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sebastião Salgado

“O Brasil ficou louco”, diz Sebastião Salgado

“O Brasil ficou louco”, diz Sebastião Salgado

por Radio France Internationale 
 
O fotógrafo acredita, porém, que o País ainda está longe de uma ditadura e que as Forças Armadas não estão completamente fechadas com Jair Bolsonaro
 
 
sebastião Salgado
Salgado: o com traços de insanidade

 

Para o premiado fotógrafo brasileiro, entrevistado pela apresentadora Lea Salamé, “o Brasil ficou louco”, mas já estava dando sinais de insanidade.
“Quando Dilma Rousseff, eleita democraticamente, foi destituída, praticamente em um golpe de Estado, e um governo totalmente corrupto foi colocado no lugar, começamos a perder o controle do País”, declarou. “Colocamos na prisão aquele que poderia ser eleito diretamente no primeiro turno, por corrupção, praticamente sem provas”, disse, em referência ao . Para Salgado, Lula se tornou “praticamente um prisioneiro político”.
O premiado fotógrafo brasileiro ressalta que houve “muita corrupção do PT e que, para governar, o partido comprou muito apoio político”. Isso, em sua opinião, “se voltou contra as forças democráticas”.
Ele também lembrou da alta taxa de rejeição de Bolsonaro, e de como, em poucos meses, ele se tornou o favorito das presidenciais no Brasil, vencendo com cerca de 55% dos votos. “Mas também teve muita gente que não foi votar”, disse Salgado, se referindo à alta taxa de abstenção (21%) e votos nulos (2%) e brancos (7%), lembrando que, no total, mais de 87 milhões de brasileiros não votaram para Bolsonaro.
Ele também comentou a nomeação de alguns integrantes do governo, incluindo o juiz federal Sérgio Moro, que conduziu as investigações da Operação Lavo Jato que levaram à prisão de Lula, e de antigos militares.
Segundo Salgado, as Forças Armadas estiveram neutras no processo eleitoral. Os generais que participam do governo Bolsonaro, diz, são “velhos generais aposentados, muitos que se identificam com o golpe de estado de 1964, mas não são as Forças Armadas, são antigos militares”, sublinha.
Questionado sobre o papel dos militares de hoje na proteção do País e contra decisões arbitrárias de Bolsonaro, o fotógrafo respondeu que as Forças Armadas de hoje não são as mesmas de antigamente.
“São modernas, como as da França, que participam de missões técnicas e internacionais com a ONU. É diferente. Não são Forças Armadas golpistas de uma República das Bananas. Isso mudou.”
“Não há um retorno da ditadura”
Salgado não enxerga a eleição de Bolsonaro como um retorno à ditadura. “Longe disso. O Brasil tem todas as instituições de um país democrata. Tudo o que ele pensa poder fazer no país necessita da aprovação do Congresso, onde ele não tem a maioria, e precisará fazer uma série de concessões. Falar é uma coisa, fazer é outra”, afirma.
Em relação à proposta da criação de um Ministério do Meio Ambiente e da Agricultura, que pode ser abandonada, o fotógrafo acredita que é uma prova de que Bolsonaro terá que voltar atrás de suas decisões.
“Isso mostra a pressão que existe nos negócios internos. O Brasil se tornou o maior produtor agrícola do mundo e exporta carne, soja, café”, destaca. “O agrobusiness é enorme e depende do mercado externo. Acabar com o Ministério do meio-ambiente e destruir uma parte da traz efeitos para a economia, haverá um movimento planetário de boicote”, lembra.
Salgado, que está à frente de uma ONG que milita pelo reflorestamento, não acredita que a eleição de Bolsonaro terá um efeito negativo em seu .
“Esse movimento é independente do governo, plantaremos 150 milhões de árvores e não precisamos de dinheiro público”, sublinha. “O grande problema ecológico de Bolsonaro é a Amazônia, porque ele prometeu uma abertura da Amazônia ao agrobusinness. Mas eu me pergunto se o agrobusinness precisa da Amazônia. Eles têm as terras mais férteis do mundo”, diz.
Segundo o fotógrafo, os próprios militares defendem a Amazônia e criaram a Funai. “As Forças Armadas são a principal instituição presente na Amazônia, e eu conheço um certo número de jovens generais que são contra a abertura da Amazônia”, afirma.
Fonte: Carta Capital


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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