Teoria do deslocamento do eixo circunstancial e a dualidade intra-humana

Teoria do deslocamento do eixo circunstancial e a dualidade intra-humana

Teoria do deslocamento do eixo circunstancial e a dualidade intra-humana

Por Marconi Burum

Ocorreu-me um pensamento. O ser humano. Sempre se apossa de uma vontade de . Desejos, sonhos, ideias, teses, projetos, ao rigor do oportuno em cada instância das vontades. Todavia, o processo de concentração, aliás, de realização, não é necessariamente congruente com horizonte fático do que se galga. Há tantas (na maioria das) vezes um entorpecimento, ou uma dispersão, ou ainda, um enviesamento (ou “des”-priorização) do desejo motriz, o que o aparta da necessária conclusão no lócus do espaço-tempo pretendido. A isso chamarei de teoria do deslocamento do eixo circunstancial – humano.

Para melhor elucidar a questão, vamos pensar em fato comparado. Adiante, um jovem cheio de energias voluptuosas próprias da idade, se vê diante de um singelo dilema espiritual. Está no cenário fático de retiro para meditação. Pede em clamor às entidades espirituais que lhe são cultuadas, as bênçãos e forças para se reportar à prioridade da transcendência. Quer muito um além-vida que valha tudo mais. Contudo,
mais adiante dele, sentada está uma jovem, bela, terna, sensível e sensual, que o atrai abruptamente a concentração.

No evento discursivo metafísico, o deus de seus anseios existenciais. No ato da realidade sensível, a jovem, e suas silhuetas intrigantemente sedutoras. No caso em tela, o que temos de fato? Marcadamente, uma dispersão circunstancial crítica, portanto, o deslocamento do eixo desejável numa ordem, ao mesmo tempo lógica, cronológica e sensacional. O jovem se perde sensivelmente das duas acepções, tendo, por oportuno, a incapacidade de opção central. Destarte, haverá que reiniciar os processos de invenção dos desejos. Porém, o conflito. Ele é evidente.

Não haveria qualquer problema para a existência, não fosse o deslocamento do eixo desconcentrar os elementos que se circundam na prioridade das coisas de um ser. Isto é, ao homem é dada uma sensorial existência para acervos práticos no lócus da realidade. Nasce-se, cresce-se, emociona-se, estuda-se, trabalha-se, experimenta-se, contrai-se matrimônio com múltiplas tipologias de prazer e/ou devoção, brinca-se, enerva-se, ri-se, segue-se acumulando e morre-se.

Em cada ato, ou etapa para esses micro conjuntos que denotam a existência humana, temos exercícios e compromissos que se engendram na pactuação com a vida. É como um acordo prévio para cada cena, premiada por sua vez pela capacidade humana de atingir metas de evolução ou de vencimento dos desafios postos para cada etapa. Trata-se de concentração no presente realizável. Conquista mais evolução e implementação quem melhor vencer etapas.

Ora, por oposição semântica, vencer etapas significa derrotar contrastes. E é neste intento que reside uma entidade abstrata que insistentemente desloca nosso eixo de concentração, ou expõe-nos variados cardápios circunstanciais.

Portanto, depreende-se deste aludir que há um vácuo permanente. É como um limbo invisível que leva uma dupla entidade do homem ao traslado constante por múltiplas dimensões não-reais, todavia, imagináveis. Isto é, o ser humano é dual na integralidade dos interstícios, sendo que uma das entidades humanas se regozija de um lado, enquanto a outra opera os sistemas cognitivos do outro, e por raras vezes as duas entidades se encontram na concentração de uma mesma meta resultante de êxito para
ambas as entidades e para o cerne da justificada existência.

Trata-se, portanto, de re-conhecer a metodologia do alheio que há em nós, essa dispersão de desejos sincrônicos. Exercitar colisões das e nas entidades. Criar métodos de contra-fluxo cuja estratégia seja o equilíbrio no eixo destas duas entidades intra- humanas. Ou seja: viver exitosamente significa, por esta hipótese, equacionar os desejos num eixo fático e metafático de tal grandeza que seja possível aos elementos (energias circundantes, físicas, metafísicas e naturais) se fundirem no ponto de convergência e,
portanto, capazes de lançar à existência o ato realizável de sucesso, aos moldes que realmente tangenciavam a centralidade de escolha do ente principal.

Doravante, não se relaciona a proposta do à penitência das questões. Todavia, o inquietante, prazeroso e ousado desafio de desvendar a tática na coexistência das duas entidades para colisões de objetivos comuns. Isto posto, é sinergia reveladora da vida; é harmonia sistêmica da existência; é alento físico-mental, emocional- extranatural; é satisfação do feito, cadenciadamente revivido até o fim possível da vida.

Ou por síntese óbvia, a saber, o que chamam convencionalmente por felicidade. Destarte, compreender as nuances do deslocamento do eixo circunstancial e a dualidade intra-humana é tentar ser feliz, ou ao menos viver em paz!

…………………………….
Nota 1: Veja que não me refiro vulgarmente a escolhas temporais. Não se trata da opção “A”: estudar para a prova do vestibular, e/ou opção “B”: ir a um churrasco na casa de um amigo. São perspectivas atemporais. Estão justapostas no ventre da concentração de desejos realizáveis, à força que maior intensidade se aplique.

Nota 2: O que chamo de “sensacional” no desdobramento possível da ordem dentro do eixo, é o caráter subjetivo inerente ao processo. Ora, a existência pressupõe, grosso modo, uma ordem lógica e uma ordem cronológica. Entretanto, ao humano é denotado uma subjetividade dinâmica que alterna ou altera essa ordem e mexe com os pressupostos, portanto, uma ordem sensacional, em seus conteúdos polissêmicos.

Nota 3: Fico pensando se o ato de do humano não se trata de um exemplo de translado, ou desvio padrão junto ao eixo circunstancial. Senão, vejamos. O homem anda normalmente em seu dia. Faz planos. Almoça. Dorme. De repente rompe-se a rotina com um desejo abrupto de realizar um mal (ainda que esteja caminhante simultaneamente no eixo da concentração anterior: a vida como ela o foi trabalhada). Parece-me o agir da entidade 2 do humano original. Não falo de “espírito”. Refiro-me à
dupla humana. Também não troco conceitos de “ x Instinto”. Talho-me a analisar o sensacional intrínseco ao homem que o desloca por dentro de si, seus atos, seus planos com potência à produção de fatos circundantes, ou inércia atitudinal.

Nota 4: Peço a gentileza, Leitor, que mudemos o vocábulo “teoria” contido no título deste para “hipótese”. Creio que o texto melhor represente uma hipótese que pode, por exercícios nossos (caso seja pertinente), testar o conteúdo analítico acima inquietado. Pensemos se isso faz mesmo algum sentido


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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