Em Memória de Manoel da Conceição
Gilney Viana
Brasília, 18 de agosto de 2021
Manoel da Conceição, líder camponês,
fez história, conhecida em vida.
História de vida que sintetiza a história da resistência camponesa,
aos latifundiários e grileiros, à ditadura militar e ao agronegócio.
Manoel, o camponês,
em sua simplicidade de ser, de ver e lutar,
antecipou a teoria da autonomia camponesa
diante do capital e do latifúndio,
e da sua potencialidade revolucionária,
para mudar a sociedade, o Brasil, o Mundo.
Manoel fez da Bíblia uma leitura da sociedade
e um instrumento de luta para muda-la.
Inicialmente fundando escolas para ensinar
o camponês a ler;
e depois acenando lhes com a utopia
da bem aventurança na terra.
Encontrou na Igreja Católica, o apoio quando atacado;
a defesa diante da perseguição política,
e o asilo, após ser resgatado dos centros de tortura
da ditadura militar.
Manoel, o líder camponês,
jamais negou sua classe, seu povo, sua luta.
Entendeu o que é inimigo de classe,
ainda em sua juventude, quando vivenciou
a ação da Polícia que assassinou 7 camponeses de Pirapemas
que ousaram desafiar a lei não escrita do latifúndio
que ao camponês não era permitido se organizar
e muito menos lutar pela terra.
Não sem resistência desesperada,
que resultou na morte do tenente e de um soldado.
Seja quando organizou três mil camponeses
no Sindicato camponês de Pindaré Mirim, em 1963,
desestruturado pelos militares golpistas de 1964.
E o reorganizou no pós golpe, liderando os camponeses
em defesa das suas roças, invadidas pelo gado dos latifundiários,
lançando a palavra de ordem “gado que come roça, come bala”,
seguida da prática.
Ao ato simbólico dos camponeses,
os senhores de terra e de gado responderam
com o ato real da violência ilegítima do Estado.
No dia 13 de julho de 1968, lembra bem Manoel,
a polícia cercou a reunião em que promovia assistência médica
aos camponeses, e deram o grito:
Quem é Manuel da Conceição?
Sou eu – assumiu e se apresentou,
logo atingido pela fuzilaria que lhe custou a perna.
Preso, sem assistência médica, teve que amputa-la.
Quando o governador Sarney tentou lhe cooptar,
ele recusou, mostrando lhe a perna mecânica:
“Minha perna é minha classe”.
Como se não bastasse o aprendizado da vida,
agregou ao ensinamento da Igreja, o ensinamento de
um partido político de esquerda, a Ação Popular. E foi para São Paulo.
Aprendeu e ensinou à Oposição Sindical, em 1968.
Viajou o mundo e se encantou com a China socialista.
Retornou mais uma vez ao Mearim,
agora munido de uma teoria revolucionária
que lhe parecia consistente porque fazia do camponês
um protagonista da história.
A estratégia da guerra revolucionária a partir da base camponesa do Mearim
não resistiu à repressão militar,
mandando lhe para a prisão e para a tortura
da qual saiu quebrado fisicamente e
inteiro moralmente.
Preservou se e preservou o sonho do protagonismo camponês,
na revolução socialista.
Mais uma vez a Igreja Católica foi o seu refúgio, o seu asilo.
Em Genebra continuou a luta sob outras formas,
até que retornou ao Brasil, com a anistia política,
para organizar o PT, a CUT, o CENTRU e retomar a luta camponesa,
sob nova conjuntura, sem negar os ensinamentos
das lutas passadas.
Aventurou se pela política institucional em Pernambuco e
depois se recolheu ao Maranhão, seu território de origem.
Em Imperatriz, estabeleceu sua última base camponesa de resistência,
Até que se apagou a chama da vida
E explodiu a chama da História.
Gilney Viana – Poeta Militante