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Os brancos se dizem inteligentes

Os brancos se dizem inteligentes

Os brancos se dizem inteligentes

Os brancos se dizem inteligentes. Não o somos menos. Nossos pensamentos se expandem em todas as direções e nossas palavras são antigas e muitas. Elas vêm de nossos antepassados…

Por Davi Kopenawa Yanomami

Porém, não precisamos, como os brancos, de peles de imagens para impedi-las de fugir da nossa mente. Não temos de desenhá-las, como eles fazem com as suas. Nem por isso elas irão desaparecer, porque elas ficam gravadas dentro de nós. Por isso a nossa memória é longa e forte.

O mesmo ocorre com as palavras do espírito xapiri, que também são muito antigas. Mas voltam a ser novas sempre que eles vêm de novo dançar para um jovem xamã, e assim tem sido há muito tempo, sem fim.

Nossos xamãs mais antigos nos dizem: “Agora é sua vez de responder ao chamado dos espíritos. Se pararem de fazê-lo, ficarão ignorantes. Perderão seu pensamento e por mais que tentem chamar a imagem de Teosi para arrancar seus filhos dos seres maléficos, não conseguirão”.

As palavras de Omama e as dos xapiri são as que prefiro. Essas são minhas de verdade. Nunca irei rejeitá-las. O pensamento dos brancos é outro. Sua memória é engenhosa, mas está enredada em palavras esfumaçadas e   obscuras. O caminho de sua mente costuma ser tortuoso e espinhoso. Eles não reconhecem de fato as coisas da floresta.

Só contemplam sem descanso as peles de papel em que desenharam suas próprias palavras. Se não seguirem seu traçado, seu pensamento perde o rumo. Enche-se de esquecimento e eles ficam muito ignorantes. Seus dizeres são diferentes dos nossos.

Nossos antepassados não possuíam peles de imagens e nelas não inscreveram leis. Suas únicas palavras eram as que pronunciavam suas bocas e eles não as desenhavam, de modo que elas jamais se distanciavam deles. Por isso os brancos as desconhecem desde sempre.

Eu não aprendi a pensar as coisas da floresta fixando os olhos em peles de papel. Vi-as de verdade, bebendo o sopro da vida de meus antigos com o pó de yãkoana que me deram. Foi desse modo que me transmitiram também o sopro dos espíritos que agora multiplicam minhas palavras e estendem meu pensamento em todas as direções.

Não sou um ancião e ainda sei pouco. Entretanto, para que minhas palavras sejam ouvidas longe da floresta, fiz com que fossem desenhadas na língua dos brancos. Talvez assim eles ao final as entendam e, depois deles, seus filhos, e mais tarde ainda, os filhos de seus filhos.

Desse modo, suas ideias a nosso respeito deixarão de ser tão sombrias e distorcidas e talvez até percam a vontade de nos destruir. Se isso ocorrer, os nossos não mais morrerão em silêncio, ignorados por todos, como jabutis escondidos no chão da floresta.

Davi Kopenawa – Líder, xamã, pajé e sábio Yanomami, em “A Queda do Céu – Palavras de um xamã Yanomami”, Companhia das Letras, 2010.

 

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