Maurício Ye’kwana: Fui à ONU pelo Brasil

Maurício Ye’kwana: Fui à ONU pelo Brasil

 
por Maurício Ye’kwana

Artigo originalmente publicado na Folha BV

Tive a oportunidade de levar a voz dos indígenas para a Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, no dia 25 deste mês. Falei da situação do povo Yanomami e Ye’kwana no Brasil, onde nosso território está sendo invadido por mais de 20 mil garimpeiros que levam como a malária, bebidas alcoólicas, drogas e violência para as comunidades e ainda poluem os nossos rios com mercúrio, contaminando também nossos parentes. Mencionei também que em 2020, dois Yanomami foram assassinados por garimpeiros. Falei da situação em meio a pandemia, que a presença da mineração ilegal tem levado também a para as comunidades que vivem próximas ao garimpo. Dói ver a floresta sendo destruída e a nossa vida ameaçada.

Foi necessário acessar esse organismo internacional para que nosso apelo fosse escutado. Aqui no Brasil não estamos conseguindo ser ouvidos pelo governo atual, que faz apenas ataques contra os povos indígenas. Por isso, enquanto liderança indígena, precisamos tomar atitudes diante da postura do Governo Federal em relação aos povos indígenas. Posturas que têm interferido na vida das populações indígenas, dos . Uma anti- que ameaça Terras já demarcadas, reconhecidas de fato e de direito pela constituição brasileira, ataques preconceituosos, descaso e abandono diante da pandemia, pressão para a regulamentação de mineração em nossas terras. Essa postura também tem interferido na base, pois chama a atenção de indígenas que estão sendo aliciados e comprados e isso afeta diretamente as comunidades.

O pronunciamento do Bolsonaro esta semana, na Assembleia Geral da ONU, apresenta uma realidade completamente distorcida da vida dos povos da , dos indígenas do Brasil, principalmente dos Yanomami e Ye’kwana, aqui em Roraima. Ele nem deveria mencionar e nem falar dos povos indígenas, porque ele só ataca os nossos direitos. Não somos responsáveis pelo desmatamento, nem pelas queimadas, não incentivamos a exploração mineral em terras indígenas. O próprio governo faz isso! A Terra Indígena Yanomami tem mais de 60% de sua área coberta por requerimentos minerários.

Estamos em plena Campanha Fora Garimpo, Fora Covid, uma grande mobilização que pede a saída dos invasores, pois esse é o papel do brasileiro. Nós indígenas tememos por um novo genocídio para nosso povo.

Por isso, pedimos apoio para a campanha assinando a petição que pede a desintrusão dos invasores, a saída dos garimpeiros ilegais da nossa terra. Ajude a salvar as nossas vidas, a nossa floresta. Entre na página foragarimpoforacovid.org, conheça a campanha e abrace também a nossa .

Pedimos também mais respeito pela nossa , nossas tradições. Não ter discriminação, principalmente, racismo. A luta do povo Yanomami e Ye’kwana é pela sobrevivência, para manter a floresta em pé, sem a floresta nós não temos vida. Por isso, é importante levar a nossa mensagem para o Brasil e para o mundo. A sociedade não indígena precisa nos conhecer, saber quem são os povos indígenas e por que lutamos. Eu gostaria que as autoridades escutassem nosso grito pedindo a desintrusão dos invasores ilegais das Terras Indígenas. Essa luta é de todos nós, é o nosso dever proteger o planeta.

*Líder indígena e diretor da Hutukara Associação Yanomami

Fonte: ISA

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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