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A invenção do "Bruxo do Cosme Velho"

A INVENÇÃO DO “BRUXO DO COSME VELHO”

A invenção do “Bruxo do Cosme Velho”

Nos 113 anos de morte de Machado de Assis, jornalista descobre origem do apelido do escritor

Por C. S. Soares/Brasil de Fato

Na brasileira, certos apelidos ficaram famosos: o “Príncipe dos Poetas” era Bilac; a “Hermética”, Clarice; o “ Menor”, Bandeira; o “Poetinha”, Vinicius; e o “Boca do Inferno”, Gregório de Matos. Machado de Assis recebeu o mais célebre desses epítetos, o “Bruxo do Cosme Velho”, sendo Carlos Drummond de Andrade, o “Gauche”, apontado frequentemente como seu inventor. Trata-se, no entanto, de um equívoco que acabou se popularizando e até hoje é repetido.

“Devo reconhecer (…) que não me cabe a paternidade da apelação ‘bruxo do Cosme Velho’, dada a Machado de Assis”, confessou o poeta mineiro na crônica de 11 de setembro de 1964, no Correio da Manhã. Era uma resposta à referência que, meses antes, o acadêmico Alceu Amoroso Lima lhe fizera no discurso de saudação a Gilberto Amado na Academia Brasileira de Letras:

“Mas de um despojamento diverso, igualmente, do empregado pelo ‘bruxo do Cosme Velho’, como o denominou Carlos Drummond de Andrade no seu imortal”. 

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Machado de Assis morreu em 29 de setembro de 1908 / Reprodução

No entanto, antes de Drummond, o poeta gaúcho Augusto Meyer já havia usado o tal apelido, mas também não era o criador do epíteto. Ao ser consultado por Drummond, Meyer lhe contou que outro gaúcho, o crítico literário Moysés Vellinho, em “um momento de inspiração”, já o tinha registrado em um “antigo ensaio integrado em ”. 

O  livro era Letras da província, lançado pela Livraria do Globo, de Porto Alegre, em 1944. Na p. 46, o crítico comenta (sobre o próprio Augusto Meyer, um “machadiano” ferrenho): 

“Convicções novas rondavam-lhe o espírito, impondo-lhe o dever de penitenciar-se de um pecado tão gave quanto fora grande a delícia que nele sentira – o pecado de haver mergulhado os sentidos e o pensamento nos perigosos filtros que o bruxo do Cosme Velho sabia propinar com sorrateira e amável.”

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Crítico literário Moysés Vellinho, em “um momento de inspiração”, registrou apelido no livro “Letras da província”, lançado em 1944 / Divulgação

Daí, pois, é justo que se reconheça: a Vellinho o que é de Vellinho. 

Ainda assim, não se pode negar que o apelido só se popularizou com a publicação do poema de Drummond “A um bruxo com ”, em 28 de setembro de 1958, no Correio da Manhã, e republicado depois, com alterações, no livro Poemas, de 1959. Curiosamente, no poema não aparece a expressão “bruxo do Cosme Velho”, apenas as palavras “bruxo” e “Cosme Velho” em versos separados.

Por fim, vale um reconhecimento: o primeiro a divulgar o apelido na imprensa foi o jornalista alagoano Valdemar Cavalcanti, em pelo menos três ocasiões, na coluna literária de O Jornal, nos últimos meses de 1958. A partir daí, o “Bruxo do Cosme Velho” passou a se confundir com o nome de Machado de Assis.

C. S. Soares é escritor e jornalista.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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