Pertencer para Proteger: Juventudes conectadas ao Cerrado
O verde da natureza, que ora se transforma em campo de futebol, ora em áreas de lazer e descanso, a água corrente que enche a piscina, se misturam com a vida, as cores, os costumes e as diversidades trazidas por mais de 100 jovens de povos originários e tradicionais e comunidades camponesas de todos os cantos do Cerrado. Para quê?
Por Rede Cerrado
Contar suas histórias, trocar experiências e tecer laços de força e luta por um Cerrado vivo e de pé. Foi de encher o peito de esperança. Ainda mais quando se vê jovens tão jovens, entre 14 a 20 anos, mostrando tanta força e consciência política.
O 1º Encontro Nacional das Juventudes do Cerrado, que aconteceu entre os dias 14 e 16 de dezembro em Hidrolândia, GO, reforçou o sentimento de pertença dessas/es jovens. Quanto mais conhecem e se conectam com a própria história, mais se empoderam em defesa das vidas, comunidades e tradições.
Um dos caminhos para que esse pertencimento aconteça é a aproximação das juventudes com os mais velhos. Se uma comunidade secular resiste até os dias atuais é porque alguém, antes, persistiu. É nos processos de escuta, trocas e aprendizados, principalmente com a ancestralidade, que as raízes são fortalecidas e se tornam mais profundas e resistentes.
Os desafios ainda são muitos. A permanência da/o jovem no campo talvez seja o principal deles. A dificuldade de acesso à educação e a fontes de geração de renda fazem com que muitas/os saiam de seus territórios para arriscar o início de uma vida adulta nas cidades. O problema é que, muitas vezes, as realidades desses centros não dialogam com a cultura e os modos de vida no campo.
Douglas*, 14 anos, um dos mais novos do encontro, disse que este foi o primeiro de que participou. Segundo Douglas, foi por incentivo de um professor e, se tiver outro, ele disse que volta sim! Isso porque quer permanecer na comunidade pesqueira onde mora, no interior de Mato Grosso do Sul. Acha a cidade muito confusa e tumultuada.
Sem saber ainda qual caminho seguir na universidade, lugar onde pretende estar no futuro, ele já lamenta o fato de ter de ir para a capital do estado, caso ele consiga. Ano que vem, ele ingressa no ensino médio e, como nos anos anteriores, permanecerá na escola da sua comunidade. Douglas viu que as escolas no campo do Brasil vêm sendo, sistematicamente, fechadas. E ele está preocupado com isso.
E o que as/os jovens do Cerrado querem?
Querem escolas no e do campo. Querem oportunidades de geração de renda em seus espaços de origem. Querem viver suas culturas e a liberdade de suas diversidades.
Nessa perspectiva, três experiências trazidas pelos próprios jovens mostraram que, apesar dos constantes desafios, é possível permanecer e pertencer à terra e ao território onde nasceram e criaram suas raízes.
Railson, do Piauí, lembrou que a educação precisa ser emancipatória e voltada para as realidades de cada povo. As escolas das cidades não dialogam com os modos de vida e costumes do campo. E isso pode tornar a vida do jovem do campo nas cidades muito difícil.
Cleyton e Natan, da Associação dos Agricultores e Agricultoras Afrodescendentes da Comunidade Tradicional de Capão Verde, em Mato Grosso, estão, aos poucos, assumindo o comando de uma agroindústria de beneficiamento de banana que teve início a partir da organização de um grupo de mulheres.
A mãe de Cleyton era uma delas e ele tinha apenas um ano de idade quando tudo começou. Hoje, ele e mais seis jovens tocam os negócios que ele diz não crescerem mais por falta de interesse das juventudes da comunidade em participar.
A Juventude da Teia, uma articulação de povos e comunidades tradicionais do Maranhão, trouxe, a partir do emaranhado de culturas e diversidades, a força que brota da união desses povos.
Foram dias de muita troca e aprendizados. Também de muitas danças, poesias, cores, sabores e formação. Muita força, empatia e gratidão! O 1º Encontro Nacional das Juventudes do Cerrado, promovido pela Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, também foi o primeiro passo dado para fortalecer e unir a ousadia jovem dos quatro cantos do Bioma em defesa de um Cerrado vivo e em pé.
Afinal, são elas e eles os responsáveis pela continuidade das tradições, dos conhecimentos e modos de vida que mantêm as águas, a fauna, os ecossistemas e os povos vivos no Cerrado brasileiro.
Para conferir a carta fi nal do encontro, acesse: www.redecerrado.org.br
A Rede Cerrado conta com o apoio do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF, na sigla em inglês para Critical Ecosystem Partnership Fund) e do DGM Brasil – Mecanismo de Apoio Dedicado a Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e Comunidades Tradicionais do Cerrado Brasileiro.
*Nome fictício para preservar a identidade da fonte. Publicado originalmente em: 18 de jan de 2019.