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CHICO MENDES

CHICO MENDES PROJETOU UMA UTOPIA

Chico Mendes projetou uma

Eu hoje fico pensando como a agenda da Aliança dos Povos da Floresta tinha um apelo tão forte e tão mobilizador. Eu acho que esse apelo tinha a ver um pouco com a novidade da nova [de 1988]. Foi nesse ambiente que o Chico Mendes projetou mais do que ideias, ele projetou uma utopia.

Por

Com sua presença calma, com o seu próprio tom de voz – nunca tinha exaltação na fala dele e, mesmo quando ele falava das injustiças, das coisas duras que aconteciam com ele e com a floresta, a maneira dele expressar era sempre tão amorosa e tão boa que, em vez de desespero, o que o Chico passava sempre era a esperança.

A presença do Chico como uma pessoa da paz e do diálogo, naquele momento em que o Brasil vivia o seu processo de redemocratização, ficou marcada de forma muito especial naquela plantinha que nós chamamos de Aliança dos Povos da Floresta, que brotou naquele ambiente de mudança. 

Apesar de todas as dificuldades, porque nada foi fácil e nem a gente sabia se a semente que nós plantamos ia vingar ou não. Quando ainda não se pensava na articulação de vários setores da sociedade, a nossa Aliança juntou índios, , ribeirinhos e mais um monte de gente em uma só bandeira, em um espaço acolhedor para a prática da parceria e da solidariedade. 

Eu me sinto orgulhoso de ter participado de tudo isso com uma turma tão comprometida com o entendimento de que a floresta é uma lugar sagrado onde a vida se realiza de maneira plena. 

Durante toda essa jornada, a presença do Chico foi sempre muito viva e muito importante. Até hoje a presença dele é tão forte e tão inspiradora que muitas vezes sinto que está bem aqui junto com a gente. 

Mas hoje, passados quase 35 anos da morte do Chico, tento, com uma certa distância, recontextualizar essa nossa história e esse legado do Chico Mendes para repassá-lo à geração que agora chega, que se acerca de nós através de nossos filhos e netos.

Ao fazer essa reflexão, penso sempre no Chico Mendes como um ser humano curioso, inquieto e instigador, que estava sempre buscando alternativas para melhorar a qualidade de vida dos povos da floresta.

WhatsApp Image 2023 11 14 at 19.01.22Ailton Krenak Fundador, junto com Chico Mendes, da Aliança dos Povos da Floresta. Membro do Conselho Editorial da Revista Xapuri. Imortal da Academia Brasileira de Letras. Excerto de depoimento concedido à , no segundo semestre de 2008, para o livro .

CHICO MENDES PROJETOU UMA UTOPIA
Foto: Acervo IEA/CNS

A ALIANÇA DA FLORESTA, SEGUNDO CHICO MENDES

Com essa experiência de Xapuri em realizar esse Encontro Nacional [dos Seringueiros] em , (…) nesse encontro [ocorrido em outubro de 1985, na Universidade de Brasília] se começa a descobrir outras lideranças que viviam isoladas, (…) e começa então a se expandir pra toda a essa luta.

E surge a proposta de aliança com as principais lideranças indígenas, (…) se pensa numa possibilidade de manter contato com a direção da União das Nações Indígenas.

faz um contato, através do Ailton Krenak, com Biraci Brasil, a discussão começa a se  ampliar e hoje começa-se já a acontecer os encontros dos índios com a participação dos  seringueiros e a Aliança começa a se ampliar (…)

Denomina-se com isso a Aliança dos Povos da Floresta Amazônica.

Chico Mendes Depoimento a Lucélia Santos, em maio de 1988. 

Nota da Redação – A Aliança dos Povos da Floresta foi formalmente consolidada em março de 1989, em , Acre, durante o II Encontro Nacional dos Seringueiros e . Infelizmente, Chico Mendes, assassinado em dezembro de 1988, não viveu para participar do, por ele tão sonhado, I Encontro dos Povos da Floresta.

Chico Mendes Instituto Lula

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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