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Um orçamento desastroso

Um orçamento desastroso 

A peça aprovada mistura austeridade, flexibilização casuística de regras e priorização de despesas sem impacto social, com baixo efeito multiplicador e redistributivo, amarrando o Brasil numa crise sem fim

Por Reginaldo Lopes/ PT Nacional

Analisar o Orçamento aprovado para o último ano do atual governo é fazer um balanço sobre a tragédia vivida pelo Brasil desde que Bolsonaro tomou posse. A peça orçamentária reflete suas prioridades, fraquezas e desorganização. Conduzido por militares, o Estado autoritário e policialesco coloca no topo dos gastos públicos o Ministério da Defesa, a quem destinou R$ 8,8 bilhões, e pela primeira vez concede aumento salarial apenas à uma categoria de servidores, a Polícia Federal.
Com um presidente sem projeto de governo e praticando crimes de responsabilidade em série, a condução da implementação das verbas federais passou a ser dos parlamentares que afiançam sua continuidade no poder. Por isso, foi destinada a estratosférica cifra de R$ 16,7 bilhões para o Ministério do Desenvolvimento Regional, em gastos de baixo impacto social, pouco transparentes e sem nenhuma equidade na distribuição, destino das emendas do orçamento do relator.
Diante da maior crise econômica dos últimos tempos, aprofundada pelo caos sanitário, setores vitais para a população, como saúde, educação, assistência social e outros direitos sociais foram desprezados.
Coerente com o rumo do pior governo de nossa história, o Orçamento de 2022 vai produzir mais fome, desemprego e novamente beneficiar milionários e bilionários, que lucram com a exclusão e miséria alheia.
Em um país devastado por uma pandemia que levou mais de 620 mil vidas e volta a se alastrar, o Ministério da Saúde foi desprezado com a destinação de R$ 4,7 bilhões, metade do que ganhou a pasta dos militares. O congelamento do valor mínimo obrigatório de aplicação ainda causa prejuízo de R$ 12 bilhões ao SUS em 2022. Sequer há recursos na LOA para garantir a vacina contra a Covid-19 a toda a população.
Com um quadro dramático de abandono e exclusão escolar, o ministério da Educação ficou com apenas R$ 3,7 bilhões. Na pasta, houve o cancelamento de R$ 1,5 bilhão em dotações do próprio órgão, prejudicando diretamente o funcionamento dos IFES (Institutos Federais de Ensino Superior) e IFETS (Institutos Federais de Ensino Técnico e Superior). No país onde um quepe vale mais que o cérebro, em 2022 o menor investimento será do Ministério da Ciência e Tecnologia, com apenas R$ 756 milhões.
Em um orçamento global de R$ 4,82 trilhões, os recursos para o pagamento do chamado Auxílio Brasil, que pretensamente queria substituir o exitoso Bolsa Família, só foram alocados à última hora, graças ao calote do governo em parte das dívidas já constituídas com milhares de brasileiros, as quais deveriam ser pagas este ano por meio da quitação de precatórios. E, mesmo com um aporte adicional de mais de R$ 50 bilhões para o novo programa, 27 milhões de famílias que recebiam auxílio emergencial ficarão de fora deste auxílio.
Numa situação de calamidade socioeconômica, foram retirados da Previdência e do Benefício de Prestação Continuada R$ 16,5 bilhões. O Orçamento não considera os milhões de excluídos, seja por desemprego, os que ficaram sem benefícios sociais ou os que aguardam concessão de aposentadoria. O salário mínimo, que é um dos principais instrumentos de geração de renda e impulsionador da economia, ficou em R$ 1.212, deixando a remuneração recebida por milhões de trabalhadores sem aumento real.
No que diz respeito aos salários de servidores públicos federais, mantém-se o quadro de congelamento que perdura já 5 anos, mesmo com a defasagem causada pela inflação. Para piorar, foi praticada uma quebra de isonomia no trato com as diversas categorias, com a destinação de R$ 1,7 bilhão para aumentar a remuneração exclusivamente para a Polícia Federal, num gesto de agradecimento pela benevolência aos crimes praticados pelo presidente e seus filhos. O aumento em detrimento ao congelamento para as demais carreiras gerou um clima de revolta que já repercute em episódios como o pedido de demissão dos servidores que ocupam posições de chefia no Banco Central, em movimento similar adotado à entrega de cargos de servidores da Receita Federal.
Instrumento fundamental para o desenvolvimento, o investimento público foi colocado num plano secundário e em 2022 teremos o menor valor dos últimos anos. Foram destinados apenas R$ 44 bilhões, menos de um quarto do valor investido em 2012 (R$ 200 bilhões).
Os cortes nesta área ocorrem sucessivamente desde o golpe em 2016, ano em que o teto de gastos limitou o investimento público em R$ 63 bilhões. Essa política recessiva cria um quadro de incertezas em que o setor privado não investe e o gasto público não é suficiente para induzir os investimentos das empresas.
O processo orçamentário de 2022 mais uma vez mostrou a opção equivocada do governo federal e da maioria do Congresso em apostar no modelo neoliberal, fracassado e ultrapassado no mundo todo. Às custas da miséria de milhões de brasileiros, o mercado financeiro garante seus exorbitantes lucros, com os bilhões previstos para juros reais e financiamento da dívida pública. Dos R$ 4,8 trilhões de despesas previstas, 1,9 trilhão de reais referem-se a refinanciamento da dívida.
A peça aprovada mistura austeridade, flexibilização casuística de regras e priorização de despesas sem impacto social, com baixo efeito multiplicador e redistributivo, amarrando o Brasil numa crise sem fim.
Os governos Lula e Dilma, de 2003 até o golpe de 2016, demonstraram que não se pode confundir austeridade fiscal com responsabilidade fiscal. No período, conseguiu-se alcançar prioridade em investimentos sociais, recorde de investimento público, aumento real do salário mínimo, mas mesmo assim foram obtidos expressivos superávits fiscais.
Nesse contexto, é urgente uma reforma no modo de se elaborarem o orçamento público e as regras fiscais que o determinam. Regras fiscais rígidas impedem gastos necessários para o desenvolvimento. Flexibilização fiscal seletiva cria incertezas no mercado. Prioridade para gastos sem impacto econômico e social não gera efetividade das políticas públicas. A Lei Orçamentária é o espelho de todo este quadro que afasta o orçamento das demandas da população.
Reginaldo Lopes (PT-MG) é líder do partido na Câmara dos Deputados.
Artigo publicado originalmente na Carta Capital

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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