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Relato sobre Valu Tavares

Relato sobre Valu Tavares e Edir Bragança, os sineiros da antiga matriz

Em Formosa, antes da catedral da Praça Imaculada Conceição, no centro da cidade, existiu uma velha matriz, na Praça Rui Barbosa, também no centro da cidade, que, segundo relato do jornalista Alfredo A. Saad, foi “construída a partir de 1879 e sagrada em 8 de dezembro de 1904, embora incompleta. Apesar dos grandes esforços, ela somente foi concluída na década de 1920: os altares de N. Sra. do Rosário e do  Sagrado Coração de Jesus foram completados em 1915 e 1920, respectivamente.”

Ainda segundo Saad, a velha matriz, localizada na Praça Rui Barbosa,  era de pau-a-pique, com espessas paredes de barro, e foi destruída em torno do ano de 1956, época em que “toda a região do Planalto Central sofria o impacto da sofreguidão da construção de Brasília, da construção de novos edifícios, segundo a arquitetura-modelo da época e da rejeição aos valores antigos que ainda vigoravam nas velhas cidades do agora denominado Entorno – um designativo infeliz para a região desfigurada pela presença do câncer em que se transformou a Capital.”

Naquela igreja, pobre, natural e simples, existiam os sinos, organizados em três campanários, e os sineiros, personalidades típicas da época. Veja o relato de  Saad sobre os sineiro Valu e seu ajudante Edir:

No meu tempo de criança, e até a minha adolescência, Valu dos Padres (Valeriano Tavares) era o sacristão [da velha igreja matriz]. Eventualmente, Edir Bragança, que era tio de meus amigos, os filhos de Miguelzinho, ajudava Valu nas suas empreitadas, principalmente como sineiro. Creio que Valu aceitava aquela invasão de seus domínios porque, com a idade, tinha dificuldade em escalar os quinze degraus da escala dos campanários. As cordas dos sinos  não podiam ser deixadas longas, pois, certamente, os meninos que por ali passassem, a qualquer hora do dia, nunca deixariam de badalar os sinos, alertando, inutilmente, os pacatos fiéis da paróquia.

Nunca arrisquei minha vida subindo aqueles degraus. Era uma aventura perigosa demais para um medroso como eu. Em dias de festa, quando os três sinos eram tocados, ao mesmo tempo, todo o campanário oscilava e rangia ante aquele esforço extremo – principalmente se Edir era o sineiro. Os toques daquele meu amigo, tomador de rapé, seja pela ressurreição de Cristo como pela assunção de Nossa Senhora, Edir não sabia badalar os sinos em toques de finados. Esses, mais pausados e singelos, eram deixados para Valu.

Os toques de Valu eram mais comedidos, talvez porque ele conhecesse bem  resistência daquele velho madeirame do campanário. Valu e Edir eram tão amigos porque, acreditava eu à época, ambos eram viciados em rapé. Lembro-me muito bem do lenço de bolso de Valu, enegrecido pelo pó retirado das narinas. Penso que ele jamais substituía aquele lenço sujo.

Mas o lenço de Edir não ficava atrás. Não me lembro dos espirros de Edir, mas nunca me esqueço do barulho feito por Valu, quando reagia aos efeitos de um rapé particularmente forte. Mas tanto Valu quanto Edir jamais tomavam rapé enquanto na igreja. Porém, Valu usava aquele “santo remédio” em qualquer outro local onde estivesse – e eu me lembro de seus espirros, ruidosamente exagerados, à porta dos correios, durante as três visitas diárias obrigatórias, quando despachava seus informes meteorológicos.”

Nota: Dados extraídos do livro “Álbum de Formosa – um ensaio de história de mentalidades“,  obra póstuma do jornalista formosense Alfredo A. Saad (falecido em 2011), publicado pela família em 2013. Foto de capa: reprodução formosahistorica.blogspot.com, fotografada do blog pela revista Xapuri, daí a baixa resolução da imagem.

 


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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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