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Goiânia e a ideologia do traçado da cidade de Attílio

A ideologia da cidade de Attílio – 

O dia 27 de agosto de 1943 reuniu o urbanismo e a popular brasileira (MPB) numa tragédia aérea ocorrida no aeroporto Santos Dummont do Rio de Janeiro. Após infeliz tentativa de pouso por parte do piloto, o avião da VASP (Viação Aérea de ) atinge o teto da naval adjacente à pista de pouso e se espatifa.

Morrem o jornalista Cásper Líbero e o arcebispo de São Paulo Dom José Gaspar d’Afonseca e Silva, mas também o jovem arquiteto urbanista Attílio Corrêa Lima, autor do Plano Urbanístico de (PUG).

A MPB entrou nessa história momentos antes, ainda no balcão da VASP do aeroporto de Congonhas, quando Attílio intentava um lugar no fatídico voo. Ao antecipar seu retorno para o Rio de Janeiro, Attílio resolveu não o fazer de trem e aguardava ali a desistência de algum passageiro. Conseguiu, pois Ary Barroso desistira da viagem e a vaga se abriu para Attílio, 42 anos – perdeu o urbanismo brasileiro, ganhou a MPB – coisas da !

Curiosidades à parte, a história de Attílio é cheia de passagens e surpresas importantes, afinal foi o primeiro urbanista brasileiro formado na Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro a estudar no Instituto de Urbanismo da de Paris sob forte influência positivista, mas vinculado à corrente inovadora presente na arquitetura moderna que surgia na Europa.

Muito pesquisado no ambiente acadêmico e bastante concorrido em razão de suas obras executadas em Volta Redonda, Niteroi e Recife, nenhum dos pesquisadores identificou em seus traçados o que vislumbrei no PUG: a forte conotação ideológica de esquerda presente na mobilidade urbana proposta para a nova cidade.

Nesse aspecto vale observar que, desde sua concepção até à atualidade, o traçado de Attílio se apresenta mais que uma representação desenhada a conectar as atividades citadinas à vigorosa monumentalidade erigida do projeto de fundação da nova capital.

O traçado do PUG é mais esplendoroso que isso, pois interfere em dimensões ideológicas que tocam a escala humana, aqui representada pelo rotineiro movimento pendular de seus habitantes: o ato de caminhar entre residência-trabalho-residência.

Sim, o traçado de Attílio reforça a componente ideológica que explica a produção do espaço como elemento transformador da relação homem-natureza, essência geográfica suportada nas relações de produção capitalistas. E não há outro elemento motriz que não o ato de caminhar, reunir, mobilizar para materializá-lo.

Se observarmos o zoneamento da nova paisagem do brasileiro proposta e executada por Attílio, verificamos que ele estimula o movimento cívico constantemente. Mesmo que não desejasse, a expressão nele contida designa motivação mobilizadora de pessoas na medida em que nega a alienação do trabalho no espaço construído.

No traçado de Attílio as forças produtivas estão rigorosamente assentadas de a garantir aos a condição de veio dinâmico na vida política da cidade. Note-se que os espaços de produção (setor industrial) e de serviço e consumo (centro comercial) possuem direta e generosa conexão espacial confluente ao centro do poder político (centro administrativo cívico), cuja localização é entornada por setores residenciais urbanos e suburbanos, este predominante.

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A configuração espacial do PUG remete o jovem urbanista ao pensamento da geografia crítica por meio do qual o espaço deve ser pensado como produto social, fruto das relações sociais de produção.

O espaço produzido a partir dos traços de Attílio possibilita uma cidade mais funcional e militante onde o sujeito seria o protagonista da ação política, onde o sujeito seria o agente espacializador das coisas. Portanto, uma mais marxista e libertária que necessariamente modulada pelo desejo conservador da elite governante da época e seguintes.

Confirmam o vigor ideológico do traçado do PUG os diversos momentos políticos cívicos marcantes da cidade. Aos chamamentos às causas diversas, em poucos instantes as marchas a pé venceram os espaços viários radiais rumo ao centro cívico para se manifestarem (figura 2).

É nesse contexto que está consagrada a urbanidade militante presente no traçado de Attílio, aquela que necessariamente enseja a vitalidade do espaço construído em todos eles. Não se manifesta o protagonismo político sem as pessoas em permanente interação, sem o encontro, sem o sentimento coletivo a lhes movimentar – eis a urbanidade ideologizada, um tipo de espacialidade requerida e permanentemente construída.

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ANOTE AÍ:

Antenor Pinheiro – Jornalista.  Comentarista da CBN Goiânia. Membro da Associação Nacional de Transportes Públicos /ANTP.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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