O livro de fotografias do mundo do café capturadas em três continentes nos dá a imagem da cafeicultura como suporte de vidas e economia desde a implantação da lavoura cafeeira na Arábia nos fins do século XVI.
Sebastião Salgado, cidadão do mundo, seu olhar por trás da câmera se perde na beleza da natureza, nas faces do ser humano presente em todo canto por onde caminha e no trabalho do homem simples, sofrido e cheio de esperança.
O perfume dos grãos, das floradas e o dia a dia no entorno do café fez parte de sua infância e do início de sua carreira. Como economista da Organização Internacional de Café, viajou e viu de perto as lavouras cafeeiras, o manejo do café, seu aroma.
Trabalhando nesse mundo tão seu, foi conhecendo o jeito de viver dos cafeicultores, sua rotina, dificuldades, sonhos e esperanças por onde passou.
O Café por trás da câmera
Em 2002, a empresa italiana Illy café propôs um trabalho de captação de imagens da cafeicultura em um roteiro que revelasse o terroir do café pelo mundo afora.
“Com o convite da empresa italiana Illy para fazer uma história do café, fiquei felicíssimo. E fui embora, viajei durante dez anos, por dez países diferentes. Foi fenomenal. Primeiro, por estar dentro do mundo do café, que é lindo, maravilhoso. Não fiz todos os cafés, fiz o bom café, o Arábica, que é produzido em terras altas” – Sebastião Salgado (em entrevista a RFI, 9.11.2017)
Perfume de sonho resume dez anos de viagem pelos continentes americano, africano e asiático e a passagem pelos países nos quais o café arábica verdeja em terras altas e à sua volta a vida acontece.
Assim, podemos ver, em preto e branco, Brasil, Guatemala, Índia, China, Tanzânia e outros cinco países, revelados pelo cultivo do café arábica.
São imagens de homens, mulheres, jovens e idosos que carregam a força da cafeicultura marcada em suas mãos e a vida do campo com todos os seus nuances de claro e escuro revelados na intensidade de seus rostos.
Sebastião observa vagarosamente a vida que habita o universo do café resgatando, por meio da visibilidade de sua arte, a dignidade do lavrador em tons do mais puro branco ao mais intenso negro.
“Mostro a jornada que envolve pessoas, paisagens e o harmonioso relacionamento com a terra, ilustrado através de expressivas e emocionantes imagens em preto e branco.”– Sebastião Salgado
“Meu mundo é preto e branco, eu vejo em preto e branco, eu transformo todas essas gamas maravilhosas de cores – e eu acho a cor muito bonita – em gamas maravilhosas de cinza, o preto e branco é uma abstração, é uma forma que eu tenho de sair de um mundo e entrar em outro para poder trabalhar o meu sujeito fotográfico, poder dedicar tempo à dignidade das pessoas. Isso eu consigo em preto e branco, acho que em cores eu não conseguiria.” – Sebastião Salgado (em entrevista a RFI, 9.11.2017)
Em “Perfume de um Sonho”, o seu olhar, a sua forma de ver a atividade humana do trabalho em toda a sua esplendorosa dignidade, foram 10 anos de paciente observação do fotógrafo em 10 países diferentes, à espera da chegada do momento certo em que a luz e a sombra criem a atmosfera de respeito que caracteriza toda a obra de Salgado, sua exaltação e entusiasmo militante por aqueles irmãos da grande família humana que, com seu esforço anônimo, levam a estimulante alegria do café até às nossas mesas. Com suas fotografias, Sebastião Salgado convida-nos a ler o aroma do café e a olhar para o fundo da xícara, não para vislumbrar nosso futuro, mas para ver uma longa fila de homens e mulheres que sobem por estreitos caminhos até acima das nuvens, ou que abrem caminho em selvas escuras e úmidas no lombo de mulas até chegar ao cafezal. Mulheres e homens de diferentes raças e cores da pele, que nos templos de armazenamento parecem entregar-se a uma religião desconhecida. Da mesma forma como em algumas regiões as mãos passam as contas do rosário, quer seja para invocar todos.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário.
Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta).
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir.
Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/a pessoalmente (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Outras 19 edições e cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você queria, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
P.S. Você que nos lê pode pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapui.info. Gratidão!
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