#VazaJato: A farsa está aí, à frente de todos

Por Paulo Moreira Leite, para o Jornalistas pela Democracia

As primeiras críticas ao de Sérgio Moro à frente da Lava Jato tinham um caráter técnico. Diziam que ele não agia como um “juiz natural”, aquele magistrado que mantém uma postura equidistante entre réu e a promotoria, limitando-se zelar pelo correto cumprimento da lei.

Com o passar dos anos, a partir de um conjunto de decisões que invariavelmente prejudicavam e o Partido dos , sem o necessário apoio em provas, tornou-se fácil identificar um viés político em seu comportamento — confirmado, após a eleição presidencial, quando tornou-se ministro da de Jair Bolsonaro, principal beneficiário do alinhamento anti-Lula da Lava Jato.

Os diálogos revelados pelo Intercept demonstram uma situação muito mais grave e inaceitável, que atinge a credibilidade de uma operação que serviu de impulso às grandes mudanças políticas recentes, com um impacto imenso nos destinos do Brasil e dos brasileiros — o golpe que derrubou Dilma, a prisão de Lula, a eleição de Jair Bolsonaro.

 

Reveladas na intimidade, as mensagens trocadas por Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força tarefa, mostram que ambos agiram de forma ensaiada para atingir alvos que há muito deixaram de ser jurídicos.

Longe de uma postura que deveria assegurar um tratamento justo e equilibrado à defesa e à acusação, juiz e procurador  discutem estratégias, trocam conselhos, combinam decisões e antecipam decisões, numa postura camarada e até cúmplice, de quem faz parte do mesmo time e tem contas a acertar com a outra parte, que considera adversária. Não há justiça. Apenas .

O jogo é baixo mas o alvo é alto. Atuam de forma pactuada contra o direito de defesa e a presunção da inocência, elementos que constituem a razão de ser do Estado Democrático de Direito.

Os arquivos desvendam vários episódios decisivos. Numa passagem, o próprio Moro indica uma “fonte séria” que pode ser ouvida pelo Ministério Público ao longo de uma investigação.

Os diálogos recuperam conversas ocorridas depois que Moro divulgou a gravação do diálogo entre Lula e Dilma, medida que impediu a posse do ex-presidente como chefe da Casa Civil da sucessora. “Não me arrependo”, diz Moro, assumindo que tomou a decisão  política de tornar público um registro que deveria ter sido destruído, pois fora obtido de forma ilegal.

Na reta final da campanha de 2018, ocorre outra cena didática depois que Ricardo Lewandowski autorizou duas entrevistas de Lula, preso em Curitiba, a Monica Bergamo e a Florestan Fernandes Junior.

Embora a sentença de Lewandowski tivesse apoio numa decisão unânime do plenário do STF, que em 2009 reforçou as garantias constitucionais oferecidas à de expressão, a reação no Ministério Público era de alarme.  “Que piada!!! Revoltante”, diz a procuradora Laura Tessler, numa mensagem.  Uma hora depois, a mesma procuradora deixa registrada aquilo que, sabemos todos, era o fundo do problema: “Sei lá…mas uma coletiva antes do segundo turno pode eleger o Haddad”. Ao mesmo tempo, procuradores trocam idéias para sabotar a entrevista — autorizada por Lewandowski mas derrubada por Luiz Fux, após um recurso do Partido Novo.

Os arquivos confirmam uma noção que tenho repetido há vários anos, neste espaço, de que a Lava Jato é “uma investigação que se transformou num ataque a democracia”. Os dados estão aí, à frente de todos. Graças a um excelente trabalho de Glenn Greenwald e equipe, o país tem a chance de começar o acerto de contas com uma das grandes fraudes de sua .

Vinte e quatro horas depois do vendaval, não é fácil prever o que vai acontecer.  Sem dúvida será preciso apurar responsabilidades e reparar injustiças. Para o advogado Wadih Damous, deputado federal entre 2014-2018, “dá para constatar indícios de formação de quadrilha, advocacia administrativa, prevaricação e fraude processual, e tudo isso precisa ser investigado. ”

Damous também acha que a PGR Raquel Dodge está demorando para afastar Dallagnol de suas funções, “numa medida cautelar. Quando todos reconhecem que os registros são autênticas, é preciso tomar cuidado contra a destruição de provas”.

Ao mostrar uma ação combinada entre o Ministério Público e Sérgio Moro na Lava Jato, os arquivos abrem um novo caminho para a defesa de Lula questionar a legitimidade da condenação. Basta ler a troca de mensagens para compreender que a noção de um processo político é mais do que uma hipótese de trabalho. Agora é uma certeza cristalina.

Alguma dúvida?

Fonte: Brasil247

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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