CATULO DA PAIXÃO CEARENSE: O LENHADOR

CATULO DA PAIXÃO CEARENSE: O LENHADOR

O Lenhador 

Catulo da Paixão Cearense (1863-1946)

Um lenhadô derribava

as árve, sem percizão,

e sêmpe a vó li dizia:

“Meu fiô: tem dó das árve,

que as árve tem coração!”

O lenhadô, n’um muchôcho,

e rindo, cumo um sarváge,

dizia que os seus consêio

não passava de bobage.

As vez, meu branco, o marvado,

acordando munto cedo,

pegava no seu machado,

e levava o dia intêro,

iscangaiando o arvoredo.

E a vó, supricando im vão,

sêmpe, sêmpe li dizia:

“Meu fio: tem dó das árve,

que as árve tem coração!”

N’uma minhã, o mardito,

inda mais bruto que os bruto,

sem fazê caso dos grito

da sua vó, que já tinha

mais de noventa Janêro,

botou no chão um ingazêro,

carregadinho de fructo.

D’outra feita, o arrenegado

fez pió, munto pió!

Disgaiou a laranjêra

da pobrezinha da vó,

uma véia laranjêra,

donde ela tirou as frô

prá levá no seu vistido,

quando, virge, si casou

cum o véio, que tanto amou,

cum o difunto… o falicido!!!

 

E a vó, supricando im vão,

sêmpe , sêmpe li dizia:

“Meu fio: tem dó das árve,

que as árve tem coração!”

Do lado do capinzá,

adonde pastava o gado,

táva um grande e véio ipê,

que o avô tinha prantado.

Despois de levá na roça

C’uma inxada a iscavacá,

debaxo d’aquela sombra,

nas hora quente do dia,

vinha o veio discansá.

Se era noite de luá,

ali, num banco de pedra,

c’uma viola cunversando,

o véio, já caducando,

rasgava o peito a cantá.

Apois, meu branco, o tinhoso,

o bruto, o máo, o tirano,

a féra disnaturada,

um dia jogou no chão

aquela árve sagrada,

que tinha mais de cem ano!

Mas porém, quando o tinhoso

isgaiava o grande ipê,

viu uns burbuio de sangue

do tronco véio iscorrê!

Sacudiu fóra o machado,

e deu de perna a valê!

E foi correndo!… correndo!!

Cada tronco que ia vendo

das árve que ele torou,

era um braço alevantado

d’um hôme, meio interrado,

a gritá: “Vai-te, marvado!…

Assassino !… Matadô!

Foi Deus quem te castigou!”

E foi correndo!… correndo!!

Cada vez curria mais!

Mas porém, quando, já longe,

uma vez ôiou prá-traz,

vendo ipê alevantado,

cumo um hôme insanguentado,

cum os braço todo torado…

cada vez curria mais!

Na barranca do caminho,

abandonado, um ranchinho,

entre os mato entonce viu!

Qué vê se isbarra e discansa

e o ranchinho, prú vingança,

im riba d’ele caiu!

E foi correndo e gritando!

E as árve que ia topando,

e que má pudia vê,

cumo se fosse arrancada

cum toda a raiz da terra,

n’uma grande adisparada

ia atraz d’ele a corrê!!

Na boca da incruziada

vendo uma gruta fechada

de verde capuangá,

o hôme introu pulos mato,

que logo que viu o ingrato,

de mato manso e macio,

ficou sendo um ispinhá!

E foi outra vez correndo,

cansado, pulos caminho!…

Toda a pranta que incontrava,

o capim que ele pizava

táva crivado de íspinho!!!

Curria… e não aparava!!!

Ia correndo, sem tino,

cumo o marvado, o assassino,

que um inocente matou!

Mas porém, na sua frente,

o que ele viu, de repente,

que, de repente, impacou?!

Era um rio que passava,

ali, n’aquele lugá!!

O rio tinha uma ,

que nós chamemo — pinguéla…

O hôme foi travessá!

Poz o pé… Ia passando…

E a ponte rangeu, quebrando,

e toca o bicho a nadá!!!

O bruto tava afogando,

mas porém, sêmpe gritando:

“Soccorro, meu Deus, socorro!

Socorro, que eu vou morrê!!

eu juro a Deus, supricando,

nunca mais na minha vida

uma só árve ofendê!!!”

Entonce, um verde ingazêro

que táva im riba das água,

isticou um braço verde,

dando ao hôme a sarvação!

O hôme garrou no gaio,

no gaio cum os dente aférra,

foi assubindo… assubindo…

e quando firmou im terra,

chorava, cumo um jobão!

Bêjando o gaio e chorando,

dizia: “Munto obrigado!

Deus te faça, abençoado,

todo o ano tê verdô!

Vou rebentá meu machado!

Quero isquecê meu passado!

Não serei mais lenhadô!”

Despois d’esta jura santa,

prá tê de todas as pranta

a graça, o perdão intêro

dos crime de hôme ruim,

foi se fazê jardinêro,

e não fazia outra coisa

sinão tratá do jardim.

À vó, que já carregava

mais de noventa janêro,

dizia que neste mundo

nunca viu um jardinêro,

que fosse tão bom ansim!

Drumia todas as noite,

dêxando a jinela aberta,

prá iscutá todo o rumô,

e ás vez, inté artas hora,

ficava, ali na jinela,

uvindo o sonho das frô!

De minhã, de minhã ceda,

lá ia sabê das rosa,

dos cravo das sêmpe-viva,

das manguinolia chêrosa,

se tinha drumido bem!

Tinha cuidado cum as rosa

que munta vó carinhosa

cum os seus netinho não tem!

Dizia a uma frô: “Bom dia!

Cumo tá hoje vremêia!…”

Dizia a outra: “Coitada!

Perdeu seu mé!… Foi róbada!

Já sei quem foi!… Foi a abêia!”

Despois, cum pena das rosa,

que parece que chorava,

batia leve no gaio,

e as rosa disavexava

daqueles pingo de orvaio!

Ia apanhando do chão,

as frô que no chão caía!

Despois, cum as costa da mão,

alimpando os pingo d’água

que vinha do coração,

batia im riba do peito,

cumo quem fas cunfissão.

Quando no sino da ingrêja

tocava as Ave-,

nos cantêro, ajueiado,

pidia a Deus pulas arma

das frô, que naquele dia

no jardim tinha interrado!

E agora, quando passava

junto das árve, cantando,

cheio d’água carregando

o seu véio regadô,

as árve, filiz, contente,

que o lenhadô perduava,

no jardinêro atirava

as suas parma de frô!

Fonte: Alma Acreana

Catulo da Paixão Cearense, in revista A Noite Ilustrada, edição especial a Catulo da Paixão Cearense, 19-7-1946, p.10 e 34 

CATULO DA PAIXÃO CEARENSE

CATULO DA PAIXÃO CEARENSE: O LENHADOR
Foto: Reprodução/Dicionário Cravo Albin da

Sua primeira composição foi “Ao luar”, apresentada numa seresta na República de Estudantes. Na mesma noite, seu pai, Amâncio José da Paixão Cearense quebrou-lhe um violão na cabeça, pois seguira o filho e não o queria envolvido com boêmios. Após a morte do pai, passou a trabalhar como estivador no Cais do Porto. De dia usava tamancos nos pés e à noite colocava as calças listradas e o fraque forrado de seda e ia para as serestas. Certa feita, convidado para uma festa na casa do Senador Gaspar da Silveira Martins, conselheiro do Império, acabou por tornar-se o centro da festa.

A do senador acabou por contratá-lo como professor para os filhos e dessa forma, mudou-se para a casa do senador. Pouco depois, viu-se envolvido numa trama que resultaria num casamento, sob a acusação de ter violentado sua futura mulher. Considerado como grande mulherengo, envolveu-se ao longo de sua vida com diversas , tendo dedicado a algumas delas várias de suas obras. Para a atriz Apolônia Pinto dedicou a canção “Os olhos dela”.

Apaixonado pela filha do senador goiano Hermenegildo de Morais, de quem somente se conhece o apelido de “Coleira”, devido a um adorno que usava no pescoço. Mas não teve o amor correspondido. Por isso, abandonou o na casa do senador Gaspar da Silveira e foi refugiar-se em Piedade, subúrbio do Rio de Janeiro, onde fundou um colégio e passou a lecionar, criando novos métodos que tornassem o ensino mais agradável. Paralelamente, continuou a participar de serestas e recitais.

Em 1906, o cantor Mário Pinheiro gravou pela Casa Edson as canções “Talento e formosura” e “Resposta ao talento e formosura”. Em 1907, o mesmo cantor gravou “O que tu és”, “Até as mentem” e “Clélia”. E, com grande sucesso, a canção “Rasga coração”, novo nome dado pelo poeta a partir da letra que colocou no xote “Iara”, composto por Anacleto de Medeiros em 1896 e repertório obrigatório das bandas desde então.
Em 1908, conseguiu o que para muitos parecia impossível: levar o violão, instrumento até então considerado maldito, para um salão de elite.

Por intermédio do maestro Alberto Nepomuceno, conseguiu realizar um recital no Instituto Nacional de Música, onde, nas suas próprias palavras, “Músicos, literatos, médicos, jornalistas, advogados, engenheiros, professores, diplomatas, misturaram-se a populares”. O recital foi um enorme sucesso, fazendo crescer ainda mais a fama do cantor e poeta nordestino. Em 1909, o cantor Mário Pinheiro gravou mais duas composições de sua autoria: “Choça ao monte” e “Cabocla bonita”. Em 1910, o mesmo cantor gravou “Adeus da manhã”. Em 1913, obteve grande sucesso no carnaval  com a composição “Cabocla di Caxangá”. Sobre essa composição, informam os pesquisadores Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello: “… Entrou para a história apenas assinada pelo poeta

Inspirado numa toada que João Pernambuco lhe mostrara e que teria melodia do violonista, composta sobre versos populares, Catulo escreveu extensa letra, impregnada de nomes de árvores (taquara, oiticica, imbiruçu…), animais (urutau, coivara, jaçanã…), localidades (Jatobá, Cariri, Caxangá, Jaboatão…) e gírias do sertão nordestino, daí nascendo em 1913 a embolada “Caboca de Caxangá”, classificada no disco como batuque sertanejo). E nasceu para o sucesso, que se estenderia ao carnaval de 1914, para desgosto de Catulo, que achava depreciativo o uso da composição pelos foliões”.

Em 1914, foi convidado pela mulher do então Presidente da República Hermes da Fonseca, a senhora Nair de Teffé, a caricaturista Rian,  para um recital no Palácio do Catete, onde obteve um dos seus momentos de maior glória, sendo aplaudido de pé pela assistência, ao término de cada apresentação.

Alguns setores mais conservadores da imprensa, contudo, registraram críticas e comentários maldosos. Pouco depois, foi nomeado pelo presidente para um cargo na Imprensa Nacional. Ligou-se ao proprietário da Livraria do , e por ela editou diversos folhetos de cordel com o repertório de modinhas, lundus e cançonetas que faziam sucesso. Para a mesma livraria editou as coletâneas “O cantor fluminense” e “O cancioneiro popular”. Em seguida, publicou diversos trabalhos de sua autoria, “Lira dos salões”, “Novos cantares”,  “Lira brasileira”, “Canções da madrugada”, “Trovas e canções” e “Choros ao violão”.

No mesmo ano, o cantor Eduardo das Neves, acompanhado de coro, gravou na Odeon aquele que se tornaria o maior sucesso do poeta, e um dos maiores clássicos da Música Popular Brasileira, consagrada popularmente como um segundo Hino Nacional: a toada sertaneja “Luar do sertão”, regravado dezenas de vezes ao longo da história da MPB. E que também lhe rendeu a célebre polêmica com João Pernambuco sobre a autoria da música, chegando à barra dos tribunais, que decidiu a favor de João Pernambuco, reconhecido assim como autor da melodia, que segundo alguns, seria provavelmente um tema folclórico, ficando a dúvida entre o coco “É do Maitá” e “Meu Engenho é de Humaitá”.

Também no mesmo ano, o cantor Bahiano gravou a modinha “Fascinação por teus olhos”, parceria com Cupertino de Menezes, Eduardo das Neves gravou a modinha “Eulina” e a Banda da Casa Edison regravou “Cabocla de Caxangá”, como tango, todos na Odeon.

Ainda na mesma época, colocou versos serenata “Lolita” e na valsa “Adoráveis tormentos”, ambas de Fernando de Azevedo.

Um de seus principais parceiros foi Anacleto de Medeiros, com quem compôs, entre outras, “Rasga o coração”, “Por um beijo”, “Palma de martírio”, “O que tu és”, “Perdoa”, “Nasci para te amar”, “O boêmio” e “Coração oculto”. Em 1918, editou “Meu sertão”. No mesmo ano, o cantor Vicente Celestino gravou na Odeon uma série de canções suas com diferentes parceiros, entre as quais, “”Porque sorris” e “Porque fui poeta”, com Juca Kalut e “Aos pés da cruz”, com Cremieux. No mesmo período, Mário Pinheiro gravou uma série de modinhas, entre as quais “Pastor peregrino”, “Não partas”, “Cabocla bonita” e “Lágrimas sonoras”.

Em 1919, publicou “Sertão em flor”. Em 1921, “Poemas em bravios”. Em 1926, participou da “Tarde Brasileira”, no Teatro Lírico no Rio de Janeiro, apresentando-se ao lado de João Pernambuco e Patrício Teixeira. Na ocasião, lançou o poema “Maria Cabocla”, que recebeu calorosos aplausos fazendo-o retornar várias vezes ao palco. No mesmo ano, Patrício Teixeira gravou sua canção “Magnólia”, amodinha “Canção do cego” e a modinha cateretê “Bem-te-vi”.

Em 1928, publicou “Mata iluminada”, “Meu Brasil”, “Um boêmio no céu” e “Alma do sertão”. Nos últimos anos de sua vida, viveu num barracão na Rua Francisco Méier, nº 21, depois transformada em Rua Catulo da Paixão Cearense. Lá recebia diversas figuras da vida pública e intelectual do Rio, do Brasil e de outros países, como o escritor Monteiro Lobato, o poeta espanhol Salvador Rueda ou o médico e tenor mexicano Alfonso Ortiz Tirado, conhecido como a “Voz Romântica do México”. Lá recebia as visitas de chinelo e pijama.

Em 1939, encontrando-se em situação financeira delicada, pediu ajuda ao cantor paulista Paraguaçu, que organizou para ele uma série de recitais, com apresentações na Rádio Cosmos, atual Rádio América e também no Palácio dos Campos Elíseos, sendo convidado do governador Ademar de Barros. O sucesso foi absoluto, com os recitais totalmente concorridos e com seus esgotados pelo público ávido por autógrafos do grande poeta.

Mesmo assim, o poeta morreu pobre.Antes de seu sepultamento, o escultor Flory Gama fez sua máscara mortuária. Seu corpo foi levado para o saguão do edifício  da Associação Brasileira de Imprensa, depois para a Capela de Santa Teresinha, na Praça da República e finalmente levado a pé até o Cemitério de São Francisco de Paula.

Conforme o enterro passava, acompanhado por uma multidão e pela Banda do Corpo de Bombeiros entoando a “Marcha fúnebre”, o comércio fechava as portas.No cemitério, uma multidão aguardava a chegada do féretro. Sucederam-se diversos discursos que fizeram a cerimônia estender-se até à noite.Quando escureceu, uma imensa lua cheia apareceu no céu e o tenor mexicano Alfonso Ortiz começou a cantar “Luar do sertão”. Pouco a pouco um coro de milhares de vozes o acompanhou numa homenagem espontânea ao poeta morto.

Ainda nos anos de 1950, o tenor Vicente Celestino gravou pela RCA Victor um LP com obras do poeta, entre outras, as composições, “Rasga o coração”, “O meu ideal”, “Por um beijo”, “Ontem ao luar” e “Luar do sertão”. 

Em 1957, foi homenageado pela gravadora Sinter com o LP “Catulo o poeta do sertão”, na voz de Paulo Tapajós, com as composições: “Vai o Meu Amor ao Campo Santo”, com Irineu de Almeida, “Sertaneja”, com Ernesto Nazareth, ”    Clélia (Ao Desfraldar da Vela)”, com Luis de Souza, “Poeta Do Sertão”, com João Pernambuco, “O Meu Ideal”, com Irineu de Almeida, “Tu Passaste Por Este Jardim”, com Alfredo Dutra, ”    Talento e Formosura”, com Edmundo Octávio Ferreira, “Os Olhos Dela”, com Irineu de Almeida, “Rasga o Coração” e “Implorando”, com Anacleto de Medeiros, “Templo Ideal”, com Albertino Pimentel, e “Recorda-te de Mim    “, só de sua autoria.

Em 1962, as canções “Tu passaste por este jardim”, com Alfredo Dutra e “Por que sorris?, com Juca Kalut foram relançadas por Gilberto Alves no LP “Gilberto Alves de sempre” lançado pela gravadora Copacabana.

Em 1994, o selo Revivendo lançou o CD “Catulo da Paixão Cearense na voz de Vicente Celestino e Paulo Tapajós”. Em 2000 o selo EMI/Copacabana lançou o CD duplo “Cantores do Rádio – volume 1”, no qual consta a canção “Ontem ao luar”, parceria com Pedro de Alcântara na interpretação de Vicente Celestino. Em 2007, estreou no Teatro Villa-Lobos no Rio de Janeiro sua peça inédita “Um boêmio no céu”, escrita em 1945. Com direção de Amir Haddad, figurinos de Biza Vianna e direção musical de José Maria Braga e com José Mayer no pepel do poeta.

Durante o espetáculo são interpretadas algumas de suas canções mais famosas como “Ontem ao luar” e “Luar do sertão”. No mesmo ano, a toada “Luar do sertão”, com João Pernambuco, foi gravada por Tinoco e Mazinho Quevedo no CD “Coração caipira – ao vivo” da Som Livre. Em 2009, foi lançado no Museu da República pelo pesquisador Haroldo Costa o livro “Catulo da Paixão – Vida e obra”, no qual o autor fala da vida e da obra do grande seresteiro e poeta.

Em 2011, foi lançado pelo selo Discobertas em convênio com o ICCA – Instituto Cultural Cravo Albin a caixa “100 anos de música popular brasileira” com a reedição em 4 CDs duplos dos oito LPs lançados com as gravações dos programas realizados pelo radialista e produtor Ricardo Cravo Albin na Rádio MEC em 1974 e 1975. No volume 1 desses CDs estão incluídas suas modinhas “Terna saudade”, com Anacleto de Medeiros, “Luar do sertão”, com João Pernambuco, e “Cabocla bonita” na interpretação de Paulo Tapajós, e “Flor amorosa”, com Joaquim da Silva Calado, na interpretação de Altamiro Carrilho e seu conjunto.

Fonte: Dicionário da MPB

Capa:O Derrubador Brasileiro, 1879. Almeida Júnior. Óleo sobre tela, c.i.d. 227,00 cm x 182,00 cm. Reprodução fotográfica Lula Rodrigues

NOTA: — Deste mesmo poema existe uma outra versão, mais extensa e em linguagem erudita, versão essa que foi incluída no volume intitulado “Poemas bravios” e, posteriormente, em “Fábulas e alegorias”.

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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