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IGUALDADE RACIAL: LEI 10.639 COMPLETA 18 ANOS

Igualdade Racial celebra 18 anos da Lei 10.639

CARTA NACIONAL DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL: 18 ANOS DA LEI Nº 10.639/03 

NÓS, do Movimento Negro Unificado – MNU, juntamente com os demais movimentos negros e sociais; educadoras, educadores; lideranças sindicais, políticas, quilombolas; organizações não governamentais; estudantes, apresentamos nossa indignação com a total negligência dos Governos Municipais e Estadual e, de forma acintosa do Governo Federal, com a real efetivação da Lei nº 10.639/03, sancionada há exatamente dezoito anos passados, como também das leis educacionais nº 11.645/08 e 12.796/13.

EXIGIMOS ações efetivas dos vários órgãos e instâncias que não têm cumprido seu papel social de acompanhar, subsidiar, fiscalizar, zelar e/ou defender o efetivo cumprimento da legislação em vigor, agindo proativamente quando houver descompasso nesse cumprimento.

Ao entendermos a educação como um processo de desenvolvimento humano, que também se processa em espaço público responsável, onde o conhecimento e o fazer pedagógico deverão expressar a cultura de uma nação, reforçamos que a escola deverá expressar a lei nº 10.639/03 em toda sua abrangência.

A inclusão da obrigatoriedade do ensino sobre a e e Africana, referendando a luta do povo negro no Brasil e sua contribuição nas áreas sociais, econômica, política, obriga a escola a rever seu currículo e cumprir as orientações do Conselho Nacional da Educação, que propõe Diretrizes para a Educação das Relações Étnico-Raciais.

Assim, é posto o desafio de abrir as portas escolares, por meio de seus currículos, em prol dos direitos do povo negro enquanto sujeitos que representam 54% ou mais da nação Brasileira, avançando na construção de uma sociedade antirracista e mexendo nas estruturas que ferem a .

Observando o acima explicitado, afirmamos que a não efetivação desta lei nos espaços escolares nesses dezoito anos de existência é, sem dúvida, uma nítida expressão do racismo institucional brasileiro que certamente deverá ser enfrentado coletivamente, e os vários segmentos que compõem a nação brasileira deverão ser protagonistas nesse enfrentamento.

Dessa forma, reconhecemos que:

  • MINISTÉRIO PÚBLICO – ORDEM DOS ADVOGADOS DO / OAB. É providencial e urgente que o Ministério Público (também em suas representações nas esferas municipais e estaduais) se posicione para assumir seu importante papel como órgão defensor da ordem jurídica, que fiscaliza se as leis estão sendo cumpridas e zela pelos direitos da coletividade agindo proativamente para se fazer cumprir a legislação em vigor, não escolhendo a pseudoneutralidade, sendo desta forma conivente com este racismo estrutural que permeia a sociedade brasileira se articulando na educação, obstaculizando a implementação efetiva da Lei nº 10.639/03.
  • Levando em consideração a urgência de fazer articulações entre órgãos e instâncias, garantindo o atendimento das reinvindicações expostas nessa carta, acreditamos que Ministério Público e a OAB, certamente poderão colocar-se à frente, buscando de forma jurídica, fortalecer as reinvindicações aqui colocadas pelos representantes da Sociedade Civil.
  • A OAB – Ordem dos Advogados do Brasil, no cumprimento de suas finalidades como uma organização de serviço público que tem como premissa: “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas”, deverá também se posicionar proativamente, intensificando ações nessa empreitada de fazer valer essa legislação.
IGUALDADE RACIAL: LEI 10.639 COMPLETA 18 ANOS
Joel Rufino dos Santos – Foto Ilustrativa

Assim sendo, apresentamos como demanda a essa organização que tem tanta representatividade histórica na luta pelos direitos humanos no Brasil que estabeleça, juntamente com o Ministério Público, diálogos horizontais com os educadores e educadoras, Secretarias de Educação, Conselho de pais e mães, conselhos Estaduais, municipais e Federal de Educação, sindicatos, criando uma agenda especial para este 2021, ano em que a Lei nº 10.639/03 completa dezoito anos, para discutir e fomentar ações que desencadeiem ações objetivas de fiscalização eficiente e monitoramento do cumprimento da referida Lei e de suas diretrizes.

  • OS CONSELHOS MUNICIPAIS, ESTADUAIS E FEDERAL DE EDUCAÇÃO – Observando suas funções como órgãos que não apenas regulamentam as leis, mas também zelam, por meio de seus instrumentos próprios, pelo cumprimento delas, deverão retomar com mais efetividade as ações que muitas vezes foram negligenciadas, ações estas que já se encontram amplamente delineadas desde 2009, no Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino História e Cultura Afro-brasileira e Africana.
  • Considerando a premissa de que se torna necessário “o desenvolvimento da empatia, ampliação de conhecimentos e ação colaborativa entre os Conselhos Municipais, Estaduais e Federal de Educação no trato da temática”, propomos que seja incentivada e construída uma agenda básica comum dos Conselhos de Educação, contemplando ações articuladas para a consolidação de ações. Assim, o incentivo e o estabelecimento de formas mais incisivas de ações patrocinadas por esses conselhos serão certamente estratégias a serem adotadas, sendo que uma dessas ações deverá ser a de, em parceria com a Câmara de Vereadores, instituir as Diretrizes Curriculares Municipais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
  • GRUPOS COLEGIADOS, SINDICATOS, FÓRUNS DE EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE; NÚCLEOS DE ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS (NEABs); NÚCLEOS DE ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS E INDÍGENAS (NEABIs); CONSELHOS DE COMUNIDADE NEGRA.
  • O exercício democrático pressupõe a participação das várias instâncias e órgãos da sociedade. Cada uma, dentro das suas especificidades, certamente poderá dar a sua colaboração para monitorar e reivindicar o efetivo cumprimento da Lei nº 10.639/03, tornando-se protagonista nessa construção coletiva.
  • Nesse sentido, o convite é feito a todos esses grupos que também têm seu papel social e político a cumprir. Além de todas as outras possibilidades que esses grupos podem enxergar em seu interior, dialogando com seus membros, sugerimos que adotem oficialmente este ano de aniversário da lei como aquele em que o objetivo das ações seja o de questionar as instâncias governamentais sobre a implementação das Legislações de promoção da igualdade racial na educação.
  • GOVERNOS MUNICIPAIS, SECRETARIAS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO – Os cidadãos e as cidadãs, aqui representados nesta carta reivindicatória pelos órgãos e instâncias que a assinam, convocam os governos Municipais e as Secretarias de Educação a acionarem os mecanismos normativos e jurídicos de sua alçada que sejam capazes de fazer com que essa Lei saia do papel e esteja presente de forma objetiva nos espaços escolares.
  • Nesse sentido convocamos, inicialmente, a Câmara Municipal, por meio de seus vereadores, a instituírem, por meio de legislação condizente, as Diretrizes Curriculares Municipais para a Educação das Relações Étnico- Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
  • A Secretaria de Educação assumirá sua função de assegurar a implementação dessas Diretrizes, acompanhando e avaliando os resultados, bem como orientar as equipes gestoras e técnicas da Secretaria de Educação sobre a aplicabilidade da Legislação Étnico-Racial. Este deverá ser coordenado por uma equipe técnica que deverá ser instituída, formando um Grupo Gestor de Promoção da Igualdade Racial na Educação (GGPIRE) nos quadros das Secretarias de Educação, garantindo, dessa forma, a efetividade do trabalho a ser realizado.
IGUALDADE RACIAL: LEI 10.639 COMPLETA 18 ANOS
Grande Otelo – Foto Ilustrativa

Face ao exposto e diante de direitos desrespeitados, negligenciados por órgãos e instâncias em todas as esferas governamentais, não observando:

  • Os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em convenções, entre outros, a Convenção da UNESCO, de 1960, relativa ao combate ao racismo em todas as formas de ensino, bem como os da III Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, 2001;
  • O Decreto n° 1.904/1996, relativo ao Programa Nacional de Direitos Humanos, que assegura a presença histórica das lutas dos negros na constituição do país;
  • O Decreto n° 4.228, de 13 de maio de 2002, que institui, no âmbito da Administração Pública Federal, o Programa Nacional de Ações Afirmativas;
  • O Inciso I da Lei n° 9.394/1996, relativo ao respeito à igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; diante dos Artigos 26, 26 A e 79 B da LDB, estes últimos introduzidos por força da Lei nº 10.639/2003.
  • As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana para serem executadas pelos estabelecimentos de ensino de diferentes níveis, etapas e modalidades, que indica que cabe aos sistemas de ensino, no âmbito de sua jurisdição, orientá-los, promover a formação dos/as professores/as para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e para Educação das Relações Étnico-Raciais, assim como supervisionar o cumprimento das diretrizes.

CONCLUÍMOS, enfatizando que o Brasil passa por um momento muito difícil, que não cabe posição de neutralidade. O silêncio nesse momento é conivente. Silenciar é escolher um lado. Nesta perspectiva, os cidadãos e cidadãs que assinam esta carta, imbuídos da sua representatividade, compreendem que as Políticas Públicas de Ação Afirmativa voltadas para a promoção e valorização da Igualdade Racial na Educação devem ser prioridade e compromisso central de Estado e de Governo. E cabe à sociedade civil zelar e exigir que essa premissa seja respeitada e cumprida. Esse é o objetivo desta carta que será encaminhada para os vários órgãos e instâncias, apresentando a indignação pela falta de cumprimento do aparato legal que respalda a implementação da Lei nº 10.639/03.

PORTANTO, neste ano de 2021, em que se completam dezoito anos da Lei nº 10.639/03, os movimentos negros e sociais; educadoras; educadores; lideranças sindicais, políticas, quilombolas; organizações não governamentais, representantes da Sociedade Civil nos Conselhos Municipal, Estadual e Federal de Promoção da Igualdade Racial, vêm a público exigir a construção de uma agenda coletiva de mobilização municipal, estadual e nacional, com ações efetivas em relação ao exposto nesta carta.

CONFIGURA-SE como mais uma tentativa de avançar rumo às mudanças necessárias. É nessa resistência democrática que nos colocamos, como cidadãos e cidadãs, diante dos retrocessos políticos que têm assolado, nestes últimos tempos, o Brasil. Resistência e resiliência, sempre! Consolidação da Lei nº 10.639/03, já!

A presente CARTA NACIONAL DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL: 18 ANOS DA LEI Nº 10.639/03 – teve, inicialmente, sua redação feita pelas professoras Rosa Margarida de Carvalho Rocha, escritora, pedagoga, mestre em Educação e membro da ABPN, e Abadia Vieira, presidenta do Compir Uberaba. E agora essa produção se torna uma Carta Nacional que o MNU, por meio de sua militância, assume em todo o território brasileiro. É de resistência, de resiliência, de sonoridade… que sejamos todos/as agentes da mudança.

Brasil, 31 de Março de 2021

IGUALDADE RACIAL: LEI 10.639 COMPLETA 18 ANOS
Da para a : Zumbi dos Palmares, , Aqualtune, Machado de Assis, Aleijadinho, Tereza de Benguela, Luis Gama, Laudelina de Campos Melo e Estevão Roberto da Silva – Personalidades negras brasileiras que marcaram a história do País – Arte sobre fotos de Marcos Santos/USP Imagens

Assinam esta Carta o MNU e 43 outras entidades da sociedade civil organizada. 

ieda leal

LOGO MNU ILLUSTRATOR

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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