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A DAMURIDA DOS MACUXI

A Damurida dos Macuxi: um quentíssimo ensopado de peixe ou caça moqueada

Conheci a Damurida, símbolo da culinária Macuxi, em uma comunidade indígena em Roraima, durante um Festival Wapichana-Macuxi de Damurida, no ano de 2010.

Por Zezé Weiss

Foi lá que uma Damurida de tambaqui me fez suar frio e pedir arrego, já que nem o pirão de tapioca que a acompanhava foi capaz de aliviar a quentura que tomou conta da minha boca, dos meus olhos, do meu rosto inteiro.

Entre um panelão de barro e outro (são enormes e lindos!), a amiga Ivanilde Macuxi me apresentou aquele ensopado de peixe (também pode ser de caça moqueada) pra lá de condimentado. Foi também a Ivanilde quem me disse que o segredo da Damurida está no molho, um caldo de tucupi que, ao contrário do tucupi normal, geralmente ralo e amarelado, depois de apurado no fogo por horas torna-se escuro e encorpado.

Mas as mulheres indígenas com quem conversei me disseram que só o tucupi não garante uma boa Damurida, que o principal mesmo é temperar o caldo da Damurida com o tucupi engrossado, com o cariru, uma folha amazônica, e com a pimenta, aliás, as muitas pimentas, como a murupi e a olho-de-peixe, todas muito ardidas, porque sem pimentas, pra elas, não é Damurida.

Caminhando pelas barracas, onde mulheres e homens indígenas – e até crianças – degustavam suas damuridas como se fosse água de coco, soube que o prato nasceu por necessidade, que vem do tempo em que os grupos indígenas faziam longas caminhadas. Naquela época, que já ficou pra trás, as caravanas aprenderam a usar o moquém, que consiste em assar lentamente o peixe ou a caça na fumaça que sobe dos braseiros, pra que pudessem durar por mais tempo.

Juntando a carne moqueada com o caldo apimentado, assim surgiu a Damurida, esse prato pra lá de quente, mas mesmo assim pra lá de delicioso, que deixa saudades pra sempre!

Publicado originalmente em 27 de março de 2021


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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