Um macaquinho me contou…

Um macaquinho me contou…

Um macaquinho  muito bonito, morador de uma serra mais bonita ainda, estes dias, meio desconfiado me contou que não confiava nos homens. Eu quis fazer a defesa da espécie humana, mas por fim preferi escutar. E ele dizia que tinha perguntado ao seu pai sobre o ser humano, o pai tinha ficado nervoso e a conversa foi assim:

– Papai, o que são humanos?

– Meu filho, cuidado com esse bichos. São macacos sem cabelos. Pensam que são donos de tudo ao redor. Constroem cavernas de pedra que chegam ao céu. Seu ego, sua condição, não tem limites. Tomam mais terras do que eles precisam, destroem a floresta, sujam os mares, poluem o ar.

O pequeno pedia para o papai parar de falar no humano:

– Para papai, que tô com medo, vou chorar!

O papai bem paciente dizia:

– Espera, tem mais. Humanos escravizam humanos e deixam parte da manada morrer de fome para que poucos sejam mais ricos. Eles constroem máquinas para matar os próprios humanos. Mais cedo ou mais tarde eles se exterminarão. Os humanos são uns macacos loucos, meu filho! Fuja deles.

Quando vi, o macaquinho enxugava minhas lágrimas e me consolava: – Ah, neim Tieda! Não vá acreditar em tudo que o papai diz. Ele é muito exagerado.

Dei um beijo demorado no mocinho e segui estrada, atrás de mim deixe a reservada, em devida parcimônia, a Linda Serra dos Topázios, que se tornara toda alarajanda com os últimos raios do sol. Mais um dia terminara no meu cerrado e ele, ainda, estava de pé. Sequei novamente os olhos, cocei a poeira com a mão em croque, enchi o peito de ar, bati p ´´e bem forte no chão, como faz o caboclo Jupiara, alinhei o horizonte e falei comigo mesmo: – Vambora, há muito o que fazer!

Iêda Vilas Bôas

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HORA DE VESTIR A CAMISA DO LULA

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação. 

Resolvemos fundar o nosso.  Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário.

Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta).

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir.

Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/a pessoalmente (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Outras 19 edições e cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você queria, Jaiminho, carcamos porva e,  enfim, chegamos à nossa edição número 100. Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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