Você sabe o que é o Acampamento Terra Livre (ATL)?

Você sabe o que é o Acampamento Terra Livre (ATL)?

A maior mobilização brasileira dos indígenas começa hoje, dia 24 de abril, e vai até sexta, dia 28, com programações diárias para discutir a situação dos povos indígenas no Brasil. A expectativa é reunir mais de seis mil indígenas no acampamento, que será montado na Praça da em Brasília (DF). Organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), o ATL acontece todos os anos desde 2004 e surgiu como uma forma de protestar contra a política indigenista vigente na época. Hoje, quase 20 anos depois, os povos indígenas seguem lutando por suas terras, tendo o ATL 2023 o tema “O indígena é hoje. Sem demarcação não há democracia!”.

Por Mídia Ninja

Segundo a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o Brasil possui cerca de 680 territórios indígenas regularizados e mais de 200 aguardam análise para serem demarcados. A demarcação dos territórios fortalece a vida dessas pessoas, visto que dificulta a ação de grileiros, madeireiros, garimpeiros e outros invasores que tem um histórico de violência contra os povos indígenas. Ao invadir o território onde esses povos moram, eles não somente tiram a moradia, como também destroem sua relação com a natureza local, a liberdade de ir e vir e a soberania indígena.

“A demarcação de terras indígenas é um direito ancestral previsto na Constituição Federal. Aqueles que invadem uma TI destroem as e atacam indígenas, que há mais de 500 anos lutam pela proteção das suas famílias, culturas e terras. Não queremos falar somente do que pode acontecer daqui a 4 anos ou 8 anos. É agora que meus parentes estão sendo assassinados, a democracia está sendo desrespeitada e as mudanças climáticas estão sendo agravadas”, conta Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Articulação.

Programação

A programação do ATL 2023 conta com mais de 30 atividades divididas em cinco eixos temáticos, sendo eles: Diga o povo que avance, Aldear a Política, Demarcação Já, Emergência Indígena e Avançaremos. Os eixos contam com plenárias sobre mulheres indígenas, parentes LGBTQIAPN+, gestão territorial e ambiental de terras indígenas, acesso a políticas públicas e povos indígenas em isolamento voluntário.

Durante a programação, o movimento indígena também promoverá três marchas pelas ruas da capital brasileira. A primeira delas, no dia 24, pedirá a derrubada dos projetos de leis anti-indígenas como o PL 191 que permite a mineração em terras ancestrais dos povos indígenas e o PL da grilagem. Projetos de Lei como esses tornam os indígenas os alvos mais frequentes da violência de campo no Brasil, representando 38% das pessoas assassinadas nas áreas não urbanas em 2022 segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Já no dia 26, o ato “Povos Indígenas decretam emergência climática!” pede atenção para o enfrentamento às violações ocasionadas pelas mudanças climáticas. Dinamam Tuxá reitera que as terras indígenas são as áreas com maior biodiversidade e com vegetação mais preservadas, visto que são territórios protegidos e manejados pelos . “Não existe solução para a sem os povos indígenas e a demarcação plena das nossas terras”, reforça o coordenador.

Kleber Karipuna, também coordenador executivo da Apib, afirma que o Acampamento Terra Livre irá debater as consequências do Marco Temporal para os direitos dos povos indígenas em plenária no dia 27 de abril. Lideranças também se reunirão em uma vigília em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 26 para reivindicar a declaração da sua inconstitucionalidade. O Marco Temporal volta a ser julgado no dia 07 de junho.

O chamado “marco temporal” é uma tese jurídica que limita o direito dos povos indígenas às suas terras tradicionais por meio da aplicação de um corte temporal restritivo. Segundo a tese, só poderia reivindicar direito sobre uma terra o povo indígena que já estivesse ocupando-a no momento da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.

Os ruralistas são os maiores apoiadores do Marco Temporal, e dentre seus argumentos a favor, a aprovação do Marco Temporal ajudaria no econômico do país, visto que as terras que seriam demarcadas passariam a ser usadas no plantio de grãos – especialmente da soja.

“O Agro usa diversas estratégias para construir o consenso na sociedade brasileira de que é o setor mais dinâmico, moderno e importante da economia brasileira. No entanto, uma análise detalhada dos números do agro revela outra realidade. A de um setor que recebe muito e contribui pouco com o país”, afirmam Mitidiero Junior, que é professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (Anpege), e Yamila Goldfarb, pesquisadora e vice-presidente da Abra. Juntos eles escreveram o artigo “O agro não é tech, o agro não é pop e muito menos tudo”, realizado pela Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) com apoio da fundação Friedrich-Ebert-Stiftung Brasil.

O artigo, dentre outras coisas, analisa a participação do agro no Produto Interno Bruto (PIB). De acordo com o texto, a agropecuária compõe a menor fração do PIB brasileiro. Os dados mostram que, em média, o agro contribuiu com apenas 5,4% do PIB, enquanto o setor industrial com 25,5% e o setor de serviços 52,4%. Ou seja, o setor que mais produz mercadorias para exportação é o que menos contribui na composição dos valores do cálculo geral de produção de riqueza.

A ministra dos Povos Indígenas Sonia Guajajara afirmou em 2021 que indígenas não vão abrir mão de territórios se marco temporal passar.

“A principal demanda do movimento é a questão da territorialidade, nossa demanda principal é a demarcação, reconhecimento das nossas terras e também o respeito aos modos de vida que nós queremos ter em nossos territórios. Claro que nossa , , políticas para mulheres, crianças, juventude também são importantes, mas entendemos que sem território não há como discutir nenhuma dessas pautas. Território é saúde, educação e vida”, reforça Val Eloy Terena, coordenadora executiva da Apib.

Confira a programação completa do ATL aqui.

Fonte: Mídia Ninja – Rede de Comunicação Livre. Foto: Mídia NINJA. Este artigo não representa a opinião da Revista e é de responsabilidade do autor.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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