VIVER-RESPIRAR

VIVER-RESPIRAR

VIVER-RESPIRAR

A Terra não deve ser pensada apenas como uma morada, mas um lugar que nos foi oferecido para evoluirmos dentro do universo. É um lugar para nos conhecermos uns aos outros

Por Ailton Krenak  

Nós precisamos cuidar com muito carinho dos nossos irmãos e de todos os seres, do contrário, não vamos mais poder viajar por este planeta que nos foi presenteado. Podemos perder a oportunidade da evolução espiritual.

Na nossa língua Krenak, 

a palavra viver é a mesma de respirar. 

Todo o universo respira. 

Por isso, no momento em que recebemos a vida, 

entramos no ciclo da Terra

e nos mantemos coordenados

com a respiração do universo.

Para nos mantermos responsáveis por sermos agraciados com a vida, buscamos nos iluminar e prosseguir o próprio caminho. E este, sim, é o verdadeiro significado de nossa passagem neste planeta.  viver

Na mitologia Krenak, quando morremos, nos unimos com a fonte de energia que brilha e sustenta a vida de todo o universo. Após a morte, nos tornamos parte do Grande Poder Universal, que sustenta o planeta e o cosmos. Somos uma unidade de vida que extrapola o campo das experiências individuais de tal forma que nos expandimos para todo o cosmos. viver

Esta é, ao mesmo tempo, uma esperança que permite não termos medo da morte. Nascer e morrer é natural. Quando morre uma pessoa amada, o sentimento de perda nos faz querer que o tempo pare. viver

Mas, como isso não acontece, choramos. O choro lava a alma, como os rios, e torna possível voltar a seguir a vida. viver

krenakAilton Krenak – Líder indígena. Conselheiro da Revista Xapuri. Escritor imortal, em Um Rio. Um Pássaro. Dantes Editora, 2023. viv

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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