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Agroecologia nas cidades promovem saúde e renda

Agroecologia nas cidades promovem saúde e renda

Benefícios da agricultura urbana podem ir desde a melhoria da alimentação e da saúde das pessoas até a geração de renda e a promoção de uma cidade mais saudável e resiliente.

Por Marcelo Almeida/Articulação Nacional de Agroecologia/Mídia Ninja

A prática da agricultura nas cidades, que pode ser individual ou coletiva, é bem diversa. Ela acontece tanto em espaços privados (quintais, lajes das casas, áreas cedidas por empresas ou pessoas físicas) quanto em espaços públicos (escolas, unidades básicas de saúde, canteiros centrais, parques, entre outros ambientes).

Além de ser realizada em diferentes locais, chama atenção o fato de uma única iniciativa de agricultura agroecológica na cidade poder gerar variados benefícios sociais, econômicos e ecológicos. A experiência do grupo Mulheres do Gau, que acontece há 12 anos no Bairro União de Vila Nova, região Leste de São Paulo (SP), nos ajuda a entender a relação da agricultura urbana com uma grande diversidade de atividades e temas.

O trabalho do grupo começou no início do processo de urbanização do bairro, quando alguns moradores se organizaram para dialogar com a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU) e reivindicar um espaço para fazer a horta. O local conseguido pelo grupo, que era destinado para descarte de entulho e lixo, foi limpo e deu lugar à horta.

“Os moradores se uniram e restauraram o espaço para poder plantar, porque antes falavam que não dava para plantar nada, devido à degradação do solo. Hoje, a gente pede para fazer exame de solo no laboratório e o resultado dá super satisfatório”, explica a agricultora urbana e integrante do grupo Aldineia Pereira da Silva, mais conhecida como Leia.

A agricultora conta que, depois de certo tempo, as mulheres buscaram outras formas para ampliar a renda das integrantes do grupo, já que o valor arrecadado na horta não era suficiente. Aos poucos, começaram a produzir mudas em um viveiro. “Na verdade, o viveiro se tornou uma agrofloresta, porque tem árvores frutíferas, PANCs (Plantas Alimentícias Não Convencionais), ervas medicinais. A gente tem uma diversidade muito grande de plantas em um espaço que chega a aproximadamente 2 mil metros quadrados”, descreve Leia.

E a diversificação dos trabalhos do grupo não parou por aí. Após a horta e o viveiro, as Mulheres do Gau tiveram a ideia de implantar uma cozinha, aproveitando os alimentos que são produzidos no local. Os almoços e lanches são servidos tanto no espaço do grupo quanto em eventos ou atividades de instituições de São Paulo que contratam os serviços. “A mulherada se desdobra em várias atividades pra conseguir ter a renda no final do mês”, justifica Leia, acrescentando que, no momento, o dinheiro arrecadado é dividido entre oito mulheres.

Promoção da saúde
Além da produção de alimentos sem agrotóxicos e da geração de renda, as atividades de agricultura urbana também podem ser analisadas sob o viés da promoção da saúde. No município de Paulista, Região Metropolitana de Recife (PE), a iniciativa do Centro de Educação e Formação em Medicina Popular (Cefomp), criado há 30 anos, associa o trabalho da medicina popular com o cultivo de alimentos agroecológicos em área urbana.

Segundo Gerlúcia José dos Santos, coordenadora do Centro, a instituição desenvolve um trabalho de promoção da saúde com os remédios à base de plantas medicinais. Além disso, tem uma forte atuação de mobilização social para garantia de direitos nas áreas da saúde, educação, cultura e meio ambiente, principalmente quando estão relacionados à questão da agroecologia.

“A instituição está no Centro de Paulista, em uma área urbana. Eu digo que é um pontinho verde, porque a gente tem uma horta, tem algumas árvores nativas e ervas que a gente planta. E a gente tem uma área verde muito grande atrás do Cefomp, que estamos cercando para construir um SAF (Sistema Agroflorestal). Vamos plantar milho, feijão e outras árvores, como urucum, angico, barbatimão, que a gente utiliza na produção dos remédios”, relata Santos.

O Cefomp tem sete pessoas trabalhando mais ativamente, todas voluntárias, sendo que seis são mulheres. E a manutenção do Centro se dá, principalmente, por meio da comercialização dos remédios fitoterápicos na própria instituição, nas feiras agroecológicas e em eventos esporádicos nos quais participam. “O Cefomp tem um laboratório. Então, colhemos da nossa horta agroecológica, manipulamos as ervas, fazemos os remédios e vendemos”, explica Santos.

As ações desenvolvidas pelo Centro incluem, ainda, a realização de rodas de conversa e oficinas sobre temas como boas práticas de manipulação e técnicas de plantio. De acordo com Gerlúcia Santos, os depoimentos das pessoas dizendo que melhoram a saúde depois que se envolveram nas atividades do Cefomp são um grande estímulo para seguirem trabalhando.

E a melhora na saúde não acontece somente por meio do uso dos remédios de plantas medicinais. “A gente tem muitos depoimentos nessa questão da alimentação saudável. Pessoas dizendo que mudaram totalmente o hábito alimentar, porque participaram com a gente das oficinas. E tem também muita gente que vai pra instituição para ajudar na horta, porque diz que é uma terapia”, analisa Santos.

A coordenadora do Cefomp ressalta ainda como o trabalho realizado com a agroecologia teve impacto na alimentação da própria família. “Veja a mudança: na minha casa, a gente consumia 20 kg de açúcar por mês, numa família de 6 pessoas. Hoje, a gente consome só 2 kg. A gente traz a agroecologia pra vida da gente. Não é só como a gente planta, é como você convive com as pessoas, é o que você faz ao seu redor. Eu digo sempre que viver agroecologia não é só plantar de forma saudável, é você viver de forma saudável onde está inserido”, avalia Santos.

Redes de solidariedade
Gerlúcia Santos lembra que os remédios produzidos são importantes para manutenção do Centro e que as hortaliças são utilizadas, principalmente, para consumo na instituição. Mas sempre que chega alguém precisando, sem condições de pagar, os produtos são distribuídos gratuitamente. “A gente sempre distribui para nossos voluntários e para comunidade do entorno, que precisa. Temos essa preocupação na questão social”, argumenta.

Em São Paulo, as Mulheres do Gau também estão engajadas em projetos na comunidade, participando de iniciativas onde doam ou comercializam seus produtos com preços mais acessíveis e incentivando a adoção de práticas de alimentação saudável. Entre as atividades realizadas pelo grupo estão as aulas de educação ambiental, palestras e oficinas nas escolas.

Além dos laços de solidariedade, que são criados com as comunidades e entre as integrantes de um mesmo grupo, a articulação entre as organizações também é um ponto que deve ser destacado. Leia conta que o grupo Mulheres do Gau faz parte da Rede de Agricultoras Paulistanas Periféricas de São Paulo (RAPPA) e da Associação dos Agricultores da Zona Leste (AAZL). Segundo ela, esses são espaços importantes, pois fomentam a troca de experiências e de informações, a participação em editais de financiamento e a mobilização para reivindicarem coletivamente ações do poder público.

Já em Pernambuco, o Cefomp integra, com outros quatro Centros, a Associação dos Manipuladores de Remédios Fitoterápicos Tradicionais e Semiartesanais (AMARFITSA/PE). Também participam do fórum de economia solidária e de uma rede de agroecologia da Região Metropolitana de Recife.

Para Santos, as ações em rede são muito relevantes para os grupos se conhecerem e se fortalecerem: “Existem muitas pessoas que fazem agricultura urbana dentro do município de Paulista. Hoje, a gente conhece nossos pares e se sente um pouco mais forte.”

A atuação articulada com outras organizações também favorece a incidência na construção de leis e políticas públicas nos municípios. Em 2021, por exemplo, o prefeito de Paulista (PE) sancionou a Lei 5014/2021, que instituiu a Política Municipal de Apoio à Agricultura Urbana e Periurbana, após uma ação coletiva de várias organizações e agricultoras e agricultores do município.

“A gente também conseguiu 16 emendas no orçamento do município, tanto para agricultura urbana como para farmácia viva, que é o trabalho do Cefomp. Agora, a gente está se reunindo pra ver como vamos fiscalizar pra que essa lei seja efetivada de fato”, planeja Santos.

Fonte: Mídia Ninja Capa: Divulgação / Instagram.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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