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Aprovado em Goiás o primeiro regimento interno de um quilombo no Brasil

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A Associação Quilombo (AQK) finalizou em maio a elaboração do regimento interno, um pioneiro em nível nacional. O regimento interno estabelece normas para a gestão ambiental e territorial do Sítio Histórico e Kalunga (SHPCK), para o reconhecimento da ascendência e da remanescência Kalunga, e para a do turismo no território. O SHPCK é considerado o maior território de quilombo no Brasil, com 261.999,69 hectares, e fica localizado na região da Chapada dos Veadeiros, em Goiás.

De 18 de março a 12 de maio foram realizadas 14 assembleias, que envolveram todas as 39 comunidades Kalunga e contaram com a participação de mais de mil pessoas. Nestes encontros foram debatidos os pontos mais importantes que, no entendimento dos presentes, deveriam constar do  regimento interno, sendo por eles eram votados e aprovados os conteúdos. Nestas assembleias também foi sendo amadurecida a criação de um Conselho de Representantes da AQK, um colegiado formado por três representantes de cada comunidade local e que passou a integrar a direção da  Associação Quilombo Kalunga.

Nos dias 23 a 26 de maio foi realizada a Assembleia de Representantes eleitos nas reuniões das comunidades, na sede da Associação Kalunga de Cavalcante. Foram momentos de intensos debates de cada artigo e de cada parágrafo, sendo, ao final, aprovado.

De acordo com Vilmar Souza Costa, presidente da Associação Quilombo Kalunga, o regimento interno é de essencial importância para regulamentar as relações existentes dentro do território, sempre respeitando os costumes, os saberes e as tradições do povo Kalunga. “A criação do nosso regimento é mais uma demonstração da capacidade do povo Kalunga de se organizar, de defender e de gerir seu território. Construímos de forma coletiva e participativa as nossas próprias normas, que serão seguidas por todo o nosso povo”, afirma Costa.

Aparecida Mato, diretora-executiva da CONAQ – Coordenação Nacional de Articulações das Comunidades Negras Rurais do Brasil– participou de uma das 14 assembleias e enalteceu a importância das normas e da cultura de um povo quilombola serem colocadas no papel, como uma prova escrita e concreta de tudo que está estabelecido. “Este é o primeiro quilombo do Brasil a criar um regimento interno. É um exemplo e um modelo que será seguido por várias outras comunidades quilombolas do Brasil”, revela.

Houve dois outros fatos importantes durante a realização da Assembleia. O primeiro foi a apresentação do grupo de teatro “Arte Kalunga MATEC”, que apresentou a peça “Escravo em Busca de ”. O outro foi  a participação dos estudantes Kalunga universitários, que tiveram direito de participar dos debates e de indicar três delegados com direito a voto.

Outro tema que foi tratado nas reuniões nas comunidades e na  assembleia de representantes foi o projeto “Uso do Geoprocessamento na Gestão do Sítio Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga – SHPCK”, fomentado pelo Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF, da sigla em Inglês para Critical Ecosystem Partnership Fund)O projeto tem como objetivos conhecer com profundidade a realidade das comunidades Kalunga, usar a tecnologia de geoprocessamento  para mapear detalhadamente o território, promover a ocupação do SHPCK de uma forma mais sustentável e fazer com que os Kalunga sejam reconhecidos internacionalmente como defensores da da biodiversidade. O geógrafo Elizon Nunes apresentou os avanços do projeto para os presentes.

Sobre a Associação Quilombo Kalunga

A Associação Quilombo Kalunga – AQK – é uma organização civil, sem fins lucrativos e sem finalidade econômica, fundada em outubro de 1999. É  constituída pelas Associações Kalunga de Cavalcante, de Monte Alegre, de Teresina e do Engenho II, além da Epotecampo. Ela representa o maior território de quilombo no Brasil, com 262 mil hectares de terras. A Associação promove a defesa de interesse de todas as comunidades formadas por moradores do Sítio Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga – SHPCK -, espalhados entre os municípios goianos de Cavalcante, Monte Alegre de Goiás e Teresina de Goiás, e representá-las em todas as instâncias legais e administrativas. Mais informações: (62) 3494-1062, aqkalunga@gmail.com e https://www.facebook.com/pg/AQK-Associação-Quilombo-Kalunga.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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