Madalena Allunoe partiu para as terras sagradas ancestrais
“Minha mãe, Madalena Allunoe partiu hoje para as terras sagradas ancestrais.” Mensagem de Marcos Terena no Facebook, em 23 de junho de 2024.
Líder indígena, Allunoe morre em Campo Grande e deixa legado de luta
A líder indígena terena Madalena Gomes Marcos, 87 anos, morreu neste domingo (23), em Campo Grande. Com um legado de lutas e resistência, Madalena nasceu na Aldeia Bananal no município de Aquidauana, e se mudou para Capital em 1945 com o esposo.
Por Clara Farias/Campo Grande News
Na tradição terena, Madalena levava o nome de Allunoe, conta a filha Mirian Terena. Ao longo de sua vida, Allunoe trabalhou como doméstica em Campo Grande até que passou a trabalhar na Casa de Saúde Indígena. “Ao sair da aldeia, ela não conhecia muitas coisas da realidade não indígena, sua alimentação era diferente, ela não comia sal, açúcar e nem tomava refrigerante”, comentou Mirian.
A filha relata que Madalena lutou por melhorias na saúde indígena e pelos direitos das mulheres indígenas. “Ela sempre ajudava as crianças indígenas que não tinham seus país. Dona Madalena deixa um grande legado de aprendizado da causa indígena”, lembrou ela.
Ao mesmo tempo que enfrentava discriminações na Capital, Allunoe mostrou para a juventude indígena que é possível enfrentar essas barreiras, afirmou Mirian Terena. “Não foi fácil a vida dela. Ela dizia: ‘vamos em frente, não abaixa a cabeça, vamos lutar porque somos indígenas, somos do povo Terena e precisamos lutar contra todo tipo de preconceito”, finalizou.
Madalena, minha mãe Allunoe na tradição Terena
Minha mãe, Madalena Gomes, de nome Allunoe na tradição Terena, nasceu nessa época [fim de maio, começo de junho], no tempo das cerimônias do Kipae, a anta que sai para dançar entre as estrelas do céu.
Por Marcos Terena
Com idade estimada em 86 anos, minha mãe criou cinco filhos e uma filha, e nunca deixou perder aquilo que chamamos de ancestralidade. Ela sempre nos ensinou a repassar os conhecimentos, e isso é uma garantia de que eles vão perdurar para sempre. Ela morava, quando mais nova, dentro de uma aldeia na região de Taunay, em Aquidauana, que pertencia aos Queiroz e foi retomada recentemente.
Órfã em torno dos 10 anos de idade, foi levada por fazendeiros invasores das terras do Warakuake, perto de Aquidauana, no Mato Grosso do Sul, para cuidar de uma criança de nome Saulo.
Ela é uma sobrevivente dessa ajuda “humanística” dos purutuie, pois além de não saber falar o português, não conhecia as comidas, não conseguia dizer o que queria comer e passou muita fome.
Minha mãe coleciona muitas histórias. Ela sempre contou que andava descalça, não tinha roupa e andava pelo mato para procurar ervas medicinais. Tomava banho na lagoa, e tudo isto são coisas que eu não vivi, porque estava construindo minha carreira profissional, como piloto de aeronaves.
Hoje, minha Mãe, (30 de junho de 2023) que na década de 1980 batalhou pelo primeiro movimento de mulheres indígenas do Brasil, e nunca nos deixou, está no leito de nossa casa com saúde perfeita, e estaria cantando parabéns se não fosse a crueldade do Alzeihmer e do Parkinson!
Mesmo assim, celebramos a provável data do aniversário de nossa Mãe.
Marcos Terena – Líder Indígena. Coordenador Internacional na empresa Juegos Mundiales de los Pueblos Indígenas. Ex-piloto de aeronaves da Funai. Articulador dos Direitos Indígenas. Produtor do documentário Índio Velho – Saberes Ancestrais. Texto beneficiado pela redação da Revista Xapuri, com base em post de Marcos Terena no Facebook e em entrevista de Graziela Rezende, em Midiamax. Publicado originalmente em 30/06/2023.