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Povo Preto: “Nós combinamos de não morrer”

Povo Preto: “Nós combinamos de não morrer” – denuncia pacote de Moro-Bolsonaro

Documento enviado à Comissão de da OEA expõe genocídio contra população não-branca brasileira – com crescentes dados de morte no campo. “Nós combinamos de não morrer”, afirma Douglas Belchior, da Uneafro

Por Lucas Veloso/Alma Preta

Para denunciar violações de direitos humanos nas propostas que visam facilitar o acesso ao porte e a posse de armas por parte da população, promovidas pelo presidente Jair Bolsonaro, o Movimento Negro enviou documento à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 11 de julho, quinta-feira.

O texto, elaborado por organizações, grupos e coletivos da civil e representantes da população afro-brasileira e periférica, aponta fatores de risco nas propostas que tramitam no Congresso Nacional.

“Em 2017, enquanto a letal contra brancos diminuiu, a contra negros aumentou. Isso é inaceitável do ponto de vista de uma sociedade democrática. Enquanto não houver um olhar racial para a questão da violência, a escalada continuará”, diz o documento.

Para a integrante da Educafro, Silvia Souza, a denúncia é um passo importante para a manutenção da democracia brasileira e, também, para impedir mais violações de direitos.

“É essencial levar ao conhecimento dos órgãos internacionais as arbitrariedades que ocorrem no âmbito legislativo do Brasil, principalmente no que tange a edição de sete decretos, em seis meses, sobre porte e arma de ”, define Silvia.

Criada na década de 1950, a CIDH é uma entidade autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA), que se encarrega da promoção e proteção dos direitos humanos em todo o continente americano.

Em maio, o movimento negro brasileiro também participou de audiência com a Comissão Interamericana, na cidade de Kingston, Jamaica. Na ocasião, o tema foi o pacote de pública do ministro da Justiça, Sérgio Moro. Estavam presentes, além de lideranças negras e membros da comissão americana, representantes do governo brasileiro.

Já em junho, organizações do movimento negro também foram à Brasília para se reunir com o presidente do Senado, David Alcolumbre, e discutir a possibilidade de presença dos coletivos nos debates sobre as medida propostas por Moro. Alcolumbre garantiu que haverá a participação do movimento nas discussões. Três meses antes, em março, o movimento negro teve uma reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para vislubrar a criação de uma bancada antirracista no Congresso Nacional.

Segundo o professor da Uneafro Brasil, Douglas Belchior, o pacote anticrime e os decretos que pretendem viabilizar o acesso às armas são estratégias adotadas pelo governo Bolsonaro para viabilizar o genocídio da população negra.

“Nós precisamos mostrar ao a radicalização do genocídio que estamos vivendo e essa vontade primitiva da elite brasileira de negar a existência do povo negro e só existe uma forma de fazer isso, nos matando”, sustenta.

Belchior afirma ainda que o movimento negro está disposto a lutar para reverter esse quadro. “Como diz Conceição Evaristo, nós combinados de não morrer.”.

O alto índice de crimes com armas de fogos nas regiões rurais, com 99 assassinatos nos últimos dois anos, além do aumento de 350% na mortalidade de são alguns dos dados apresentados pelos ativistas à CIDH.

De acordo com a integrante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), Selma Dealdina, o Estado legaliza os crimes ocorridos nas áreas rurais.

“É clara a intenção do governo em cumprir suas promessas de campanha, abrir os territórios quilombolas para especulação imobiliária e do agronegócio, além de apoiar o acirramento do conflito agrário que resulta em derramamento de sangue na luta do povo pela terra”, explica Selma.

Leia na íntegra o documento enviado pelo movimento negro à CIDH aqui.

Fonte: Outras Palavras

Via Alma Preta


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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