VOLKSWAGEN ACUSADA DE TRABALHO ESCRAVO NA AMAZÔNIA
Em 2019, o padre Ricardo Rezende Figueira entregou ao Ministério Público do Trabalho (MPT) um dossiê com mais de 600 páginas, com documentos, depoimentos e descrições das violações dos direitos trabalhistas e, mais que isso, das graves violações dos direitos humanos dos trabalhadores rurais pela empresa Volkswagen, através da sua subsidiária Cia. Vale do Rio Cristalino, no estado do Pará, Amazônia. Sintetizando: a empresa símbolo do capitalismo alemão do século XXI praticava o trabalho escravo, do século XIX.
Por Gilney Viana
O MPT estudou e decidiu abrir um procedimento investigatório. Como de praxe, na Justiça Trabalhista tentou um acordo, rejeitado pela empresa. Agora, em 30 de maio de 2025, na sede da Justiça do Trabalho do município de Redenção, PA, aconteceu a última audiência. Presentes, na condição de observadores, os deputados Reimont (PT/RJ) e Tarcísio Mota (PSOL/RJ), respectivamente presidente e membro da Comissão de Direitos Humanos e Minorias e Igualdade Racial, da Câmara Federal, e representantes da sociedade civil, como Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e Comissão Camponesa da Verdade.
Impressionante a altivez e coragem dos trabalhadores rurais ouvidos relatando os fatos, desde a mediação dos “gatos”, que os levavam de Porto Alegre do Norte (MT) até a fazenda, no então município de Santana do Araguaia (PA), expostos ao sol e chuva sobre carrocerias de caminhonetes; o ritual de entrada na fazenda: diante da guarita armada, só entrava quem era entregue pelo “gato” e submetido à punção venosa (para verificar se não portava malária),
levados diretamente ao campo onde levantavam sua própria barraca e preparavam seus próprios alimentos com os mantimentos comprados na “cantina” da fazenda, na qual não tinham acesso às suas contas, que nunca tinham créditos; vigiados por empregados armados, não tinham autorização de sair da fazenda, sob risco de serem caçados pelos modernos “capitães do mato”.
Importante o testemunho do ex-deputado estadual pelo PT de São Paulo, Expedito Soares, que investigou as denúncias, provocando, naquela época, a ida de uma grande comitiva de autoridades e convidados até a fazenda – organizada pela própria Volkswagen – incluindo o seu presidente e, como convidado, o padre Ricardo.
A fala do padre Ricardo, na condição de testemunha, foi conclusiva, a fazenda da Volkswagen não era apenas um campo de trabalho escravo; era um campo de concentração.
Depois de tão graves acusações, todas as pessoas presentes ficaram pasmas diante da mudez do representante da Volkswagen sobre o mérito das questões, se resumindo a relembrar que a empresa tinha celebrado um Termo de Ajuste de Conduta com o MPF, MPT e Ministério Público Estadual de São Paulo, em setembro de 2020, reconhecendo sua colaboração com a repressão política durante a ditadura militar e sua obrigação de pagar 36,2 milhões de reparação aos seus empregados e outras destinações reparatórias.
Não se trata apenas da necessária e adequada reparação material, a anterior e a futura, decorrente deste processo perante o MPT. Trata-se também de reparação moral para as vítimas imediatas e para a maioria da sociedade brasileira, que não suporta a impunidade das empresas que colaboraram com a repressão policial durante a ditadura militar.
Gilney Viana – Ambientalista. Membro da Comissão Camponesa da Verdade. Conselheiro da Revista Xapuri.
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p style=”text-align: justify;”>Capa: Imagem feita por visita parlamentar à fazenda em 1983 mostra um trabalhador fugido da Fazenda Volkswagen dentro da caminhonete, após ser capturado pelo “gato” Abilão – Arquivo pessoal/Expedito Soares | Arquivo pessoal/Expedito Soares