ENHEDUANNA

ENHEDUANNA: A AUTORA MAIS ANTIGA DO MUNDO

ENHEDUANNA: A AUTORA MAIS ANTIGA DO MUNDO

Enheduanna, que viveu 4.300 anos atrás, é a autora mais antiga do mundo de quem temos conhecimento…

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O Disco de Enheduanna, onde a escritora aparece representada no centro – Wikimedia Commons

Sim, antes da antiga poeta grega Safo, antes de Confúcio, antes mesmo até da Epopeia de Gilgamesh, houve Enheduanna: uma sacerdotisa, princesa, poeta e professora que viveu, escreveu e governou como parte da sociedade mais antiga do mundo. A história dela é também a história do começo do mundo escrito – e da civilização como conhecemos! 

Naquela época, os atuais territórios de Iraque, Síria e Turquia eram parte de uma região antiga chamada Mesopotâmia, onde muita gente acredita que o que hoje se chama civilização começou. Também foi onde a primeira escrita foi desenvolvida.

A escrita cuneiforme, um sistema de marcas feitas com cunhas, talhadas em tabuletas de argila, foi usada 3 mil anos como escrita por uma variedade de línguas. As tabuletas de argila duravam milhares de anos e são as primeiras peças escritas descobertas. Muitas tabuletas contêm leis, orações e cartas comerciais em formato escrito.

Enheduanna é filha do poderoso rei Sargão de Akkad (2334-2279 a.C.) e da esposa dele, a rainha Tashlultum. O rei Sargão, considerado o primeiro imperador do mundo, uniu a maior parte das terras da Mesopotâmia sob sua bandeira, quando os exércitos do norte da Mesopotâmia invadiram os sumérios no sul, o que abriu caminho para o estabelecimento do Império Acadiano, o primeiro império da história unido sob a bandeira de um líder.

Sargão nomeou sua filha como a primeira sacerdotisa e esposa de Nanna, o deus da lua, na cidade suméria de Ur, e essa nomeação fazia parte de seu plano para fortalecer os pilares de seu governo. E quando ela assumiu sua missão, seu nome passou a ser “Enheduanna”, que na língua suméria significa “a primeira sacerdotisa, o adorno do céu”.

Nessa função, como esposa do deus da lua e representante de seu pai, o rei, ela se tornou a figura mais importante em Ur, e sua personalidade ficou mais evidente porque ela escreveu poesia, e seu pai, o rei, pediu ela para escrever hinos para Inanna, a deusa do amor, da guerra e da fertilidade. Designou a filha como Alta Sacerdotisa, um papel de importância política, espiritual e social; ela é a primeira mulher conhecida a ter esse título.

Em 1927, nas areias desérticas do Iraque, um fragmento de uma dessas tabuletas de argila com textos de Enheduanna  foi descoberto em um cilindro de alabastro, entre ruínas antigas que foram descobertas em Ur durante as escavações da missão arqueológica britânica chefiada pelo arqueólogo Leonard Woolleys (1880-1960), e posteriormente verificadas por um especialista em história antiga da Assíria na Universidade de Sydney, a pesquisadora australiana Louise Brycki em sua dissertação sobre o cilindro para seu doutorado. 

Em sua dissertação, Brycki afirmou que o cilindro (agora alojado no Museu da Pensilvânia na Filadélfia) mostra Enheduanna em primeiro plano, com seu nome na lateral do cilindro, enquanto ela dedica um pódio à deusa suméria Inanna em seu templo. Este cilindro é a única testemunha sobrevivente que mostra o nome e a forma de Enheduanna, e um texto indicando que ela é a esposa do deus da lua Nanna e filha do rei Sargão Akkad. 

O texto foi transferido para a Tablet séculos depois de seu tempo, o que indica a continuação de seu legado muito depois disso. Parece dessa cópia que Enheduanna dedicou este cilindro único a um templo para comemorar sua construção. Fica claro pelos textos daquela sacerdotisa que ela glorificou a deusa Inanna mais do que todas as outras divindades sumérias. Seus poemas sobre Inanna são os primeiros textos escritos de uma deusa antiga.

A escrita neste cilindro é de uma cópia de uma antiga placa babilônica datada entre 1894 e 1595 a.C., registrada cronologicamente centenas de anos após o poema Enheduanna. A cena gravada na seção correspondente do cilindro representa um pátio sagrado ao ar livre, à esquerda dele está um edifício de várias camadas, e uma Ehenduanna no meio com algum espaço ao redor, atrás dela dois sacerdotes carregando vasos rituais, e um padre na frente dele aspergindo líquido sagrado em um altar. 

Enheduanna está vestida com um manto em camadas com franjas e um chapéu em forma de anel, e tanto a touca quanto a touca se tornam um vestido ritual para aqueles que vieram depois dela. É claro pelo movimento de sua mão que ela está repreendendo ou punindo, e a direção de seu rosto está voltada para cima, como do mundo terreno para o mundo espiritual submisso de Inanna.

Desde a descoberta e escavação, pelo menos três dos grandes trabalhos de Enheduanna foram traduzidos para o inglês a partir da antiga linguagem suméria: dois são cânticos de devoção a Inanna, a poderosa deusa do amor, da guerra e da fertilidade. A “Exaltação de Inanna” tem 153 linhas e é cheia de amor e admiração pela grande deusa. Também conta a história de como Enheduanna foi forçada pelos inimigos a deixar o trono; ela agradece Inanna por ajudá-la a voltar e retomar sua posição de poder. 

A escrita de Enheduanna é impressionante, não apenas por causa do quanto de tempo tem, mas também pelo quanto é boa e bastante pessoal. Seus cânticos e poemas expressam suas emoções apaixonadas, tanto de alegria e amor, quanto de medo e raiva. Ela também escrevia na primeira pessoa, o que significa que usava “eu” e “mim”, em vez de ela e ele. 

Outro diferencial é que a sua voz é confiante e forte. A escrita nos diz que ela viajava ostensivamente, pois descreve em detalhe a beleza de inúmeros templos. Seus escritos foram copiados e honrados por séculos, e ainda se acredita que tiveram grande influência no desenvolvimento da literatura e da religião dos mil anos seguintes.

Fontes: Mulheres Incríveis. Escrito por Kate Schatz. Editora Astral Cultural, 2017. “Os textos históricos mais antigos…” https://www.uniaolibanesa.net.br/os-textos-poeticos-mais-antigos-de-3-400-anos-a-c-foram-escritos-por-uma-mulher-a-princesa-enheduanna/. Edição: Zezé Weiss. 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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