Sobre Oferendas e Encruzilhadas: Os vários lados de uma mesma história
Nota do Doutor em História pela UnB, Leandro Bulhões
A bênção às mais velhas; a bênção aos mais velhos.
O texto que está circulando começa com “De acordo com o professor Leandro…”. Isso é perigoso porque alguém cita o meu nome, mas não fui eu quem o escreveu. Eu fiz uma fala pública e uma pessoa que me ouviu escreveu e publicou no Facebook um texto associando os meus argumentos a uma espécie de “história das origens das oferendas e da macumba”.
Em seguida, ela aponta outras coisas de tal modo que não é possível fazer uma separação entre um tema que foi discutido em minha fala e depois as suas considerações próprias a respeito do assunto. Na medida em que este texto viralizou, ficou parecendo que se tratava de um texto de minha autoria, mas não é o caso. Peço licença para explicar nestas próximas linhas o meu entendimento sobre o acontecido.
Na semana passada, eu participei de uma banca de defesa de trabalho de conclusão de curso na Universidade de Brasília. Na ocasião, houve uma discussão sobre como as encruzilhadas atuais das cidades modernas são espaços de sociabilidades e de resistências. Nos semáforos, homens, mulheres e crianças, expressivamente negros e negras, realizam trabalhos diários, conseguindo dinheiro por meio da venda de doces, água, panos de prato, frutas, entre outros produtos.
Na condição de historiador e avaliador do trabalho, provoquei o autor da pesquisa, chamando atenção para o fato de que muitas ruas e encruzilhadas das cidades do nosso país são espaços de memórias do nosso povo negro, pois são locais onde homens, mulheres e crianças negras fizeram negócios, venderam produtos e conquistaram níveis de autonomia, bem como conquistaram as suas liberdades, comprando-as, no período da escravidão.
A ideia era perceber que a existência majoritária dos corpos negros em situação de vulnerabilidades sociais nas esquinas das cidades brasileiras, lutando diariamente por sobrevivência, é desdobramento do período colonial e do racismo brasileiro e não são apenas um fenômeno da modernização das cidades com seus semáforos e sinaleiras.
Entretanto, além de serem espaços onde negócios aconteciam e acontecem, as encruzilhadas são domínios das entidades das ruas, dos caminhos e da comunicação, como Exus e Pombagiras. As encruzilhadas são, portanto, espaços especiais de cultos que possuem significados específicos para as pessoas que fazem parte das religiões afro-brasileiras. Interessava-me, com este argumento, trazer referências dos conhecimentos africanos e afro-brasileiros ao trabalho do estudante.
Foi neste momento da minha fala que enfatizei que as oferendas nas encruzilhadas PODEM também se configurar como uma importante estratégia de proteção às pessoas em situação de rua, ou que no passado estavam em situação de fuga, uma vez que não é novidade entre as pessoas dos candomblés, dizer que as pessoas nas ruas comem os alimentos que estão nos despachos. É comum encontrar nas oferendas elementos como frango, ovos, farofa, frutas, cachaça, velas, dinheiro. Vale salientar que o universo dos despachos e oferendas é complexo e não são reduzidos às práticas nas ruas.
Historicamente falando, não é difícil vincular a circulação destes alimentos ritualísticos nas cidades brasileiras às várias estratégias emancipatórias e de proteção criadas pelos povos negros, sobretudo diante das experiências da colonização, com as marcas do abandono social, que gerou marginalidades e fome nas ruas para estes povos.
No entanto, ainda que algumas pessoas tenham feito uso deste possível mecanismo de enfretamento das fomes, como eu falei, estas experiências NÃO SÃO A BASE DA ORIGEM DAS INÚMERAS OFERENDAS DOS CANDOMBLÉS NEM DO “SURGIMENTO DA MACUMBA”. Esta teoria é falsa e levar essa ideia adiante seria o mesmo que dizer que em uma situação hipotética onde não houvesse negros e negras em situação de vulnerabilidades no passado em nosso país, teria cessado a prática que os povos africanos trouxeram do continente de realizar suas oferendas. Eu não acredito nisso.
Ora, imaginar que um irmão ou irmã negra daria jeito para alimentar outros irmãos e irmãs em situação de rua, seja nos tempos da escravidão ou nos anos difíceis do pós-abolição, fazendo uso de comidas, cachaças e sinalizando comidas com velas em lugares estratégicos com as encruzilhadas, não é difícil de se pensar.
Mas tais práticas se configurariam como experiências particulares ou ainda como ressignificações dos usos das oferendas que já existiam antes, desde as Áfricas, nos cultos aos voduns, nkices e orixás e não explicam o surgimentos dos candomblés nem das inúmeras modalidades de rituais de oferendas.
De fato, em sala de aula, também já enfatizei e enfatizo as estratégias de sobrevivências e de solidariedades que são fundamentais para a resistência do povo negro e já explorei as potencialidades da imagem da circulação de alimentos num contexto urbano, como é o caso de algumas oferendas constituídas por comidas e bebidas.
Um dos principais problemas das ideias que estão no texto que viralizou e que não é da minha autoria é que ele não aponta a dimensão dos conhecimentos, ciências, cosmovisões, projetos de sociedade que os povos africanos trouxeram para o Brasil no tráfico atlântico e dá a entender que os candomblés só podem ser compreendidos no “antes e depois” da escravatura. Isso não poderia ser verdade.
Sobre a viralização deste texto, penso que o fato de ter sido citado que “um historiador da UnB disse…” deve ter tido um peso grande na credibilidade da circulação do mesmo. Há um vício antigo de pensar que historiadores são “os donos da verdade” e profissionais capazes de explicar as origens das coisas.
Pergunto-me, portanto: por quais motivos este tema passou a interessar a tantas pessoas?
As irmãs e os irmãos de candomblé que me procuraram ontem e hoje, perguntaram se o conteúdo do texto era meu e ficaram muito preocupados com a dimensão da circulação das ideias, pelos motivos já aqui expostos. E, portanto, agradeço pelo cuidado em terem me mantido informado sobre como o meu nome estava circulando no Facebook nos últimos dois dias, já que não estou nesta rede social, além de estar fora de Brasília, trabalhando em viagem de campo.
Esta dimensão de proteção e cuidado de nós negros e negras com nossos irmãos e irmãos negros é a base da explicação sobre porquê ainda hoje existimos enquanto comunidade, ainda que o projeto colonial do passado, com suas heranças no presente, tenha nos educado para nos destruirmos.
A parte positiva da circulação do texto que escreveram é que foi colocado em pauta a discussão acerca das redes de solidariedades e as práticas de cuidado e amor dos nossos antepassados com os seus irmãos e irmãs negras. Isso também não é novidade para nós! Mas é para muita gente.
Então, para as pessoas que estão impressionadas com a história das comidas, cachaças e velas, saibam que definitivamente não é esse movimento isolado que pode explicar o surgimento nem os fundamentos das complexas oferendas nem dos candomblés. Saibam ainda que os nossos antepassados não só encontraram estratégias para comer e dar de comer aos seus irmãos e irmãs, como construíram inúmeros mecanismos de proteção à escravização de seus corpos no próprio continente africano, fizeram revoltas nos navios negreiros, quebraram engenhos onde realizavam trabalhos forçados, fugiram do cárcere, elaboraram e praticaram projetos de revolução social, criaram e mantiveram quilombos e terreiros de candomblés.
Sem discutir solidariedades, redes de proteção e afetividades é impossível compreender a abolição da escravatura e a permanente luta dos movimentos sociais negros dos séculos XX e XXI. Sem discutir as capacidades de autonomia, autogestão e negação do projeto colonial jamais vamos compreender que os povos africanos que para cá vieram numa migração forçada não foram apenas força de trabalho, como está inscrito na memória nacional.
Os negros e as negras que vieram antes de nós, juntamente com os povos originários desta terra, os chamados indígenas, civilizaram este país e jamais vamos compreender a nossa história e as nossas identidades sem conhecermos este patrimônio que nos pertence e que a experiência colonial capitaneada pelos brancos tentou nos tirar.
Quando falei publicamente da importância das encruzilhadas quis exatamente chamar a atenção para as formas com as quais estes espaços possuem outras lógicas para o povo de santo, sobretudo no que diz respeito a conhecimentos que estão na oralidade e que a universidade não sabe.
Repito que quem tem o mínimo de conhecimento sobre as religiões de matrizes africanas sabe que relacionar escravidão, fome, oferendas e surgimento dos candomblés não faz o menor sentido. E por isso, muita gente está revoltada com a circulação da referida teoria. Este fenômeno pode revelar também que os povos de santo e o povo negro, de um modo geral, possuem uma memória de contestação das ideias que são elaboradas e defendidas em espaços majoritariamente brancos e elitistas como foram e ainda são as universidades brasileiras.
Muita gente de candomblé, mas não apenas, se enfureceu com o fato de que supostamente um “professor da UnB” teria dito algo sobre o “surgimento” dos cultos de matrizes afro-brasileiras. Ora, certamente muita gente questionou: “quem o professor pensa que é para falar sobre os nossos conhecimentos, mistérios e ciências? Quem ele pensa que é para falar por nós, povos de santo?”.
De fato, passou-se o tempo em que intelectuais podiam carregar as supostas verdades sobre as coisas do mundo. Isso levanta uma questão muito importante que a nossa geração de professores e professoras, pesquisadoras e pesquisadores negros (bem como os e as integrantes de movimentos sociais) temos debatido e denunciado nos espaços acadêmicos: nós não aceitamos mais que os discursos ditos científicos digam o que somos sem a nossa participação ativa.
Claro que isso não impede que pesquisas e trabalhos, etc, sejam realizados, mas desde a conquista das cotas raciais nas universidades brasileiras que há uma expectativa relacionada a recente entrada de estudantes e professores negros e negras, dos quais me incluo, em transformar urgentemente as metodologias e abordagens que os e as cientistas historicamente utilizaram. Afinal, se antes, nós negros e negras éramos os chamados “objetos” de pesquisa, hoje estamos nas salas de aula e laboratórios na condição de pesquisadoras, pesquisadores e cientistas.
Mas ainda somos muito poucos nesta condição (Eu, inclusive, sou professor substituto na Universidade de Brasília. Meu contrato vence este mês de junho). Aliás, qual a porcentagem de docentes negras e negros nas universidades públicas e privadas, estaduais e federais em nosso país podendo falar sobre a história do próprio povo negro, entre outros temas? E professores e professoras indígenas?
O texto que viralizou não traz o meu nome completo e sei que muitas pessoas se referiram a este post associando a imagem do doutor ao branco, não supondo sequer que o “professor Leandro da UnB” poderia ser um homem negro engajado em difundir respeitosamente os conhecimentos ligados às tradições brasileiras de matrizes africanas.
É preciso ressaltar que a falta de conhecimentos que o povo brasileiro tem sobre as religiões de matrizes africanas não é um acidente. É parte do racismo estrutural que demonizou e demoniza, perseguiu e persegue as pessoas que fazem parte destas religiões. São permanências de um Brasil do passado que criminalizou os batuques, a capoeira, os candomblés.
Trata-se de desconhecimentos estratégicos que negam as nossas capacidades de pensamento, agência de nossas próprias vidas e soberania intelectual e que trazem à tona a necessidade da Lei 10.639 que em 2003 instaurou a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura africana e afro-brasileira nas escolas do nosso país.
Ainda assim, mesmo depois de 14 anos de promulgação desta Lei, o que sabemos sobre as sociedades africanas, especialmente sobre os povos que vieram para o Brasil no tráfico atlântico? O que sabemos sobre a história e a memória das trajetórias dos nossos antepassados negros e sobre os cultos dos orixás, nkises e voduns?
As escolas e as universidades estão cumprindo o seu papel no enfrentamento ao racismo e na formação de gente qualificada para lidar com as questões como o racismo religioso? Ora, não é difícil encontrar pessoas que dizem que as oferendas são “coisas do diabo”, nem é difícil encontrarmos irmãos e irmãs negros que já sofreram com o racismo quando tentaram exercer sua fé afro-brasileira. Brasília, por exemplo, nos últimos anos, teve uma série de casos de terreiros de candomblés violentados.
Chego ao fim deste texto, pedindo imensas desculpas, em especial ao povo de santo e aos povos negros deste país, por todo este mal entendido. Sabemos o quanto que áreas como a História foram responsáveis na construção de teorias equivocadas sobre as memórias dos nossos antepassados. Mas a História pode ser também o espaço das releituras do passado, dos novos questionamentos e da elaboração e resinificação dos sentidos.
Quando falamos, não temos controle sobre como nossas ideias podem ser interpretadas. Ontem, uma amiga que está em São Paulo me ligou preocupada porque disseram a ela que estava havendo uma confusão com o meu nome porque teriam me visto fazendo despachos na UnB e que isso tinha virado um escândalo. Eu já recebi diferentes versões do texto que está circulando e parece que já tem diferentes autorias.
Amigos enviaram-me alguns posts de pessoas negras (que se diziam candomblecistas, de outras religiões ou sem religiões) que pareciam encantadas com a história que circulou. O que será que estas pessoas pensam sobre afetividades, solidariedades e quilombismo do nosso povo? O que será que sabem sobre os candomblés?
Fiquei pensando: o que será que a minha mãe que está na Bahia e que é negra, sabe sobre os candomblés? E meu pai que morreu e que era branco, que ele sabia sobre tudo isso? Eu também estou aprendendo. Mas sei que quando passei a frequentar alguns terreiros de candomblé, ainda quando eu estava na minha cidade da Bahia, mainha ficou muito preocupada e demorou para compreender que eu e, posteriormente, o meu irmão caçula estávamos nos aproximando do universo das religiões de matrizes africanas. Ela achava que poderia estar perdendo seus filhos para alguma coisa ruim.
É muito triste pensar que as nossas ancestralidades permanecem potencialmente negativadas, inclusive entre nós, povo negro. O racismo promoveu e ainda promove muita desinformação e isso afeta a todos nós.
Desta experiência ficaram alguns aprendizados. Entre eles, que os ensinamentos são constantes e que seguimos aprendendo sobre as histórias do nosso povo, tão mal contadas.
Palavra é encruzilhada.
Leandro Bulhões – Doutor em História – Universidade de Brasília
NOTA DA XAPURI
Encontramos, na manhã do 13 de junho, na timeline de um jornalista e militante dos direitos humanos, no Facebook,um post sobre o papel das oferendas como instrumento de solidariedade entre povos escravizados em busca da liberdade. Recebemos, também, o mesmo texto de outras fontes, via zap. Como o assunto nos pareceu importante ante nosso compromisso para com o fortalecimento da consciência negra em nosso país, optamos por publicá-lo, com a seguinte nota:
Este texto foi originalmente extraído da página de Pedro César Batista , poeta, escritor, jornalista e bacharel em direito no Facebook. Estamos tentando localizar o professor Leandro, a quem foi atribuída a autoria desta pesquisa, para confirmar os dados e aprofundar a matéria. Caso alguém tenha mais informação sobre este assunto, por favor entrar em contato conosco por meio do email: contato@xapuri.info
Desde então, continuamos tentando localizar o professor Leandro. Por meio de amigos comuns, nós o encontramos na noite do dia 15. Soubemos, em nossa conversa via zap, que o texto não era dele, e que estava preparando uma nota sobre o assunto, que nos chegou no final da manhã de hoje, 16 de junho. Acima, está a nota, publicada na íntegra, com nosso profundo pedido de desculpas ao professor Leandro Bulhões, e a você que nos leu ou lê, pela reprodução de uma informação tão relevante sem antes localizar seu autor ou autora, ou conseguir falar com o autor citado.
NOTA ATRIBUÍDA À AUTORA DO TEXTO QUE VIRALIZOU
No dia 16 de junho, recebemos, via zap, esta nota, atribuída à autora do texto original, Susana Xavier. Além de repassá-lo ao professor Leandro Bulhões, por uma questão de clareza e respeito a quem se deu o trabalho de esclarecer os fatos, a reproduzimos aqui.
“Queridxs,
Primeiro, quero pedir desculpas pelo mal entendido no texto escrito por mim e viralizado na internet. Dirijo as desculpas, principalmente, ao professor Leandro Bulhões, que ficou pressionado por toda a repercussão, e ao povo de terreiro de todas as religiões de matriz africana que, com razão, fez várias críticas ao texto.
Então, vamos escurecer as coisas:
1. A citação do nome do professor se dá em respeito ao próprio, pois eu não poderia me apropriar de uma construção, relato contido no primeiro parágrafo do texto, pois não me pertence.
2. A partir do trecho “…as velas eram postas…” até a conclusão final sobre a origem da macumba, é única e exclusivamente minha, porque acredito que aqui no Brasil, o conceito de “macumba” surgiu como algo demoníaco, e isto se deu neste espaço de colonização, porém não estou me referindo a toda espiritualidade negra, que obviamente, antecede a escravidão, e afinal não tenho conhecimento pra deliberadamente interpor algo sobre isso, mas não posso deixar de dizer que essa palavra, desde muito tempo, é usada para estigmatizar as religiões afro e reforçar os preconceitos contra o povo negro.
3. No mais, todo o restante é minha interpretação e é aí que entra o sujeito com suas vivências, experiências e valores tentando desmistificar a demonização dos cultos de matriz africana, pelo qual tenho imenso respeito, embora não seja praticante.
Ao publicar essa interpretação jamais pensei que ela teria o alcance que obteve, mas observei, que apesar de alguns pensadores e praticantes das religiões afro terem questionado o texto, ele seria capaz de desconstruir preconceitos e discriminações arraigados em nossa sociedade.
Ressalto, que me preocupa o fato da sociedade aceitar como natural um rapaz negro sofrer pena de tortura e virar meme nas redes sociais sem grandes questionamentos. Me preocupa o genocídio da negritude jovem. Me preocupa uma adolescente ser apedrejada por usar a túnica do seu culto e me preocupa o aumento dos índices de homicídios da mulher negra após a instalação da Lei Maria da Penha.
O texto apesar de conter falhas “graves”, em sua contextualização, trouxe para o debate um tema que é tratado na clandestinidade, por isso, gostaria muito que servisse como incentivo à pesquisas de modo que nos expliquem a verdade sobre nossas raízes, já que toda a história foi higienizada pela branquitude.
Expliquem como se deu e se dá a exploração, a tortura e a eliminação do negro, conscientizem e nos empoderem com conhecimentos para que possamos fazer com propriedade a nossa defesa.
Novamente esclareço que o professor Leandro Bulhões, estudioso da história africana, uma pessoa que tem meu respeito e admiração não tem responsabilidade pelas minhas interpretações e criações neste espaço.”
Susana Xavier
TEXTO INICIAL, VIRALIZADO
Depois da da nota do professor Leandro Bulhões e do surgimento de uma autoria para o texto viralizado, nós optamos por mantê-lo, apenas como registro da dinâmica desta história, e não como endosso ao seu conteúdo:
“De acordo com o professor Leandro (historiador da UnB) as oferendas deixadas nas encruzilhadas era uma forma dos negros alimentarem seus irmãos escravos que estavam fugindo dos feitores. Os pretos escolhiam lugares estratégicos por onde escravos fugitivos passariam e colocavam comida pesada; carne, frango e farofa porque sabiam da fome e dos vários dias sem comer desses indivíduos e deixavam também uma boa cachaça pra aliviar as dores do corpo e dar-lhes algum prazer na luta cotidiana.
As velas eram postas em volta dos alimentos pra que animais não se aproximassem e consumissem o que estava reservado para o irmão em fuga e aí surge o que todos conhecem como macumba. O rito permanece sendo realizado pelas religiões afro como forma de agradecimento e pedidos aos seus ancestrais e em homenagem a seus santos. A cultura branca e eurocêntrica foi quem desvirtou a prática, para causar medo, terror e abominação e reforçar os preconceitos e discriminações contra os negros.
Não tenho religião e não pratico nenhum culto mas gosto de saber que já houve tanta solidariedade no mundo e que as pessoas se preocupavam muito umas com as outras a ponto de fazerem um esforço pra alimentarem alguém mesmo sem conhecerem o seu rosto. Hoje vejo tanta gente em igrejas e igrejas em tantos lugares servindo apenas como instrumento de manipulação e exploração da fé alheia para manutenção do poder. Enfim nós não evoluímos.”
Ilustrações desta matéria, incluindo capa – quadros do pintor indígena Jaider Esbell Macuxi, vencedor do Prêmio Pipa 2016.