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AMBIENTE FAVORÁVEL AOS BIOINSUMOS NO BRASIL 

AMBIENTE FAVORÁVEL AOS BIOINSUMOS NO BRASIL 

Em 2023, o agronegócio movimentou cerca de R$ 2,6 trilhões no Brasil, segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA). A participação do setor no PIB nacional beirou os 24% e acompanhou a tendência positiva da última década. O segmento é dividido em produção agropecuária, indústria, serviços e mercado de insumos. 

Por João Marcelo Abbud

Este último, que corresponde a R$ 145,7 bilhões, é composto principalmente pela comercialização de defensivos agrícolas e fertilizantes. Apesar de a compra de insumos sintéticos constituir a maior parte desse mercado, o Brasil pode caminhar para ser um dos maiores produtores e consumidores globais de insumos biológicos para agricultura, ou bioinsumos. 

Esse movimento, cujas evidências são incipientes, porém sustentadas, vem acompanhado de uma série de potenciais vantagens para a economia nacional. Entre elas, a diminuição da dependência de importação de insumos tradicionais e a geração de empregos em cadeias sustentáveis: oportunidade ideal para acelerar a necessária transição ecológica e estimular a inovação no setor agrícola. Há também potencial de reduzir emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE), dado que, no Brasil, grande parte é advinda do agronegócio e, particularmente, do uso de fertilizantes químicos.

A definição de bioinsumos varia conforme contexto, aplicação e país. Mas para o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), é considerado todo produto, processo ou tecnologia de origem vegetal, animal ou microbiana que interfere positivamente no desenvolvimento de organismos e que interage com processos físico-químicos e biológicos. Eles englobam tanto biodefensivos e biofertilizantes quanto inoculantes e nematicidas. Todos esses são necessários para o desenvolvimento sadio das plantas, ou seja, a fitossanidade.

Desde a instauração da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), em 2012, buscou-se implementar ações indutoras de uma transição agroecológica por meio de estudos para viabilizar o registro simplificado de produtos fitossanitários:  uma demanda histórica associada à agricultura sustentável no Brasil. A dinâmica se alinha a diversos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e coaduna com a conservação da agrobiodiversidade. 

Como o MAPA veta o uso de fertilizantes e agrotóxicos elaborados sinteticamente para fins de produção orgânica, abre-se uma janela ideal não só para a agricultura familiar, mas também para o setor agropecuário tradicional. 

O lançamento do Programa Nacional de Bioinsumos (PNB), em 2020, foi um marco legal e institucional importante para o reconhecimento do setor. Ao apresentar os bioinsumos como alternativa aos insumos solúveis tradicionais, que são nefastos ao meio ambiente e à vida humana, o MAPA organizou medidas estruturantes de forma a disseminar o registro e aumentar a aplicação. Isso proporcionou a ampliação da oferta de produtos biológicos com o respaldo de um arcabouço regulatório. 

Desde então, o setor cresceu 50% ao ano e desbancou a média global de 15%, de acordo com a consultoria agro CropLife. Além disso, o segmento ultrapassou 10 milhões de hectares em área tratada e se aproxima de 700 produtos biológicos registrados, entre macro e microrganismos, semioquímicos e bioquímicos. Como parte do Plano Safra 2023/2024, existem ainda linhas de crédito direcionado para fomentar a produção de bioinsumos e o manejo sustentável de sistemas agrícolas, com taxas de juros chegando a 7% ao ano para produtores rurais.

O Brasil é um país reconhecidamente megabiodiverso, o que favorece a instalação de biofábricas e biorrefinarias (unidades produtoras de bioinsumos) e, com isso, a fabricação nacional dos insumos biológicos, tendo ainda grande potencial para exportação. 

Atualmente, existem cerca de 80 biofábricas instaladas no país. Essa aparelhagem deve reduzir custos na cadeia produtiva e consequentemente aumentar a renda em circulação, tanto em salários quanto em lucros. Além disso, pode-se promover atividade econômica e criar empregos a partir das unidades produtoras, diminuindo desigualdades entre áreas rurais e urbanas. 

Com o aumento de demanda para as lavouras de milho, soja e algodão, principalmente, os defensivos biológicos estão em alta histórica de comercialização. Segundo pesquisa da Kynetec, especializada em consultoria agrícola, o mercado brasileiro de biodefensivos movimentou cerca de R$ 4,26 bilhões na safra de 2022/2023, o que representa um aumento de 45% em relação à safra anterior. Isso demonstra que o arcabouço legal e regulatório do PNB pode ter fornecido um terreno propício para o aumento do comércio dos produtos.

Mas mesmo com o robusto crescimento da categoria, a parcela de biodefensivos representa apenas 4% do total de defensivos agrícolas comercializados no Brasil: o domínio dos pesticidas químicos é nítido. A demanda por pesticidas e fertilizantes tradicionais, apesar de crescer mais lentamente que a de bioinsumos, ainda é a base do regime incumbente no agronegócio brasileiro.

 O problema é que, além de contaminar corpos d’água e alimentos por meio da presença de nanopartículas tóxicas e reduzir a biodiversidade, os insumos sintéticos têm a dinâmica produção-consumo bem alinhada e rígida. Essa cadeia está ligada, muitas vezes, à falta de neutralidade política das decisões relativas ao setor, o que pode impor barreiras ao avanço da inovação e das novidades tecnológicos no setor agropecuário em geral.

Ainda existem claros gargalos nesse processo de transição. Mesmo com o arcabouço do PNB, persistem insegurança jurídica e certa viscosidade no estabelecimento de novas cadeias de produção. Mas a dinâmica da ascensão do segmento de bioinsumos não significa necessariamente rompimentos drásticos com o cenário normativo existente. 

O potencial de expansão dependerá muito da eficácia de políticas públicas e dos alinhamentos entre o setor e atores importantes no agronegócio. No horizonte, é possível que os insumos biológicos deixem de ser produtos comercializados em “nicho” e que se consolidem na dinâmica de mercado dominante. Talvez estejamos nos aproximando de um ponto de inflexão que pode, em uma mesma tacada, unir diminuição de desigualdades, sustentabilidade ambiental e desenvolvimento econômico.

images 1João Marcelo Abbud – Graduando em Economia pela UnB e Jornalista. Atua com Economia Ecológica e Sustentabilidade. Foto: Divulgação.

 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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