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RAIMUNDÃO

Raimundão: Um velho e sábio guardião da floresta

Raimundão: Um velho e sábio guardião da floresta

Um dia desses visitei a Reserva Extrativista Chico Mendes, para ver de perto uma experiência, digamos, “sustentável”, que o conhecido Raimundo Mendes Barros, o Raimundão, desenvolve por conta própria na Comunidade , no Seringal Floresta…

Por Elson Martins

Raimundão, primo de , teve participação destacada nas lutas históricas que os , , agricultores e índios empreenderam nos anos 1970 e 1980 para manter a floresta acreana em pé.

Hoje, desenvolve várias atividades na parte que lhe coube (sua colocação tem cerca de 600 hectares) da área conquistada pelo movimento revolucionário que emergiu no Acre a partir dos anos 1970. A reserva tem 960.750 hectares, abrangendo sete municípios: Assis , Brasileia, Epitaciolândia, Capixaba, Xapuri, Sena Madureira e Rio Branco.

O valente e desprendido seringueiro, já setentão, continua empenhado em provar o que o primo assassinado em 1988 sempre defendeu: é possível viver bem na (e da) floresta sem destruí-la. Além do látex que produz para a fábrica de preservativos de Xapuri, mantém um pequeno, mas produtivo roçado com mandioca, milho, feijão e banana; o plantio de seringueiras e outras espécies valorizadas de árvores; e muitas fruteiras em volta da casa.

Raimundão se dedica também a cuidar de animais que ganha de presente, de amigos, ou que apanha em suas caminhadas pela mata. Atualmente, mantém a Mariquinha, uma veada a quem trata de “menininha” ou “filhinha” quando quer apresentá-la aos visitantes, quatro Caititus (porquinhos do mato), dois macacos zog-zog e uma dezena de jabutis.

Esses bichinhos, após um curto período de cativeiro, ficam soltos e costumam fazer longos passeios pela floresta, mas voltam para o ambiente que os acolheu, onde recebem comida farta. A Mariquinha, por exemplo, passa de dois a três dias vadiando no seu habitat, mas sempre reaparece, não sem levar um pequeno esculacho do Raimundão, ou do outro Raimundo, seu filho, que é quem melhor cuida dessa original “criação”. E cuida com enternecedora intimidade.

Raimundo Filho é um notável exemplo da nova geração dos . Ele pretende cursar Direito na universidade, prometendo, entretanto, dar continuidade aos projetos do pai, no futuro.

Em casa já tem luz elétrica e computador, só falta a instalação do telecentro na comunidade (estão previstos 17 na Resex), que vai permitir a conexão gratuita (via Embratel) com a Internet. A ideia do Raimundão é atrair, com propósito conservacionista, mais animais para perto de casa. A técnica Edna Costa, da área ambiental do governo do Estado, esclarece que ele até pode ganhar dinheiro legal com essa atividade. No caso das espécies ameaçadas de extinção, só com o viés conservacionista.

A veada Mariquinha, por exemplo, somente poderia ser comercializada como matriz, para outros conservacionistas. Já o porquinho do mato (Caititu), pode. Raimundão até já dispõe de uma área adequada e nos convidou para vê-la. Fica junto a uma nascente com árvores enormes em volta, inclusive das espécies manitê, caxinguba e saveira, cujos frutos os porquinhos adoram.

No caminho encontramos alguns macacos zog-zog pendurados em galhos altos, que de algum modo integram a família do extrativista. Para comprovar isso, ele os chamou pelo nome e os bichinhos se aproximaram, nem tanto quanto ele gostaria, por causa das visitas. Ninguém duvide, porém, que esse seringueiro velho e sábio não acabe aproximando, mais do que possamos imaginar, homens e animais na floresta.

RESERVA EXTRATIVISTA CHICO MENDES

A Reserva Extrativista Chico Mendes é a maior do Estado, com área de 970.570 hectares, onde vivem cerca de 10 mil indivíduos. Abrange sete municípios, 46 seringais e 76 núcleos de base. Para viver na reserva, é preciso ter o perfil extrativista, ou seja, o morador e sua família devem assumir a responsabilidade de que não organizarão atividades predatórias e que suas vidas serão baseadas no extrativismo. Por ser uma reserva federal, a Resex é administrada e fiscalizada pelo Instituto Chico Mendes de (ICMBio), originado da divisão do Ibama, em 2007. Os extrativistas estão organizados em cinco Associações Concessionárias que, junto com o ICMBio, decidem que tipo de ações podem ser aplicadas dentro da reserva. No último levantamento, feito em 2009, foram contabilizados 2.156 alunos em 89 escolas, sendo 46,4% delas de gestão municipal. A reserva possui tanto o ensino fundamental quanto o médio, ofertado principalmente por meio do programa Asas da Florestania. Vários alunos que passaram por essas escolas da floresta já fazem curso técnico de nível médio ou superior no IFAC (Instituto Federal do Acre) e na UFAC (Universidade Federal do Acre), em Xapuri ou em Rio Branco.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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