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Apiwtxa: Sobre a Terra Indígena Kampa do Rio Amônia

Apiwtxa: Carta sobre a Indígena Kampa do Rio Amônia

CARTA ABERTA — Da Associação dos Ashaninka do Rio Amônia (Apiwtxa) sobre a decisão judicial que afeta a Terra Indígena Kampa do Rio Amônia:

“Aguardamos dos Excelentíssimos ministros do STF, o respeito à nossa cultura, à nossa história e o reconhecimento da nossa luta. Esperamos que o consideração do STF para com o povo Ashaninka não se restrinja às fotografias da exposição permanente, ofertada por Sebastião Salgado, que ornam as paredes da sublima Corte.”

Na década de 1980, empresas madeireiras da família Cameli causaram profundos danos ambientais e culturais ao povo Ashaninka do rio Amônia. Para explorar madeiras nobres, principalmente cedro e mogno, essas empresas invadiram o território Ashaninka em três ocasiões: 1981, 1985 e 1987. As madeireiras abriram dezenas de quilômetros de estradas e ramais na mata, afetando mais de ¼ da Terra Indígena Kampa do Rio Amônia.

A exploração predatória de madeira levou a consequências dramáticas para o meio ambiente e os Ashaninka. Enormes parcelas de floresta foram destruídas, empobrecendo significativamente a da região. As explorações madeireiras afugentaram a caça e poluíram os rios. Enquanto os donos das empresas lucravam milhões de dólares no mercado internacional com a venda de madeira nobre, o povo Ashaninka do rio Amônia, cujo modo de vida é baseado na agricultura de subsistência, pesca, caça e extrativismo, vivia a pior crise de sua história: forçado para os madeireiros, doenças, mortes, perdas culturais, etc.

Aos poucos, os Ashaninka do rio Amônia se organizaram e se recuperaram do trauma sofrido. Expulsaram os madeireiros, lutaram para a de sua terra e iniciaram uma longa luta pela recuperação ambiental do seu território com projetos de reflorestamento e de . Essas ações se estenderam progressivamente a toda a região do Alto Juruá, beneficiando populações indígenas e não indígenas.
Ao longo dos últimos tinta anos, as ações dos Ashaninka do rio Amônia em prol do desenvolvimento sustentável não só do seu território mas de toda a bacia do Alto Juruá, uma das regiões mais ricas em biodiversidade do , têm recebido importante reconhecimento nacional e internacional.
A Associação dos Ashaninka do Rio Amônia (APIWTXA) tem sido periodicamente homenageada com vários prêmios por suas ações em defesa do meio ambiente e da em geral. A última dessas homenagens foi a outorga do Prêmio Equatorial do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), recebido na sede da ONU, em Nova Iorque, em setembro de 2017.
A luta constante e incansável dos Ashaninka do rio Amônia para a proteção da Amazônia e das populações tradicionais, indígenas e não indígenas, está novamente ameaçada por decisões arbitrarias de justiça brasileira.
Em 1996, a APIWTXA, em ação ajuizada pelo Ministério Público Federal do Acre, denunciou à justiça brasileira os donos das empresas madeireiras responsáveis pela devastação de parte de seu território na década de 1980.
A Ação Civil Pública de indenização por atos ilícitos, danos morais e a ambientais, cometidos pelos donos das madeireiras contra o povo Ashaninka se arrasta há mais de trinta anos no sistema judiciário brasileiro.
Os réus foram condenados em primeira instância na Justiça Federal do Acre, em segunda instância no Tribunal Regional da 1ª Região em Brasília e, também, no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Assim, em 2007, os ministros do STJ condenaram por unanimidade os réus ao pagamento de uma indenização milionária aos Ashaninka e à União. Contudo, a decisão do STJ não pôs fim ao processo. Diante de uma nova derrota, os réus usaram manobras jurídicas e apelaram ao Supremo Tribunal Federal (STF) onde o processo está desde 2011.
Em seu recurso ao STF, a família Cameli e seus advogados alegam a prescrição do dano ambiental, cuja imprescritibilidade já foi reconhecida pelo STJ. Assim, mesmo derrotados em todas as instâncias, os réus continuam omitindo suas responsabilidades e protelando a decisão judicial. Agora, conseguiram, no STF, mais tempo para não cumprir o que determinou a Justiça.
Em 25 de agosto de 2017, o Ministro Alexandre de Moraes, relator do processo no STF, decidiu, num primeiro momento, rejeitar o recurso dos réus, impondo mais uma derrota aos madeireiros. Em 9 de maio de 2018, alguns meses após sua primeira decisão, o mesmo Ministro, numa atitude surpreendente, reconsiderou seu posicionamento e revogou sua própria decisão sem explicar os fundamentos de tal mudança.
Ao agir dessa forma, o Ministro Alexandre de Moraes deu início à discussão no STF para decidir se há imprescritibilidade dos danos ambientais cometidos pelos réus. A defesa dos Ashaninka já protocolou novo recurso ao STF e aguarda posicionamento do Ministro Alexandre de Morais e da Suprema Corte.
A APIWTXA se mostra profundamente indignada e preocupada com as manobras políticas e judiciais que têm ocorrido ao longo de mais de três décadas no âmbito deste processo. As manobras dos réus e de seus advogados visam ocultar a responsabilidade da família Cameli pelos crimes ocorridos na década de 1980.
Cabe lembrar que essa família integra a elite política e econômica do Acre. Orleir Cameli foi governador do do Acre de 1994 a 1998. Seu sobrinho, o atual senador Gladson Cameli, é pré-candidato ao governo do Estado nas próximas eleições.
Ashaninka Altino Machado 4
Os Ashaninka continuam acreditando na justiça brasileira e no respeito à Constituição Federal de 1988 da qual a Suprema Corte é a guardiã. Contudo, a lentidão no julgamento desse processo e as mudanças recentes nos preocupam muito. A APIWTXA está atenta e repudia manobras políticas que procuram pressionar o judiciário. Está determinada em sua busca por justiça e continuará sua luta em defesa do povo Ashaninka.
Salientamos que o que está em jogo nesse julgamento não é simplesmente o interesse de uma comunidade indígena que luta para defender seu modo de vida e proteger seu território contra as ações criminosas de representantes da elite politica e econômica regional. A luta do povo Ashaninka do rio Amônia é movida por um ideal que deveria ser abraçado por todos nós.
A defesa da Amazônia, a proteção da biodiversidade, o combate às mudanças climáticas e a busca de alternativas econômicas que possam garantir a sustentabilidade ambiental dos nossos recursos naturais deve ser uma bandeira comum, de interesse de todos, independentemente de partidos políticos e ideologias.
A APIWTXA tem feito sua parte e continuará a trilhar esse caminho para concretizar esse ideal, em beneficio não só da comunidade Ashaninka do rio Amônia, mas da população do Alto Juruá, da Amazônia, do Brasil e do mundo.
Aguardamos dos Excelentíssimos ministros do STF, o respeito à nossa cultura, à nossa história e o reconhecimento da nossa luta. Esperamos que o consideração do STF para com o povo Ashaninka não se restrinja às fotografias da exposição permanente, ofertada por Sebastião Salgado, que ornam as paredes da sublima Corte.
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Fonte: Blog do Altino Machado.  Fotos:  Altino Machado


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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