses especialistas na então nascente arte de cobrir com efeitos luminosos patrimônios culturais mundo afora.
Vinicius aceitou o desafio, apesar de um novo projeto iniciado por ambos e que iria arrebatar as plateias europeias: o filme Orfeu Negro, com música e poesia também compostas pelos dois. A ideia foi adiada sem prazo definido, por causa das obrigações de Vinicius como diplomata. Recuperado do acidente, ele teve de reassumir seu posto em Montevideo, mas já havia inoculado em Tom Jobim a ideia da homenagem.

O entusiasmo, porém, durou pouco. As críticas e o derrotismo dos grandes grupos de comunicação da época – com O Globo e O Estado de S. Paulo à frente – não tardaram a alcançar a dupla. Tratava-se, segundo eles, de obra oficialesca, “encomendada” – adjetivo que minou principalmente o entusiasmo de Jobim.
“Houve logo, é claro, quem falasse em obra ‘encomendada’ e outras tolices do gênero, o que feriu certas suscetibilidades de Jobim”, escreveu Vinicius no libreto que acompanha o disco de vinil da Columbia – hoje um documento histórico, “e a tarefa ficou postergada para dias mais inteligentes”.

Os “dias mais inteligentes” vieram um ano depois do desafio lançado por Niemeyer, quando a dupla de compositores consagrou-se com a Palma de Ouro do Festival de Cannes de 1959, com o filme “Orfeu Negro”, drama da sobre a paixão de Orfeu e Eurídice, de Marcel Camus. A conquista do prêmio – pela primeira vez, um filme em ganhava reconhecimento em Cannes – calou os críticos e Vinicius deu o troco:

“De nada valia o pio das aves de mau agouro da imprensa e de alhures, contra o ímpeto maravilhoso do trabalhador brasileiro, que ocorreu de todos os cantos do país, sobretudo do Norte, para erguer aquelas estruturas adiante do Tempo e para coabitar pacificamente numa ‘cidade-livre’ levantada do dia para a noite com restos de material de construção: uma autêntica cidade de faroeste, só que sem os tiros e bandidos do , escreveu o poeta.

Niemeyer voltou à carga no auge da consagração de Cannes e tornou a provocar Vinicius com a proposta da sinfonia casada ao “espetáculo de luzes” que, nas palavras de Vinicius, deveria ser produzido “à maneira dos que são feitos nos principais castelos franceses e em vários outros grandes monumentos do mundo, como a Acrópole, as Pirâmides e tantos mais, para fins de atração turística”.

Jobim comprou novamente a ideia, Vinicius requereu nova licença no Itamaraty e, três meses depois, ambos encontravam-se hospedados no Catetinho, então residência oficial de JK na semideserta Capital Federal.

A viagem à cidade em obras foi justificada como uma busca de realismo ao que estava acontecendo no goiano, mas a maior parte do Brasil desconhecia. Durante dez dias, Vinicius misturou-se com operários e engenheiros, enquanto Tom embrenhava-se na mata ao lado do Catetinho para ouvir o canto dos pássaros do cerrado.

A estada rendeu não apenas a sinfonia, mas vários clássicos jobinianos como “Água de beber”, composta em homenagem a uma mina d’água da mata que cercava o Catetinho, e “O homem”, regravada dezesseis anos depois no álbum “Urubu”, com nova sonoridade.

Mas a Sinfonia continua inédita.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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