UM CIDADÃO UNIVERSAL

UM CIDADÃO UNIVERSAL

UM CIDADÃO UNIVERSAL

Resumo em uma frase o que tenho a dizer sobre este meu grande amigo: Athos Pereira. Pra mim, era a reserva moral da política brasileira.

Dumar Prado

Athos estará sempre presente na nossa luta pela democracia e no nosso compromisso com a organização dos trabalhadores e das trabalhadoras. Sua história será semente na luta que continuamos por uma sociedade justa e fraterna. 

 Rubens Otoni 

Para compreender a dimensão humana e intelectual de Athos Pereira é preciso perceber a importância e a trajetória de sua família composta por oito irmãos, criados em Porto Nacional.

Ainda muito jovens, foram perseguidos pela ditadura implantada em 1964. A coragem e a dignidade com que esses irmãos enfrentaram a prisão, o exílio e a tortura provam que suas convicções em defesa do ser humano eram extremamente profundas. 

A luta pela redemocratização do país, pela construção de uma sociedade justa e pela busca de caminhos para uma vida plena para todos os brasileiros norteou praticamente toda a família.

Athos começou sua militância política com cerca de 20 anos de idade, tendo militado clandestinamente na ALN. Em pouco tempo foi preso, e decidiu ir para o exílio no Chile. O mesmo caminho seguiu sua irmã Dagmar. E o sangrento golpe de Pinochet os alcançou em território chileno. De lá foram, Athos e Dagmar, para o México e depois para a Bélgica. Com a anistia, retornaram para o Brasil em 1979.

Athos, desde os bancos escolares em Porto Nacional, foi um aluno que se destacava. E assim, foi por toda sua vida. Tendo passado em dois vestibulares para cursos diferentes, não concluiu sua formação superior. Mas ele foi muito além: tornou-se um portentoso intelectual, capaz de elaborar e aprofundar temas dos mais complexos.

Por onde passou, fez amigos e colecionou admiradores. Era capaz de

remar contra a corrente, argumentar e convencer. Tinha uma escrita limpa e direta, que às vezes ele resumia com marcantes frases-síntese. 

Um exemplo disso foi uma tese que escrevemos, Athos e Toffoli (atual Ministro do STF) na condição de assessores qualificados da nossa bancada do PT e eu já deputado federal. Fazíamos uma análise da situação do Brasil e disputávamos rumos do PT. 

E foram dele, as duas frases que marcaram aquela Tese: “a direção do PT tem o dever da imparcialidade” – sem animosidade, era uma crítica e uma cobrança pública. E quando analisamos a trajetória do PT, escrevemos sobre as

 mudanças no Brasil e no mundo e sobre o PT. E ele sintetizou: “o PT muda de posição, mas não muda de lado”, o que foi a compreensão de não nos aferrarmos em posições imutáveis, mas sem abandonar nossas mais profundas convicções.  

Por décadas, foi coordenador da assessoria da bancada do PT na Câmara dos Deputados.  Athos era ao mesmo tempo o maestro de uma excelente equipe e o apoio solidário para o que fosse necessário. E, para os deputados, era uma fonte confiável e permanente. Não havia nenhuma trava para se exercitar divergência.

Sua impressionante memória, a capacidade de selecionar o mais importante, suas anotações ao longo do tempo, o transformaram num observador atento e num exímio pensador. Sua vasta cultura, adquirida pela leitura diversificada dos clássicos da filosofia, da literatura, da política, pelo interesse pela música etc., não o afastou da análise do cotidiano, das pessoas, da vida real. E nessa combinação, muitas vezes se divertia falando de sua terra e de seus personagens, de que Athos se nutria com a melhor seiva.

E tudo isso com a maior modéstia, não precisava de títulos de nenhuma natureza, quem o conhecia em pouco tempo iria perceber seu imenso valor!

Athos, na sua fase derradeira, resistiu o quanto pôde, sabia da grave situação. Mostrou sua vontade e orientou que deveria retornar a sua “aldeia”. E assim foi feito, de acordo com a sua vontade: com a presença da família, dos inúmeros amigos (antigos e recentes), sua morada eterna será no Rio Tocantins, que passa vizinho de sua casa, em Porto Nacional.  

Arlindo Chinaglia

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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