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Manoel Cunha: presidente do CNS (2005-2009/2009-2012)

Manoel Cunha: presidente do CNS (2005-2009/2009-2012)

Descendente dos seringueiros que desbravaram o rio Juruá nos tempos áureos do látex, que gerou imensas fortunas para os seringalistas, Manoel Cunha, como tantos outros, também foi vítima do sistema de aviamento que escravizou milhares de extrativistas na .

Por Marcos Jorge Dias

Crescer em meio a uma gritante desigualdade social, presenciar inúmeras injustiças e as condições desumanas em que viviam muitos dos seus companheiros fez com que, desde cedo, o jovem seringueiro buscasse se engajar em movimentos que lutavam por melhores condições de e por justiça social.

Para Manoel, tudo começou no início dos anos 1980, quando teve contato com o movimento de Educação de Base da Igreja Católica. Após uma aula sobre a conjuntura social brasileira, Manoel entendeu que os explorados formavam a camada mais populosa da e que, unidos, poderiam mudar aquela realidade opressora.

Manoel integrou o Movimento de Educação de Base (MEB), foi membro da articulação que criou em Carauari, no Amazonas. Foi presidente da principal organização do Médio Juruá, a Asproc. Seu trabalho fez com que ele se tornasse reconhecido nacionalmente e, em 2005, foi eleito para comandar o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), sendo presidente por duas gestões consecutivas, nos anos de 2005 a 2009 e de 2009 a 2012.

Protagonista de diversas lutas em uma região onde a ausência histórica do permite que ações criminosas continuem ocorrendo (atualmente, o garimpo ilegal de ouro) e coloca em risco a vida dos defensores da Amazônia, Manoel é um grande personagem da do CNS, da Amazônia e das lutas sociais.

Um acontecimento que marcou a vida do extrativista foi a visita, no começo dos anos 1990, do então presidente do CNS, Juarez Leitão, ao Médio Juruá, com a ideia que já fervilhava em todas as regiões da Amazônia a criação de mais Reservas Extrativistas (as primeiras quatro Resex foram criadas em março de 1989), em especial a criação da Resex do Médio Juruá. 

Com 286 mil hectares, a Resex do Médio Juruá só saiu do papel em 1997, sete anos após o pedido de criação feito por Manoel Cunha e outras lideranças locais. 

Com a criação da Resex, os patrões seringalistas deixaram a área e os seringueiros finalmente se apropriaram da gestão do território, dando início a diversas ações que transformaram a unidade em símbolo de sustentabilidade.

Em 2016, a pedido da própria comunidade, Manoel tornou-se gestor da Resex do Médio Juruá, uma das mais preservadas entre as áreas protegidas da Amazônia brasileira, segundo dados do PRODES (INPE), gerida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do

Vim parar no ICMBio por exigência da comunidade. Meu nome sempre esteve à disposição do meu povo, que me conduz para onde acha que eu tenho maiores condições de colaborar. Se um dia a comunidade achar que não colaboro mais, vou sair daqui feliz e tocar minha vida no seringal como sempre toquei, porque o que gosto mesmo é de viver no meio do mato e cortar seringa.

Não é o caso. Manoel Cunha é uma referência na história do CNS e da do povo amazônida que luta contra o desmatamento e pela preservação da Floresta, patrimônio de todos e de todas as pessoas que nela vivem. 

Desde que equipamentos de garimpo ilegal foram apreendidos em uma operação conjunta do Ibama e da Polícia Federal, em novembro de 2022, na região localizada entre os municípios de Carauari e Itamarati, no estado do Amazonas, Manoel passou a ser  alvo de ameaças e precisou sair da comunidade onde mora, para proteger sua própria vida, após receber informações de que estaria sendo procurado por um grupo de desconhecidos. 

1608260656039Marcos Jorge Dias Escritor. Estudante de Jornalismo. Membro do Conselho Editorial da . Perfil produzido a partir de entrevista feita por Wérica Lima e Leandro Chaves, publicada no Amazônia Real em  23/03/2023. Foto: Divulgação.

 
 
 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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