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As duas revoluções do feminismo

As duas revoluções do

Por Leonardo  

O dia internacional da mulher que no fundo cada dia é o dia da mulher, nos oferece a ocasião de pensar o desafio que o movimento feminista mundial nos lança.

Esse movimento mais que outros fez duas revoluções: colocou em questão o machismo e o patriarcalismo. O machismo como a dominação do homem sobre a vida da mulher que já tem séculos. A luta das nos despertou para a questão de gênero que envolve relações de poder. Esse não pode ser só do homem. Deve ser partilhado entre o homem e a mulher. Evitar a divisão sexual de trabalho e priorizar lógica de partilha e da coparticipação em todo o de vida a dois. Daí surge uma relação mais justa e harmoniosa.

Em segundo lugar, o movimento feminista fez talvez a mais consistente crítica à cultura patriarcal que organizou toda a sociedade e as várias instâncias da vida e também da religião. O homem assumiu o poder através do qual submete os demais, chefia o Estado, cria a burocracia, organiza o exército e faz guerras. Quase todos os heróis e a maioria das divindades são masculinas. Ele ocupa a vida pública e relega à mulher à vida privada e familiar.

O patriarcado, pela crítica feminista, foi teoricamente desmantelado, embora na prática, tente sempre de novo a dominar a mulher. Um refúgio especial do patriarcado é a mídia e o marketing que usam a mulher, não só em sua totalidade, mas as partes dela, os seios, as pernas, as partes íntimas. É uma forma de transformar a mulher em objeto.

Mas nem sempre foi assim. O ser humano existe já há 7-8 milhões de anos. Na primeira fase que durou milhões de anos as relações homem-mulher eram de harmonia e de equilíbrio com a natureza. Contrariamente do que crê o pensamento patriarcal, a verdadeira convivência humana não foi regida pela de uns sobre outros, mas pela e pela cooperação.

A violência é recente no processo da antropogênese. Ela começou com o homo faber há dois milhões de anos que na busca dos alimentos especialmente da caça começou a usar o instrumento e a força. Aí o masculino passa a ser o gênero predominante. Ela ganhou hegemonia ao surgirem há 8 mil anos a agricultura, as vilas, as cidades e os impérios. As relações homem-mulher passam a ser de desigualdade: ele ocupa toda a vida pública, governa sozinho e relega a mulher à função de procriadora e cuidadora do lar.

As mulheres trazem para o sistema produtivo e para o Estado algo radicalmente novo. Não será só competitivo e autoritário. A mulher traz o que viveu no domínio privado: os valores da solidariedade, da partilha e do cuidado. Milenarmente foi educada para o altruísmo. Se um bebê não tiver à sua disposição alguém altruísta que o cuidasse, não duraria uns dias sequer. Desta forma, a entrada da mulher no domínio público masculino é condição essencial de humanização e mais cooperação no mundo do trabalho e, o que é fundamental, reverter o processo de destruição da natureza e da espécie humana.

Isso ficou claro na consciência coletiva no Relatório da ONU para o Fundo para a População (FNUAP) que sustenta: “a raça humana vem saqueando a de forma insustentável e dar às mulheres maior poder de decisão sobre o seu futuro pode salvar o de sua destruição”. Veja que aqui não se fala de “poder de participação” que elas sempre tiveram, mas de “poder de decisão”.

São elas que entendem de vida, pois a geram. Serão elas as principais protagonistas na decisão de uma biocivilização assentada no cuidado, na solidariedade e na lógica do coração, sem as quais a vida não viceja. Elas junto com os homens que desentranharam a sua dimensão de “anima” (cuidado, gentileza e amorosidade) que se articula com a dimensão de “animus” (razão, organização, direção) presentes, em proporções próprias em cada pessoa, poderão dar um rumo novo à nossa existência neste planeta e nos afastar do caminho sem retorno, caminho de perdição.

Artigo originalmente publicado no site A Terra é Redonda

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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