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A ERA DOS RUMINANTES OU A FÁBULA DA TERRA PLANA

A ERA DOS RUMINANTES OU FÁBULA DA TERRA PLANA

A Era dos Ruminantes ou Fábula da Terra Plana

Em prosa poética, a autora traz uma fábula que trata dos Ruminantes/Terra Plana, que retrata muito bem o período atual: seguidores de ídolos falsos, sem teoria explicável e seguindo para o abismo da terra plana, como robôs previamente programados… mas pequenas formigas criaram uma fissura no espaço e cuidaram de reconstruir a terra e assim as cigarras saíram às ruas e cantaram a noite inteira

Por Rejane Araújo Oliveira

O ambiente tornou-se inóspito depois do que se convencionou chamar “a era dos ruminantes”. A história conta que nessa época os bichos se dividiram. Pairou sobre o planeta uma sombra gigantesca. Ante os acontecimentos, alguns animais não conseguiam ter um pensamento coerente e tomavam de empréstimo as palavras vazias e aliciadoras de algum guru religioso ou pseudocientífico. Nas redes, peixes aos milhares!

Os ruminantes proliferavam. A terra devorada pelas grandes manadas tornou-se plana. Expedições marítimas navegavam os mares planos do hemisfério sul e nunca mais eram avistadas.

Certo dia, chegou a horda de gafanhotos. Eles continuaram com o processo de devora do que restou do planeta. As formigas olhavam perplexas, tentando se segurar e continuar nos trilheiros cada vez mais carcomidos.

Enquanto isso, ídolos de pés de barro prestavam tributo aos gafanhotos. Havia rezas para um estranho deus que pregava olho por olho. Igrejas, dos mais diversos credos, expunham figuras de avatares da paz, ao lado de animais com armas apontando diretamente para o observador.

Os animais-bebês, ainda no colo, eram ensinados a fazer sinal de arminha com as patas. Algumas, de uma magreza cadavérica, outras com patinhas gorduchas, ostentavam a pais orgulhosos o seu novo saber.

Muitos bichos absortos, tentando decorar respostas prontas que os robôs emitiam sobre questionamentos de qualquer natureza, não percebiam a ação dos gafanhotos.

As formigas, sem as suas trilhas, devoraram as membranas entre-mundos e assim, criaram uma fissura no espaço-tempo, o que colocou em contato multiversos. A babel estabelecida não dava conta de tantos boatos que circulavam. Aos poucos, os grupos foram se direcionando aos universos que mais os atraiam.

Os ruminantes perderam-se na poeira dos tempos e de algum planeta em forma de pizza. Os gafanhotos devoraram um mundo desconhecido e nunca mais foram avistados.

As formigas trataram de reconstruir a terra e nesse dia as cigarras saíram às ruas e cantaram a noite inteira.

Fonte: Facebook da Autora

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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