ALHOS E BUGALHOS
A ocupação dos espaços de mobilidade das cidades brasileiras geralmente reflete o grave litígio social que permeia a rotina de suas populações, sempre com desfechos desfavoráveis aos mais frágeis do sistema trânsito/transporte: os que se deslocam a pé, de bicicleta e de ônibus – via de regra os mais pobres
Por Antenor Pinheiro, especial de Londres, Inglaterra
A despeito da legislação dispor de mecanismos de equidade que garantem a mitigação da contenda cotidiana é esta a realidade – dinâmica inerente às sociedades de classes. Mas nesse contexto, o que chama a atenção é o cinismo contido nas motivações de quem decide a política pública.
Veja-se o caso do novo burgomes- tre de Goiânia. Em ação midiática e espalhafatosa, autorizou o uso das faixas preferenciais de trânsito dos ônibus para motocicletas, onde quem se fode novamente é a porção mais frágil de todas: o cliente do ônibus, o ciclista, o pedestre e a pessoa com deficiência (PCD) – o lado tradicionalmente excluído do sistema brasileiro. A justificação enganadora é que em Londres esta política funciona. Bizarra premissa, longe de significar ignorância, é desejo de classe, prestígio para as minorias que detém o poder sobre o solo e os fenômenos sociais dele decorrentes.
É confundir propositadamente alhos com bugalhos! A falsa equivalência contida na essência desta medida sugere que o comportamento de motociclistas, a infraestrutura viária, o planejamento urbano e a fiscalização de trânsito em Londres são similares ao que vivem os moradores de Goiânia. Embuste político que chama!
Antenor Pinheiro – Geógrafo. Membro do Conselho Editorial da Revista Xapuri.