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Frei Betto e as lições de sua avó Maria Zina

Frei Betto e as lições de sua avó Zina

O escritor Frei Betto tem um livro chamado: “Minha avó e seus mistérios”, no qual se inspira nas lições que aprendeu com sua sábia avó. Num dos textos do livro ele compartilha uma dessas preciosas lições. Veja!

Por Isaias Costa

Jamais se envergonhe de sua . Ela é a sua raiz e identidade. Quem é mais culto: o professor de física quântica ou a cozinheira analfabeta que lhe prepara manjares de dar água na boca? Lembre-se: não existe ninguém mais culto do que outro. Existem culturas distintas e socialmente complementares.

E arrematou:

– Para sobreviver, o professor de física quântica depende mais da cultura da cozinheira analfabeta do que ela dos conhecimentos dele.

Frei Betto

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Considero fundamental e importantíssima essa reflexão da sua avó, dona Maria Zina, porque vivemos num repleto de competição, onde muitos se sentem melhores do que os outros. Sempre reitero que a competição tem uma relação direta com a comparação. As pessoas se comparam de “n” maneiras, e isso nunca leva a lugar nenhum, porque cada pessoa é um universo particular, com uma de vida única e incomparável.

Cultura é uma palavra muito bonita. Sua raiz etimológica significa cultivo. A cultura é aquilo que cultivamos, por isso que não se restringe a algum conhecimento acadêmico, este é apenas um dos tipos de cultura. Não é à toa que se usa a mesma palavra para a agricultura (cultivo dos campos). Os campos só crescem se cultivados, se bem cuidados, se bem alimentados…

Ele cita a de cozinhar nesse texto. Eu tenho um respeito e admiração profunda por quem cozinha bem, e já escrevi em vários textos que sou muito fraco nessa arte. Se eu dependesse apenas de mim pra me alimentar, tenho certeza que seria “seco em vida” como se diz popularmente!

Até me identifiquei total com as palavras do Frei Betto. Eu entendo bastante de Física Quântica, afinal, minha primeira graduação foi em Física. Mas jamais saio por aí falando pra todo mundo sobre isso, porque sei da complexidade e mais ainda, sei que em determinados lugares é um verdadeiro contrassenso falar sobre Física não é mesmo?

Eu cultivo o conhecimento e gosto de compartilhá-lo, e acredito que a dona Zina quis dizer nas entrelinhas do seu ensinamento que precisamos nos manter sempre abertos para apreciar as culturas diferentes da nossa. O Frei Betto escreve: “Existem culturas distintas e socialmente complementares”. Isso é maravilhoso e muito verdadeiro!

Eu como professor e se não fossem os alunos não poderia exercer essa profissão. Isso pode ser levado para todas as áreas: um motorista conduz os passageiros para seus destinos e eles pagam a passagem que se reveste no seu salário e manutenção da empresa de ônibus.

Os advogados trabalham para estabelecer a em situações onde os envolvidos de alguma forma necessitam dela para restabelecer a harmonia. Eles passam anos estudando e aprendendo um montão de coisas! É fantástico poder contar com eles quando se precisa. Sua cultura é mais do que fundamental no nosso mundo.

Há também as culturas ligadas aos costumes, que fazem com que o turismo seja forte nos mais diversos estados no nosso país ou mesmo pelo mundo afora. Já pensou que tedioso seria se os países do mundo inteiro tivessem os mesmos costumes? Quando viajamos sempre voltamos pra casa contando as coisas que são diferentes do local onde moramos não é mesmo? É exatamente aí que nosso repertório de vida se amplia!

Enfim! Exemplos não faltam, mas a principal mensagem do Frei Betto e sua sábia avó é que as culturas se complementam e todas são importantes. Não existe uma melhor do que outra e a beleza da vida está justamente em nos conectarmos com as mais diversas culturas, compartilhando a nossa e aprendendo um pouco com a das outras pessoas e outros povos…

Fonte: Conti Outra


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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