A dama de vermelho

A dama de vermelho

Diferente do que se possa pensar, o texto não é uma crônica sobre o estadunidense da década de 1980. O título apenas serve de alegoria para falar de um tema importante da política.

Por Tânia de Oliveira 

Havia grande expectativa em torno do desfile do Dia da Independência neste ano de 2023. Isso porque o 7 de setembro, como data nacional, serviu nos últimos quatro anos como palanque do então presidente Jair Bolsonaro para atacar as instituições, ameaçar os demais poderes e insuflar seguidores a manter-se mobilizados para tentar um golpe de Estado caso não se sagrasse vencedor nas eleições.

Há exatos dois anos, Bolsonaro gritou, em plena Avenida Paulista, para milhares de apoiadores, que não mais respeitaria decisões do ministro Alexandre de Morais, do Supremo Tribunal Federal, referindo-se a ele como “canalha”. No ano de 2022, as comemorações foram marcadas pelo coro de “imbrochável”, puxado por ele em referência a si próprio, no palanque montado na Esplanada dos Ministérios, em .

A exemplo de regimes de pelo mundo, o operou uma apropriação dos símbolos nacionais como se representassem suas ideologias. De tal modo que o uso da camisa da seleção brasileira de futebol e da bandeira nacional foi fartamente utilizado, inclusive no momento do cometimento de crimes, como nos atentados do dia 08 de janeiro contra a sede dos Três Poderes.

Em busca da demonstração da importância do respeito ao Estado Democrático de Direito, do funcionamento regular das instituições e da pacificação do país, o governo Lula organizou a comemoração do Dia da Independência neste ano com o tema Democracia, Soberania e União, sinalizando que é preciso termos de volta os valores reais para nossa bandeira e o orgulho de usar verde e amarelo.

O sentimento de pertencimento que as da nação evocam é importante. Ao mesmo tempo em que não se pode transformar seu uso em algo absoluto ou obrigatório, porque significaria aceitar o discurso proclamado pela extrema-direita e taxar o uso de outras cores como antipatriótico. Seria assumir o marketing totalitário e desonesto que alardeiam.

Nesse sentido, o grande exemplo no desfile da Independência coube à nossa primeira-dama Janja Lula da Silva que, deslumbrante em um elegante vestido vermelho e usando acessórios indígenas, sinalizou silenciosamente que as cores isoladamente não são o que determinam nossa identidade, nosso compromisso com o país e com a democracia.

Ela disse, sem dizer, que o dissenso é princípio da democracia, que aliás é fundamento do próprio regime, que precisa admitir sempre a em sua complexidade e riqueza humana, para conseguir processar os conflitos existentes na sociedade e construir os necessários consensos.

Estamos remontando um país após quatro anos de um golpista neoliberal e autoritário, violento e regressivo em que, mesmo após a descoberta de uso do aparelho de Estado para grandes esquemas de corrupção, ainda há apoio ao projeto derrotado nas urnas.

Então, é preciso prestar atenção com calma em como reverter os elementos que manipularam a opinião pública, onde a contradição entre se “fantasiar de verde amarelo” enquanto promoviam a destruição do país foram camufladas.

A cor vermelha – que como já disse o presidente Lula em certo momento é a cor da bandeira do seu partido e não da bandeira do seu país – é símbolo das lutas por igualdade e social em todo o mundo.

Janja, a dama de vermelho na Festa da Independência, sinalizou que a liberdade cromática aponta esse novo tempo para o Brasil e para o povo brasileiro em que, além da construção da igualdade e equidade, da justiça social e , tem o respeito à diversidade como método.

download 1Tânia Maria de Oliveira – Secretária-Executiva Adjunta da Secretaria Geral da Presidência da República. Matéria publicada originalmente no Brasil247, em 7 de setembro de 2023. Foto de capa: Divulgação/ Ricardo Stuckert.

 

 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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