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Um ano sem Marielle

Um ano sem Marielle: seu legado para o Brasil esmaga seus assassinos

​Os passos de ecoam pelo e no exterior um ano após a execução da vereadora carioca.

E, se depender de uma parcela de políticos, seus ideais não só serão mantidos vivos, mas ampliados.

Eles clamam também por justiça e pela elucidação do bárbaro crime político que chocou o país e o mundo.

Lideranças do PSOL, partido de Marielle, classificam o assassinato como um atentado à democracia brasileira.

Executada em 14 de março de 2018, no centro do Rio de Janeiro, e com processo criminal sem apontar mandantes, apenas executores, as lutas da ex-vereadora que se limitavam aos domínios da capital carioca se expandiram Brasil afora e ultrapassaram fronteiras.

Às suas bandeiras foram acrescidas a cobrança pela impunidade do bárbaro crime e por justiça por quem defendia até policiais que atuavam na da Maré, seu espaço de origem e de atuação.

A professora de Ciência Política da UnB, Flávia Birole, aponta a gravidade do crime em relação ao momento vivido pelo Brasil.

“Precisamos entender a execução de uma pessoa eleita, que representava a inclusão de favelas e periferias em espaços públicos, como um atentado à política brasileira. Faz parte de um processo mais amplo para enfraquecer a democracia”, diz.

 
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Marielle Franco

“Marielle era jovem, mulher, negra e da periferia. Defendia direitos de uma população excluída da política nacional, que tem dificuldades de chegar aos espaços públicos. Era uma mulher que tinha um potencial político e contribuiu para melhorar os baixos índices de representatividade feminina nos parlamentos. Esse crime é uma política contra a mulher”.

Amiga e colega de Marielle, eleita vereadora em Niterói e que agora chegou à Câmara dos Deputados, Talíria Petrone (PSOL-RJ) tem avaliação semelhante à da professora da UnB.

“A execução da Marielle é a expressão maior do retrocesso democrático que a gente está vivendo no Brasil. Penso que a democracia brasileira é jovem, incompleta e não tinha chegado plenamente para territórios de favelas, de periferias. O fato é que uma vereadora eleita, de uma cidade importante foi assassinada, com possível envolvimento da milícia, da máfia, do poder econômico. Isso só pode ser um resultado de que a democracia vai mal, ainda mais quando depois de um ano a gente ainda não tem notícias do que aconteceu com nossa companheira”.

Estudos realizados nos últimos cinco anos apontam que quanto maior a participação da mulher mais aumenta a violência, segundo Flávia Birole, porque elas começam a interferir diretamente nesses domínios simbólicos e de recursos da política.

Em sua opinião, as mulheres têm desafiado a ideia de quem fala sobre elas: existe uma mudança significativa nesse sentido que provoca uma reação ao deslocamento da situação das mulheres.

A inserção feminina na esfera pública faz parte de um contexto de transformações sociais.

“O impacto sobre esse crime foi extremo e acirrou os movimentos que consequentemente pode significar um aumento da violência política. A percepção de tamanha brutalidade, eliminar uma pessoa porque suas posições desagradavam a um grupo, despertou uma sensibilidade maior e potencializa a política que Marielle defendia e representava”.

A deputada Talíria acredita que o incômodo gerado pela inserção das mulheres, que leva até a atos extremos, é porque a política carrega duas esferas que são negadas historicamente à mulher que é a esfera pública e de poder.

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Parlamentares do PSOL e o Brasil querem saber

“Esses não são lugares de mulher, mas estamos lutando para enfrentar esse quadro histórico e ocupar esses espaços. Sobre nós recai quase tudo que é decidido aqui no Congresso. A previdência vai recair sobre nós, a reforma trabalhista recai sobre nós, especialmente , enquanto as empregadas domésticas não tinham direitos, afetava principalmente mulheres negras. É preciso que estejamos aqui. As mulheres são maioria da população e precisamos defender pautas que impactam em nossas vidas, que ampliem nossos direitos”, observa.

Flávia Birole confia na mudança dos padrões estabelecidos e aponta a forte participação das mulheres.

Elas se apresentam com maior força contra o autoritarismo e são uma parte importante da resistência democrática.

A professora destaca movimentos como o “Elenão” e afirma a necessidade de mais mulheres na política e nos espaços institucionais.

“É preciso que as experiências, os interesses tenham o mesmo peso nos espaços públicos, porque existe uma enorme diferença entre homens e mulheres. O Brasil precisa buscar a paridade alcançada pela Bolívia, pelo México e que está a caminho na Argentina com aprovação de leis nesse sentido. Decisões definidas nesses espaços públicos regulam a vida da gente, então é necessário que façamos parte desses espaços”.

Um ano sem Marielle para o ex-candidato à presidência pelo PSOL, Guilherme Boulos, significa um ano de impunidade para o partido e para o povo brasileiro.

É a expressão do declínio da democracia no Brasil, acrescenta.

“É isso que acontece quando alguém é morta por aquilo que representa politicamente, pelas ideias que defende. Esse é um crime político, é um atentado político e um atentado à democracia brasileira”.

Segundo Boulos, o crime dá um salvo conduto de que pode fazer esse tipo de coisa. “Por isso vamos seguir lutando por justiça para Marielle”, concluiu.

Alvo de ameaças há mais de dez anos, após presidir a CPI das Milícias na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, o novato deputado federal Marcelo Freixo pelo PSOL, faz coro à declaração de Boulos.

“Queremos saber quem tentou matar a democracia no Rio de Janeiro. A Marielle foi executada por um grupo de políticos – que a gente não sabe quem foi – porque incomodou e se isso não for esclarecido significa que grupo político pode matar qualquer pessoa, a qualquer momento se for contrariado. Isso vale para políticos, juízes, jornalistas”, afirma.

Contrária ao lema “Marielle vive”, Talíria Petrone disse que, infelizmente, Marielle não existe mais. Foi executada com quatro tiros no rosto.

“É preciso que não esqueçamos disso para cobrarmos. Não esquecer isto é importante para entendermos a gravidade do momento que estamos vivendo. Agora as lutas que a Marielle encampavam no corpo, na voz, no parlamento estão mais vivas do que nunca. Aqueles que tentaram nos calar, matando Marielle, erraram, porque acho que multiplicaram as mulheres negras nos parlamentos, e as lutas diárias foram colocadas nos centros das cidades do Brasil e do mundo”, avalia a deputada eleita em 2018.

Ela acrescenta que o assassinato colocou no centro da conjuntura a necessidade em ter mais mulheres negras, de periferia em todos os espaços de poder.

“Se a Mari não tá mais aqui com a gente, esse é um luto que teremos que lidar a vida inteira, no entanto, as lutas da Marielle estão muito vivas em muitas de nós que estamos ocupando esses espaços de poder”.

A essa luta não escapa nenhum detalhe. Durante a campanha eleitoral, uma placa simbólica que homenageava Marielle foi quebrada por um candidato a deputado estadual no Rio de Janeiro. 

Após vencerem as eleições, os deputados do PSOL instalaram a mesma placa simbólica nas portas de seus gabinetes, no 6º andar do anexo IV da Câmara, onde a maioria dos colegas partidários está localizada.

Único partido do Brasil que alcançou a paridade entre homens e mulheres na Câmara dos Deputados.

O ano impactante vivido pelo Brasil levou Flávia Birole a fazer uma analogia com a obra de Eric Hobsbawm “A era dos extremos: o breve século XX”, em que o historiador fala sobre a brevidade do século passado para ele iniciado com a 1ª Guerra Mundial, em 1914, e terminado em 1989, com a queda do Muro de Berlim.

Para a professora de Ciência Política, 2018 começou com a execução de Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes e terminou com a eleição de Jair Bolsonaro à presidência.

Nesse clima de ódio, extremos e impunidades, políticos continuam sendo ameaçados no Brasil. Freixo e Talíria são alvos de ameaças.

Sem se sentir protegido diante de ameaças cruéis direcionadas inclusive à sua família, mesmo com escolta, Jean Wyllys abriu mão do mandato de deputado federal pelo PSOL e deixou o país.

A delegada e deputada estadual do Rio, Martha Rocha do PDT, sofreu um atentado no dia 13 de janeiro de 2019.

Saiu ilesa, embora seu carro seja blindado, o motorista foi atingido pelos tiros.

Como no caso de Marielle, a investigação segue incompleta e a democracia brasileira segue aos tropeços.

Fontehttps://www.diariodocentrodomundo.com.br/um-ano-sem-marielle-seu-legado-para-o-brasil-esmaga-seus-assassinos-por-roseli-garcia/


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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