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O Brasil não vive sem Democracia

O Brasil não vive sem

O Brasil estava dando certo, retomando o desenvolvimento econômico, distribuindo , diminuindo a exclusão social, afirmando sua soberania externa, ganhando o respeito do mundo, com os brasileiros voltando a ter confiança no país e no seu futuro. Porque majoritariamente, através de democráticas, os brasileiros tinham escolhido o modelo de governo de desenvolvimento econômico com social. Por quatro vezes, em disputas transparentes, esse modelo foi vitorioso nas eleições.

Por Emir Sader

De repente o país passou a não dar certo. Porque a democracia foi rompida. A vontade majoritária dos brasileiros foi desrespeitada, se impôs um governo que passou a colocar em prática o programa econômico derrotado quatro vezes pelos brasileiros. A partir daí o Brasil voltou a trilhar o caminho de governos de minorias, que governam para minorias, o caminho do desencontro consigo mesmo, voltou a não dar certo. Porque só pode dar certo um país em que o governo representa a maioria da população e isso deixou de acontecer a partir da derrubada da Dilma.

O país passou a não dar certo quando passou a ter um governo que representava a minoria da população, quando passou a liquidar os direitos reconhecidos pelos governos eleitos pelo povo, quando passou a privatizar propriedades públicas garantidas pelos governos eleitos democraticamente. Quando se abandonou a externa soberana e se voltou a uma política de subserviência aos Estados Unidos. Quando os bancos públicos deixaram de ter um papel essencial no impulso ao crescimento econômico, à posta em prática das políticas sociais e aos créditos para a massa da população.

A prisão e condenação sem provas do Lula, que representa os sentimentos da maioria da população – ganharia as eleições no primeiro turno – consolidou o desvio dos destinos do país daquele que os brasileiros queriam. Forjaram um resultado eleitoral fraudulento e agora o país tem um presidente que não representa o Brasil, que envergonha o Brasil, que atua no governo como chefe de milícias e não como governante.

A ruptura da democracia e a forma como ela se deu impedem que o país dê certo, porque governa só para alguns, tem uma política econômica que favorece os bancos, promove a posse e o uso de armas pela população, prega a , a destruição da educação pública e das políticas sociais, o isolamento do Brasil no mundo. É um governo dessintonizado com os problemas que vivem os brasileiros, com o emprego, os salários, a miséria, o abandono.

Não lhe importa. Acha que recebeu um mandato para fazer o que quiser, se esquece da forma como triunfou, se esquece da facada, da mamadeira, da rejeição aos debates. Acha que pode fazer o que quiser, como se estivesse dirigindo uma milícia, como se não dependesse do consenso da maioria, do apoio de amplos setores da população.

Governar para um governo desse tipo é encontrar bodes expiatórios, inventar inimigos e combatê-los com ofensas e suas hordas. Governa para um país imaginário, enfrenta adversários imaginários, vive num mundo criado por ele. Enquanto essas ficções funcionarem na cabeça de uma parte da população, o governo se mantém, independente de que o país não funcione.

A direita descobre, de repente, que ele não sabe governar. Não votaram nele para governar, mas para impedir que o PT governasse. Não votaram nele achando que ele ia dar certo, isso estava em segundo plano. Para não perder o governo e ver seu modelo econômico ser substituído pelo seu oposto. Contanto que se mantivesse o modelo econômico neoliberal, entregaram o modelo nas mãos de uma milícia, incapaz de governar.

Isso é o que a direita tem a oferecer ao Brasil. Um governo desencontrado com o país. Que atua contra o que precisa a grande maioria da população. Que não agrega, que não une, que governa para seus adeptos incondicionais.

Esse Brasil já mostrou que não dá certo. A direita já se deu conta e não sabe o que fazer com o monstro que colocaram na presidência. Este acena com a reforma da Previdência quando sente muita hostilidade dos representantes da direita, empresários, mídia, porque sabe que é o que mais lhes interessa. Mas nem isso avança.

O país está ao deus dará. A economia estagnada, ninguém cuida do desemprego galopante, a violência se acentua com o armamento liberado, a imagem do país no exterior não poderia ser pior.

Só o retorno da democracia permitirá o país voltar a dar certo, porque só na democracia os governos são legítimos, representam a maioria da população, governam para todos. Neste regime híbrido, de exceção, o país fica entregue ao arbítrio, à violência, à instabilidade.

Emir SaderEmir Sader – Sociólogo.fitratelp

 


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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