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INÊS ETIENNE ROMEU

INÊS ETIENNE ROMEU: ÚNICA SOBREVIVENTE DA “CASA DA MORTE”

Inês Etienne Romeu: única sobrevivente da “casa da morte”

Mineira da cidadezinha de Pouso Alegre, Inês Etienne Romeu participou de grêmio estudantil, cursou História, trabalhou em banco e, em 1963, abriu um bar em Belo Horizonte, capital mineira, o “Bucheco”, em a Ernesto Che Guevara.

Por

Integrante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), um dos grupos armados que lutaram contra a , Inês Etienne participou, junto com o guerrilheiro Carlos Lamarca, do sequestro do embaixador suíço Giovanni Bucher, em 07/12/1970. Depois da troca do embaixador pela liberação de 70 presos políticos, Inês decidiu abandonar a luta armada e exilar-se no Chile. Era tarde demais.

Em 05/05/1971, a guerrilheira foi capturada por agentes do delegado Sérgio Paranhos Fleury (1933-1979) em , sob acusação de integrar o comando da VPR. Depois de ser levada para o Departamento Estadual de Ordem Política e Social (DEOPS), onde sofreu as primeiras sessões de tortura, foi transferida para a “Casa da Morte”, em Petrópolis. Inês tinha apenas 29 anos.

A “Casa da Morte era um aparelho clandestino montado pelo Centro de Informações do Exército (CIE), localizada no antigo número 668 da rua Arthur Barbosa, no bairro de Caxambu, em Petrópolis, para torturar e matar lideranças do movimento armado com papel de destaque em suas organizações clandestinas.

Entre 8 e 11/08/1971, Inês foi torturada e estuprada na “Casa da Morte”. Segundo estimativas especiais, pelo menos 22 guerrilheiros/as foram assassinados/as no local. Inês Etienne Romeu foi a única que sobreviveu.

Última presa política a ser libertada no , em 29/09/1979 — não pela Anistia, mas sim em liberdade condicional —, Inês resolveu denunciar a existência da “Casa da Morte” de Petrópolis e identificou o ex-paraquedista Antônio Waneir Pinheiro Lima, o “Camarão”, como o torturador que a estuprou por duas vezes durante os três meses em que ficou presa na “Casa da Morte”, sem nunca entregar ninguém.

Por conta das denúncias de Inês Etienne, “Camarão” foi o único militar a responder por violência sexual na ditadura militar. Conseguiu tanta visibilidade que a ditadura se sentiu ameaçada e chegou a pensar em revogar a Lei da Anistia.

No cativeiro, Inês foi submetida a uma rotina de tortura física, como choques elétricos ou injeções de pentatol sódico, o “soro da verdade”, tortura psicológica, violência e humilhação.

“Era obrigada a limpar a cozinha nua, ouvindo gracejos e obscenidades”, contou em depoimento à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em 1979. “Um dos torturadores arrastou-me pelo chão, segurando pelos cabelos. Depois, tentou estrangular-me e só me largou quando perdi os sentidos. Esbofetearam-me e me deram pancadas na cabeça”.

O sofrimento de Inês não terminou com a soltura da prisão, em 1979. Em 11/09/2003, sua diarista a encontrou, caída e ensanguentada, em seu apartamento no bairro da Consolação, em São Paulo. O traumatismo craniano a deixou com sequelas na fala e nos movimentos. O caso nunca foi elucidado. Na delegacia, foi registrado como “acidente doméstico”.

Seis anos depois do misterioso “acidente doméstico”, Inês recebeu, durante cerimônia em Brasília, em 2009, um prêmio de , na categoria de Direito à Memória e à Verdade, das mãos do então presidente Luiz Inácio Lula da .

“Minha querida Inês, só queria lhe dizer uma coisa: valeu a pena cada gesto que vocês fizeram, cada choque que vocês tomaram, cada apertão que vocês tiveram”, declarou Lula. A cerimônia contou com um discurso emocionado de Dilma Rousseff, ex-companheira na VAR-Palmares e então ministra do governo.

Inês Etienne Romeu morreu na madrugada de 27 de abril de 2015, aos 72 anos, enquanto dormia em sua casa em Niterói, município vizinho ao Rio.

Atendendo a reiteradas demandas do movimento de direitos humanos, em janeiro de 2024, o município de Petrópolis, localizado na região serrana do do Rio de Janeiro, protocolou ação de desapropriação da “Casa da Morte”.

Fonte: Memorial da , com edições de Zezé Weiss. Capa: Divulgação/ Agencia O Globo/ Foto: Divulgação/ José Monteiro / Agência O Dia.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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